Um amor inevitável - Parte 2

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Interior de São Paulo, três anos depois.

— Eloise! Onde estão os frascos?

— Eu deixei... — Foi possível ouvir os saltos batendo nos tacos de madeira dos degraus da escada — espera aí...

Ela se enfiou no cantinho que havia embaixo da escada e retirou uma caixa cheia de frascos amarronzados identificados com etiquetas feitas de esparadrapo.

— Então esse é o novo lugar de guardar os frascos?

— Por hoje, sim. Amanhã eu arranjo um novo esconderijo para eles.

— Pelo amor de Deus, Eloise. Eu preciso dos remédios. — Carlos pegou um punhado bem generoso de frascos e colocou na sua maleta.

— Tem noção de quanto tempo eu levo para produzir isso aqui? E você os deixa por aí como "estoque".

— Logo vamos sair daqui, Eloise. As pessoas precisam estar prontas para sobreviverem sem nós. Sem nossa ajuda.

— Você está dizendo isso há cinco meses, Carlos. Cinco.

— Mas pode acontecer a qualquer momento.

Ela vestiu um casaco fino por cima do vestido branco e lembrou de pegar o chapéu antes deles saírem.

— Espera que eu me apegue às pessoas daqui para dizer que precisamos nos mudar.

— Não é isso. Eu estou fazendo uma pesquisa. No momento em que as possibilidades de pesquisa aqui se esgotarem, então o nosso tempo acabou.

— É mentira. O material para sua pesquisa já acabou faz tempo e só estamos aqui ainda por conta de Joana. Pensa que eu não sei.

— Joana vai ter que aprender a viver sem nós. Quando falei das pessoas daqui, também me referia a ela.

— Você não se referia a ela, e sabe bem disso. Admita, Carlos. Você não quer deixá-la. E sabe bem o porquê.

— É só uma criança.

— Uma criança que vai... — Eloise suspirou, ela não queria dizer aquilo. Não queria terminar aquela frase.

Os dois caminharam em silêncio pela estrada de terra que levava até o que chamavam de centro. Um pequeno centro, com uma pequena mercearia, poucas casas, uma pequena praça e uma pequena igreja para a qual eles se dirigiam. Rasparam a terra dos sapatos na escada antes de adentrarem, molharam os dedos na água benta e se benzeram na entrada. A missa já havia começado.

— Dr. Carlos. — Luzia, uma das vizinhas, se virou para cumprimentá-los aos sussurros — Dona Eloise. Pensei que não vinham. Já tava me perguntando se caíram no poço. Os dois nunca se atrasam pra missa.

— Sim. — Carlos sussurrou de volta, se esticando de joelhos para que a moça o escutasse do banco da frente — Mas a Sra. Eloise anda escondendo nossos remédios. É cada vez uma tarefa mais difícil conseguir achá-los. Eu poderia dizer que se torna uma tarefa divertida, quase um desafio, se não fosse a vigésima vez apenas nesse mês.

— Ele está acabando com todos os nossos remédios, Luzia! — Eloise se explicou, sussurrando também, com as mãos à frente do corpo em sinal de prece pois o padre estava no meio de uma reza — Logo alguém vai precisar e não teremos, pois o Dr. Carlos os dá para os viajantes, para os peões... enfim, todo mundo!

— Eles precisam ter um estoque em casa! — Carlos protestou.

Luzia riu.

— São lindos demais os dois. Se vocês não se casassem não tava certo.

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