Tenho tudo o que preciso

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Dez anos se passaram e eu não tinha percebido. Quer dizer, depois daquele funeral tanta coisa mudou, eu fiz duas atualizações na minha profissão, uma delas fora do país, fui fazer especialização em cardiologia, fiz na Espanha em uma das melhores universidades. Voltei de lá com a Maria Luíza nos braços. Uma aventura de uma noite, muita bebedeira, um desconhecido da residência médica e uma gravidez de brinde. Logo eu que dizia que não queria filhos... Maria Luíza foi o que me fez voltar para o Brasil e para a casa da minha mãe. Eu era uma mãe solo e contava com a ajuda da minha mãe que ja tinha uma certa idade, mas topava tudo. Éramos apenas nós três, eu, minha mãe e a Maria Luíza.
Foi quando Maria completou sete anos de vida que me dei conta de como o tempo estava voando, no mesmo dia meu celular me notificou sobre a reunião, a tão esperada reunião com as meninas na casa da Helena. Eu mantinha apenas algum contato com a Laura, ela também era médica e nos esbarramos algumas vezes em congressos e simpósios. Vanessa e Eloise, a irmã mais velha da Helena, eu não falava há anos, claro que sabia da Vanessa através das redes sociais. Mas da Eloise nada sabia, ela não gostava de mexer com essas "coisas", como ela mesma se referia a tecnologias.
Eu era uma mulher alta, estava mantendo meus cabelos lisos na altura dos ombros, era mais prático para cuidar e com rosto fino, porém marcante. Sei que quando me arrumava, chamava bastante atenção, entretanto ninguém me interessava, não depois da Helena, ela era a única que fez meu coração bater mais depressa. Enfim, não adiantava rememorar, mas é que a proximidade com o encontro tem me deixado agitada, ansiosa pelo que iria acontecer. Estar na casa da Helena não seria fácil, iria acender muitas memórias, essas das quais mantinha guardadas inacessíveis, pois me faziam sofrer.
Cheguei em casa um pouco mais cedo, queria conversar com minha mãe antes de ir. Fui recebida pela Malu, eu a chamava assim, achava carinhoso. Ela quase me jogou no chão animada, era sempre assim:

- Mamãeee!!!

- Oi minha Joaninha preferida! - abaixei para abraçar minha filha. Malu era uma criança muito bonita e esperta. Tinha longos cabelos cor de mel e olhos verdes.

- Eu sou sua única joaninha!

- Me pegou... - sorri com a sagacidade da Malu. Minha mãe se aproximou e falou:

- Chegou mais cedo.

- Sim... - respondi e continuei: - Vou arrumar minhas coisas para ir na casa da Helena, está lembrada que te falei?

- Mamãe posso ir com você??? - Malu indagou, eu não poderia leva-la, era deselegante, as meninas nem sabiam que eu tinha uma filha e era uma reunião mais séria, uma criança poderia atrapalhar.

- Filha, eu já tinha te explicado que vai ficar com a vovó nesses dias...

- Mas é que vou morrerrr de saudades!

- Vai passar assim, bem rápido. - estalei os dedos e continuei: - Cadê o calendário que te dei ontem, vou te ensinar a marcar as datas nele, assim você vai saber quanto que falta para mamãe voltar...

- Vou lá buscar! - Malu correu para o quarto para procurar o calendário me dando assim um espaço de conversa com minha mãe.

- Mãe, tudo bem você ficar com ela esses dias?

- Por mim tudo bem, o problema é a Malu que quer ficar grudada em você...

- Ela vai te ensinar a fazer as vídeos chamadas quando a saudades apertar. E se precisar de algo, ou ela ficar doente, eu venho aqui correndo, não é tão longe assim...

- É uma viagem filha, fica cansativo para você...

- Não importa... Eu venho.

- Você não parece muito empolgada com esse encontro... Achei que adorasse essas amigas.

- Sabe que tudo lá vai me lembrar a Helena, não é?

- Você precisa encerrar esse ciclo, seguir em frente, Helena se foi ha tantos anos filha... Deveria conhecer gente nova, como é o nome daquela moça do hospital que estava saindo? - minha mãe tinha a mente aberta e aceitava muito bem minha sexualidade, me dava muito apoio. Sempre me colocava para cima, eu não sei o que faria sem ela. Sorri e a abracei pelo carinho que ela tinha por mim.

- Sabe de uma coisa? Eu não preciso de nada e nem ninguém,  tenho tudo que preciso aqui em casa, minha mãe querida e olha ali quem está chegando... Minha bonequinha. - sorri pois Malu se aproximava munida pelo calendário e uma caneta.

Nós conversamos, jantamos, coloquei Malu para dormir e organizei tudo para viajar no dia seguinte.

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