CAPÍTULO 10

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ANTÔNIO

Eu sentia todo o meu corpo dormente, e uma dor intensa em meu peito. Como se a vida tivesse dado o soco mais dolorido que já tomei.

Doeu demais.

A traição que senti ao ler aquelas palavras retorna com força, e eu sinto vontade de chorar.

Por que isso tinha que acontecer? Por que comigo? Por que a minha filha?

Minha filha.

Solto uma risada irônica enquanto seguro o caderno da minha esposa em minhas mãos.

O caderno que acabou com a minha vida.

Eu queria sumir na minha inconsciência. Não queria acordar e precisar olhar nos olhos da Maria, e precisar matar o amor que ela sentia por mim.

Mas uma voz me fazia voltar da escuridão todos os dias.

Era uma voz leve, como o soar de sinos nos meus ouvidos. E um toque que queimava igual fogo em minha pele.

Todos os dias eu esperava pelo seu 'bom dia', e sentia vontade de sorrir quando ela começava a falar sobre amenidades.

Mas então eu me recordava do motivo de eu estar inerte e a raiva voltava com força.

Como ela pôde? Como eles puderam?

Tentando me esquecer pelo menos um momento do que o futuro me aguardava, me levanto e olho para a paisagem da minha varanda.

O céu estava radiante, um azul tão claro salpicado de nuvens brancas como algodão. Recordo-me de ouvir todos os dias ela dizendo como o céu estava maravilhoso. Ela me fazia sentir vontade de abrir os olhos e olhar a paisagem novamente, e, sobretudo olhar para ela, a mulher que me tirava da escuridão.

Nesta manhã, senti o peso de seu corpo colado ao meu, seus cabelos faziam cócegas no meu peito e braço, e sua respiração era calma e serena. Eu sentia paz. Como há muito tempo eu não sentia. Foi então que abri os olhos e fitei o teto do meu quarto pelo que pareceram horas até ela se mexer e olhar em minha direção.

Linda.

Seus cabelos loiros estavam bagunçados, e seus olhos inchados da noite de sono, mas isso não apagou nada de sua beleza.

Sua pele era clara, e seus olhos de um castanho claro como a cor do meu whisky preferido. Sua boca tinha o desenho perfeito, seus lábios convidativos, por um momento desejei prova-los, sentir como se encaixariam aos meus. Recordo de seguir o olhar pelos seus ombros e braços e notar mil pintinhas pelo caminho, como canela salpicada em cima do melhor doce...

Ela era minha médica.

Droga.

Balanço a cabeça tentando esquecer a visão de sua pele perfeita.

Ouço passos vindos pelo corredor e escondo o caderno embaixo do meu travesseiro.

- Filho! - minha mãe entra no quarto e corre em minha direção, me abraçando apertado. - Ah, Junior! Você quase me mata, meu filho! Eu sinto que perdi anos da minha vida em poucos dias! - ela chora.

- Calma mãe, está tudo bem. Eu estou aqui. - digo abraçando-a de volta.

- Ah, como é bom sentir o seu abraço de novo, meu filho. - ela suspira.

- Mãe... - eu começo, mas não consigo terminar de formular a frase.

- Fala comigo meu filho, você sabe que pode me contar tudo. - ela suplica.

Sento-me em minha cama, e ela se senta ao meu lado.

Respiro fundo e começo a falar, tirando do fundo do meu peito a dor mais profunda que já senti.

CLAREOUOnde histórias criam vida. Descubra agora