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Any Gabrielly.
A minha garganta dói. Não consigo sentir parte do meu corpo e só desperto, porque os gritos aumentam a pressão na minha cabeça. Pepe mantém a duas mãos na lateral do meu rosto e os olhos fixos nos meus, procurando, testando, se inclinando a cabeça na direção do meu peito e parando alguns segundos tentando ouvir a minha respiração.

Ainda não consigo abrir os olhos, porque, por algum motivo, as minhas pálpebras doem. Tento abrir a boca, mas a dor é agonizante e as minhas costas entram em colapso quando tento mover a minha perna. Lacrimejo devido a dor e o desespero que enxergo na voz do meu irmão.

— Any? ANY? — Ele afasta alguns fios do meu rosto e agradeço mentalmente. — Você consegue me ouvir? Consegue dizer aonde está sentindo dor? — Sinto as suas mãos me apalpando como se eu fosse uma boneca prestes a quebrar.

Tento abrir a boca de novo, mas nada sai. Tudo dói. O meu maxilar parece completamente destruído desse jeito e, sem jeito, seguro a barra da camiseta dele. Percebo que Pepe está segurando o choro e isso parte o meu coração.

— Eu já liguei pra ambulância... — Uma voz distante chama a minha atenção. Pepe se afasta um pouco para tentar olhar naquela direção e, apenas por isso, consigo enxergar a camisa azul, agora um pouco mais escura, se contorcendo no chão. — Cala a boca! — Sinto o corpo dele se mover em cima de mim e, pelo grito que o Charlie dá, acho que foi um chute.

Charlie. O rosto sem expressão invade a minha cabeça como um tsunami. Tento me mover, fugir, correr ou avisar para o Pepe como estamos nos arriscando. O medo me invade e tento falar, não consigo e o olhar protetor volta a analisar o meu.

— Any, tá tudo bem. Você não pode ficar assim, precisa ficar calma, ok? Eu tô aqui. Passou. — Ele me abraça. Me encolho e o abraço de volta em pensamento.

A dor aumenta. O desespero sabe fuder a cabeça de uma pessoa e o meu soube fazer isso direitinho, porque agora sinto cada pequeno centimetro do meu corpo pegando fogo e as lembranças me fazem gritar por dentro. Eu choro de verdade. Não consigo soluçar e isso é ainda pior.

Sinto as mãos dele em volta da minha garganta ainda. Consigo enxergar o movimento lento, preciso, violento pelo qual ele batia a minha cabeça contra a parede e, acima de tudo, lembro dos meus gritos. Pepe diz que a ambulância está chegando. Não sei dizer. Não sei explicar.

Porque, depois disso, tudo fica escuro.

A música alta faz com que a moto passe despercebida por mim. A rua está agitada e tudo parece um filme dos anos 80 devido a paisagem, pessoas vestidas como Dom Casmurro devia se vestir e as comidas eram servidas em travessas imensas. Alguns ali sorriem pra mim, como se estivessem a minha espera.

Seguro firme o meu rosto tentando sentir as curvas que senti quando Pepe o tocou, mas não sinto nada. Procuro pelo meu irmão ao redor e também não vejo ninguém. Quase como se fosse outro lugar.

Será se eu morri?

Que poético seria. O céu ao som de Queen, gosto de cerveja e vestido rodados. O meu vestido é vermelho e os saltos são de uma cor que não consigo distinguir. Percebo que os meus dedos continuam ao redor do meu pescoço como se eu estivesse esperando alguém ataca-lo. Se eu estiver morta o Charlie não consegue me pegar.

Ou consegue? Não sei. Na verdade, não sei se quero uma resposta. Não quando as pessoas começam a sumir devagar ao meu redor e o lugar ganha o cheiro de rosas que acabaram de serem podadas. Me sinto menor e percebo que os saltos também se foram, sendo substuídos pelos meus pés que escorregam no chão liso que começa a transbordar devido a água que sai de todos os lugares.

Dou um pulo assustada e quando tento gritar, noto que estava forçando os meus lábios a ficarem fechados. Abro a boca devagar e não sinto dor. Não sinto nada.

Alguém? — A minha voz sai abafada. Quieta. Quase silenciosa e preciso segurar firme ao redor do meu vestido para continuar. — Olá!

O lugar, de repente, vira um lago e o céu não parece ter fim. Me sinto igual a um "Um olhar no Paraíso" com o meu vestido, agora branco e imenso, encostando na água. Olho ao redor tentando ver algo que seja familiar ou até mesmo alguém

Penso em dá meia volta quando o chão começa a tremer. Talvez eu esteja no inferno né? Porque isso com certeza faria mais sentido. No entanto, o que eu vejo é um imenso carrossel erguido ali no meio. O meu coração se expande e eu saio correndo. Conheço carrosseis.

Me apaixonei em um.

— Josh?! — O meu corpo praticamente flutua sobre as águas (algo bem bíblico mesmo) antes de encostar a minha pele no concreto do brinquedo. Levanto o meu vestido molhado e saio correndo ao redor dos cavalinhos. — Alguém? JOSH?! — Grito sentindo o desespero, porque, agora, dou conta de como eu me sinto sozinha perdida ali.

Como se não bastasse isso, o carrossel se move. Quase caio para o lado, mas consigo me segurar em uma das barras de metal. As luzes piscam e a dor de cabeça volta. Quero voltar. Quero ir pra casa. Preciso estar em casa.

— Por favor. — sussurro e oro sem saber rezar. Oro porque eu assustada. Eu estou morrendo de medo.

— Any?

Fecho os olhos. O meu corpo para na hora e os dedos dele envolvem o meu ombro. Eu desabo. Me sinto curvar de uma forma nada elegante e choro. Eu acho que eu nunca fiz isso nesses últimos cinco anos e isso me limpa de alguma maneira.

Josh me vira. Ele toca o meu rosto com uma das mãos, mas não limpa as minhas lágrimas. Ele esta tão lindo. A blusa branca e o jeans combinam com os olhos azuis. Ele sorri. Ele sorri como se me amasse, como se fosse um garoto de novo.

— Shhh... — Ele me apoia. Ele me puxa, me abraça, beija o topo da minha cabeça e me protege. As lágrimas caem, mas não sinto nada. — Eu aqui.

— Fiquei com medo. Você demorou tanto pra chegar.

— Mas cheguei. — Ele toca o meu queixo. Nossos olhos se encontram e, sem pensar, ele me beija. Me beija como se tivéssemos 15 anos. Como se fosse um primeiro beijo. — Você precisa voltar. — Ele sussurra. Nossos dedos se cruzam e a nossa respiração é uma só, de repente.

Não quero te deixar. — Murmuro e é verdade. Não consigo ir embora de novo.

— Eu aqui. — O carrossel para. Percebo que a água começa a abaixar. — "Pode parar de correr agora, maluquinha. Finalmente chegamos a costa".

Acordo, desperta, seca e com os olhos marejados. Me levanto tão rápido que sinto a minha cabeça bamber e duas mãos ao meu redor. Sabina diz alguma coisa sobre "tomar cuidado" e segura a cama. Olho ao redor procurando algo que seja comparado ao que acabei de viver, mas não vejo nada além dos aparelhos, máquinas, sofás e um par de olhos preocupados.

— Any? Querida, calma. — Ela pede e consigo escutar Love of my Life ao fundo.

— Estou viva? — Sinto dor. A dor me trás de volta.

— Sim, você está. Você é tão forte.

Assinto e ela me abraça. Sabina chora mais do que eu e a deixo chorar. Deixo que ela ache que eu fiz isso sozinha.

O amor do Josh me salvou. Murmuro, mas ela não escuta. O amor dele.

My Teacher  - Beauany 2TempOnde histórias criam vida. Descubra agora