—Vamos, Lise! — Clamou a voz infantil. — Antes que sejamos pegas.
Estou imersa na cena das duas garotinhas rodopiando no minúsculo sótão inutilizado, um cômodo preso ao tempo passado como os poucos móveis que ali estavam. A poeira e o escuro eram as solitárias companhias das duas meninas, que seguiam em sua brincadeira, rindo alto a cada segundo, mais alto do que o recomendado no apertado prédio silencioso.
— Ela não sabe que estamos aqui —, retrucou a segunda voz. — Vamos fazer o jogo do Relógio. Eu começo!
Somente passos podiam ser ouvidos na casa. Passos de pés pequenos no solo ruidoso. Passos agitados de correria num jogo inocente. E passos abafados e distantes que não deveriam estar ali...
— O relógio faz tique, o relógio faz tique...
A canção penetrou a névoa sem som, enquanto uma das garotas olha para um ponto vazio na parede de madeira, esperando a outra esconder-se no lugar de sempre: o espaço oco atrás do baú dos antigos tesouros da velha dona da habitação.
—... Ou ele fará taque e você ficará pra fora —, cantarolou, com as mãos abrindo e fechando em ansiedade.
A risada, agora solitária, ecoou entre as quatro paredes. Os passos desajeitados dos pés pequenos da menina trilharam o caminho de sempre. Ela ia ligeira, fazendo barulho, seguindo para o ponto que sabia ser o que a outra usava como esconderijo.
— Achei você! — Gritou, colocando-se ao lado do baú. Não havia ninguém. — Olá?
Ela engoliu o gosto amargo que aparecera de repente em sua língua, sem saber o que a esperava.
Um som gorgolejante soou, como o de uma pessoa se afogando ou engasgando com um copo de água. Com a curiosidade típica de uma criança, a garotinha seguiu observando o espaço para, então, localizar o buraco aberto na madeira, escondido por um tecido.
— Não adianta se esconder —, sussurrou.
Em silêncio, ela se dirigiu ao buraco na parede de madeira, esgueirando-se pela abertura com o máximo de cautela que uma criança pode ter, produzindo ruídos nada sutis.
Por fim, alcançou seu objetivo; não encontrou o que esperava.
Ali, era aguardada pelos olhos escuros que se desvaneciam aos poucos, perdendo o brilho com a mesma rapidez com que via a vida sendo perdida. Seu ofego, consumido pela quietude do quarto desconhecido que jamais havia descoberto, foi resultado da cena que se abria à sua frente, em algo que estaria para sempre gravado em sua memória.
Sangue. Tanto sangue...
"É sua culpa".
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Artefatos de Sangue
Paranormal"Eu nunca quis ser parte disso. Nunca quis fazer parte dessa guerra. Nunca quis ter que escolher um lado. Mas, por eles, e por mim, eu finalmente queria tentar". Embarque nessa aventura, afogue-se nessa história enigmática e envolva-se num mundo de...