— Nori!
O chamado me faz erguer a cabeça, desviando o olhar do ponto que tenho observado desde que Daniel partiu.
— Que bom que não saiu daqui — chama Frida, puxando meu braço. — Precisamos ir. Agora.
— O quê? Por quê?
Bato o cotovelo na parede com a pressa, sentindo um choque que me faz grunhir e espalmo a mão ali para evitar novas colisões. No lugar onde estavam as cicatrizes dos cortes de vidro — que sumiram quase totalmente, mas continuo sentindo — há uma coceira forte ao ponto de eu ter que enfiar as unhas em minha pele, resultando num guincho de dor, tamanha a força usada. Puxo uma mão para perto do rosto, vendo um brilho pálido de suor formando um caminho arrepiante em minhas palmas, cruzando e deitando e virando.
Ofego, com um trêmulo gesto para tirar um cacho escuro que cai em meu rosto, saindo do coque improvisado. Tenho que afirmar a mim mesma que as formas do enigma são diferentes e deixo Frida apressar meus passos.
— Vem logo. — Puxa-me e para em frente à porta do quarto. Não tenho chance de protestar. — Chiara, estamos indo para a biblioteca. Não vou repetir: pode ficar e esperar ou vir e ficar com a gente.
Escuto uma cama ranger e uma porta bater enquanto em parte caminho e em parte corro.
Sou, mais uma vez, conduzida pelo corredor, ouvindo os sons de Chia se movendo para acompanhar-nos quando cruzamos o corredor para a parte Sul. Descemos, viramos, viramos e corremos sendo guiadas por uma eufórica Frida, que não dá descanso, fazendo curvas e voltas por caminhos que desconheço. Paramos quando chegamos à biblioteca, sem escutarmos sons que denunciem o segmento da tortura a Enzo.
— É o seguinte — fala Frida, ligeira. — Encontramos Sam, falamos com ela e ela concordou que tem novidades e talvez informações.
— Meu irmão? — Interrompe Chia. — Ele está aí?
— Não — a morena nega com rapidez, prosseguindo antes que Chia possa protestar. — Mas ela pode lhe dar notícias sobre ele, se concordar em entrar.
Com um aceno hesitante conjunto, cruzamos a soleira da porta.
A biblioteca está vazia. Seu costumeiro ar de aconchego e familiaridade me invade, sendo mais forte que a opulência e grandeza que seu tamanho apresenta. Cruzamos o túnel que passa por entre as prateleiras, e eu toco o teto que faz o chão do primeiro andar com os dedos, baixando a mão apenas quando ultrapassamos o túnel e adentramos a área de reuniões.
É inevitável fitar o lugar onde Enzo estava.
Ao contrário do que penso, não paramos em frente à mesa de reuniões. Parece que vou conhecer a sala onde Penny foi mantida em seu primeiro dia.
— Olá, meninas — cumprimenta Sam, quando adentramos a sala.
A porta é fechada enquanto acenamos para Penny, que parece um pouco deslocada sentada numa cadeira. O que Penny está fazendo aqui? Normalmente ela não participa de nossas conversas com Sam sobre os Cae, o enigma ou qualquer outra coisa. Nem nós deveríamos ter essas conversas, para ser sincera. É tudo permeado por segredos, tradições fechadas e mistérios que não deveriam passar dos limites da Reserva e da segurança da proteção de Samuel. E nós não somos Cae e, tenho certeza, nunca seremos.
— Sigam-me sem uma palavra.
Olhamo-nos entre nós, deixando Sam puxar a mesinha que ocupa um pedaço da sala. As três cadeiras, duas de um lado e uma do outro, são afastadas. Frida e eu ajudamos Sam a desencostar a parte direita do móvel da estante que cobre a parede e, depois, a puxar a porta que conserva os livros ali. Mapas e objetos são jogados sobre o chão, e, para nosso espanto e admiração, a parte traseira da estante é retirada com dificuldade e jogada no chão, revelando um comprido corredor escuro, como o de ventilação que usamos clandestinamente há pouco.

VOCÊ ESTÁ LENDO
Artefatos de Sangue
Paranormal"Eu nunca quis ser parte disso. Nunca quis fazer parte dessa guerra. Nunca quis ter que escolher um lado. Mas, por eles, e por mim, eu finalmente queria tentar". Embarque nessa aventura, afogue-se nessa história enigmática e envolva-se num mundo de...