Domingo chegou calmo no povoado Italiano de Pescara, seguia calor, por vezes suportável, outras nem tanto.
Antonella acordou cedo, com a diferença de 5 horas, ela queria poder usufruir de todo o tempo que dispunha para tentar contato com alguém que desse uma resposta sobre seu filho em Buenos Aires. Depois de muitas tentativas frustradas, ela resolveu ligar na casa de Ruggero e para sua surpresa Lucas atendeu:
- Oi, quem fala?
- Aí Lucas por Deus, finalmente alguém me atende! É Antonella, mãe do Ruggero. - falou Antonella.
- Oi, como está? - perguntou Lucas tentando pensar em algo para dizer.
- Estou bem, me conte Ruggero esta por aí? - seguiu Antonella.
- Está no estúdio gravando, tem agenda a semana inteira. - contornou o melhor que pode Lucas.
- Ah, mas ele está bem? - perguntou Antonella.
- Está, esta sim, só na correria. - respondeu Lucas querendo que ligação acabasse logo.
- Aí que bom, pode pedir a ele pra me ligar assim que puder? - pediu Antonella.
- Claro que sim, mas creio que vai demorar um pouquinho, ele está com a mente bem criativa, a senhora sabe como funciona, então tem que aproveitar, mas assim que puder ele vai ligar. Bom tenho que ir. - respondeu Lucas.
- Okay, obrigado Lucas. - agradeceu Antonella desligando em seguida.
Antonella suspirou de alívio, de relance viu a Karol vindo pelo corredor, virou para vê-la, estava um pouco pálida ainda, quando ela se aproximou mais Antonella foi por ela a perguntando:
- Ainda com cólica?
- Um pouco, mas está melhorando... - respondeu Karol puxando uma das cadeiras e se sentando.
- Consegui falar com Lucas! - contou logo Antonella.
- Conseguiu?? E como ele esta? - questionou Karol se inclinando pra frente para conter a cólica, mas atenta para a resposta.
- Ele esta bem, só está correndo com muitas coisas porque esta em ascensão criativa, então não pode perder o fluxo, mas assim que as coisas se acalmarem vai ligar. - respondeu Antonella se sentando a sua frente lhe segurando uma das mãos.
- Porque não me sinto aliviada... - explanou Karol.
- Vai se sentir melhor aos poucos vai ver. - disse Antonella.
- Nella, é normal incomodar assim? - perguntou Karol olhando para seu lunar.
- Não muito, mas você ficou nervosa, mas não pense nisso, hoje você vai ficar descansando, amanhã bem cedo você tem exame de sangue, depois vai ver a doutora e vamos saber como está tudo sim. - explicou Antonella.
Karol olhou para si por um instante, ainda segurando as mãos de Antonella, em um rompante a abraçou e foi retribuida. Antonella não disse nada, apenas ficou ali a apoiando, sabia que eram muitas coisas acontecendo juntas, mas também sabia que todas passariam mais cedo ou mais tarde.
No hospital em Buenos Aires, Ruggero estava acordado, porém calado, as enfermeiras tentavam falar com ele, mas ele não respondia, piscava os olhos, mas seguia com olhar caído e sem rumo. Mais tarde o médico passou para vê-lo:
- Como está se sentindo? - perguntou o doutor.
Ruggero seguiu do mesmo jeito.
- Olha Ruggero, preciso que você me responda mesmo que monosilábico como esta se sentindo, para sabermos se o tratamento esta sugerindo efeito. - insistiu o doutor.
- Acabei de perder a pessoa mais importante da minha vida... nada mais tem importância... - respondeu Ruggero rouco.
- Você está vivo, precisa se ajudar para o tratamento fazer efeito e você melhorar. - quis contornar o médico.
- Doutor, pode para de tentar. - deixou claro Ruggero.
O médico balançou a cabeça em negação, saiu da UTI em direção a sua sala. Em seu consultório ligou para Lucas pedindo que ele e Camila fossem para lá com urgência.
Não demorou muito os dois chegaram e sob orientação foram para a sala do médico, aguadaram uns instantes, logo ele apareceu e lhes foi dizendo:
- Ele acordou, mas está muito desmotivado, os exames dele da manhã mostram uma sepse grave se espalhando e rápido, ele me disse para não tentar salvá-lo, por isso os chamei, para ver se vocês conseguem demovê-lo.
- Podemos ver ele? - perguntou Lucas um pouco desorientado com a informação.
- Sim, me acompanhem. - respondeu o médico.
Subiram até o andar da UTI, na entrada o médico os fez lavarem bem as mãos e os colocou roupas especiais para entrarem na ala. Passaram por vários pacientes até chegar em Ruggero, que estava com muitos equipamentos ligados a ele, dois acessos simultâneos recebendo medicamentos intravenosos e um catéter na perna direita. Não era a visão que eles imaginavam, estava pálido respirava fundo e pausadamente, Lucas tocou em seu pé, o que o fez abrir os olhos, ao vê-los os perguntou:
- O que fazem aqui?
- Viemos ver como você está... - respondeu Lucas.
- O doutor nos avisou que você havia acordado... - contou Camila.
- Irmão você precisa fazer um esforço para melhorar ... - disse Lucas.
- Eu não tenho que fazer esforço, vocês não tem que estar aqui... - disse Ruggero quase perdendo a voz.
- Rugge você precisa se ajudar ... começou Camila.
- Eu só quero morrer em paz... é meu último pedido. - disse Rugge fechando os olhos.
- Irmão não diga isso, você vai melhorar... - disse Lucas.
- Me deixem morrer, é o que eu quero. - deixou claro.
- Rugge não diga isso, sua vida não acabou, seus pais te amam, seu irmão conta com você, não reaja assim. - exteriorizou Camila.
- Camila, o Lucas gosta de você, fique com ele. Meus pais entenderão, Léo tem sua vida... Não quero que vocês venham mais aqui, respeitem a minha vontade. Sem a K... - suspira, soluça - sem ela não existe mais nada, então eu também não preciso mais existir... por favor não insistam e vão embora, me deixem ir...- concluiu Ruggero fechando os olhos.
Camila e Lucas se olharam, Camila fez menção de dizer algo mais, mas Lucas a segurou, os dois saíram da ala da UTI, calados, ao vê-los o médico se aproximou e perguntou:
- Conseguiram alguma motivação?
- Não senhor, ele nos pediu para deixa-lo partir. - respondeu Lucas emocionado.
- Bom, vamos fazer o possível por ele mesmo assim, qualquer coisa os aviso. - disse o médico visivelmente descontente.
Em Pescara, após um almoço leve e equilibrado, Karol saiu para o jardim, olhou as flores estavam cada vez maiores e mais frondosas, na árvore os esquilos vinham brincar, ela sempre deixava nozes para eles. Em um galho mais baixo, um pássaro construía um ninho bem redondinho. Em cima do muro havia um gato laranja e branco, com a sua coleira de guizo, ela sempre o via no muro sentado, mas dessa vez ele desceu, se aproximou dela, ela se sentou sobre a toalha que já morava ali, o gato chegou mais perto, subiu em seu colo, ronronando, ela pode ver na coleira o nome "Thinker" e o disse lhe fazendo carinho:
- Devem te chamar de Thinker por conta do tilintar no guizo, presumo.
Ele sempre a observava de longe, mas parece que havia percebido que ela não estava bem por isso se aproximou, cães e gatos parecem ter um sexto sentido muito desenvolvido. Karol ficou ali com seu novo amigo, dentre tantos ali no jardim, mas seu coração não está tranquilo, sua mente estava uma bagunça, derepente uma tristeza a invadiu era profunda e dolorosa, algo a dizia que era ele que não estava bem, estranhamente era como se ela pudesse sentir o que ele estava sentindo, havia algo errado e ela não sabia o que era, sem se conter passou a chorar, Thinker a observou um instante e correu até a janela da cozinha miando para chamar a atenção de Antonella que ao percebe-lo o questionou:
- Thinker? O que faz aqui, você nunca desceu do muro, o que está havendo?
O gato seguiu miando apontando com a cabeça o jardim, Antonella limpou as mãos no avental e saiu pela porta ainda questionando o gato, até ele seguir em direção a Karol e ela entender. Antonella correu até lá, se ajoelhou no chão e a perguntou preocupada:
- O que esta acontecendo?
- Rugge não está bem... - respondeu Karol em meio ao choro.
- Ah carinho falei com Lucas de manhã ele me garantiu que está tudo bem. - disse Antonella.
- Não está... - soluça - Eu sinto aqui dentro, tem algo acontecendo com ele e não é bom... é como ele estivesse mergulhando em uma tristeza profunda que lhe causa muita dor... não sei explicar... - contou Karol ainda chorando.
Antonella no fundo sabia que o que Karol estava sentindo era verdadeiro, mas ao mesmo tempo ela tinha uma certeza dentro de si que seu filho de alguma forma ficaria bem, que sua missão nesse momento era cuidar de Karol.
- Venha carinho, vamos entrar, aqui está muito quente, você precisa descansar, dormir um pouco pra se desligar desses pensamentos. - sugeriu Antonella.
- Não são pensamentos... eu estou sentindo... - quis se fazer entender Karol.
- Eu compreendo filha, mas mesmo assim, você precisa de descanso, venha. - reinteirou Antonella se levantando e estendendo as mãos para ajuda-la a se levantar.
Um pouco receosa, olhou para o gato, que parecia a dizer com o olhar que Antonella estava certa, diante disso Karol aceitou, fez carinho no gato, o agradeceu, segurou nas mãos de Antonella e se levantou sendo amparada até dentro da casa.
Antonella a levou até o sofá, a fez se deitar, meio a contragosto, a cobriu na região do lunar com uma manta e a disse:
- Vou ficar aqui cuidando de você até que você relaxe e durma, você precisa filha, seu bebê precisa, então deixe o sono ganhar dessa vez sim.
Karol concordou com a cabeça, demorou um pouco, ela relutou bastante como criança que tem sono mas não quer dormir, mas no fim o sono venceu e ela conseguiu relaxar entrando em sono profundo.
Em um lugar longínquo, mas nem tanto, onde o tempo e o espaço são mera ilustração, onde os campos são amplos, verdejantes, com fileiras de grandes eucaliptos aqui e ali, ele caminhava pela pequena trilha de chão batido, cabisbaixo, sem um rumo certo, a ausência dela fazia sua alma doer como nunca havia sentido antes, ele não sabia muito bem como havia chego ali, nem onde aquela trilha o levaria, ele só seguia era o que estava o ajudando a não cair em desespero. No entanto de longe ouvia uma voz o chamando "Rugge!", ele parou e olhou pra trás, pensou por um segundo que seus olhos estavam lhe pregando uma peça, ela disse outra vez "Rugge, espera", ela vinha correndo, quanto mais perto ficava, mais ele identificava, quando teve certeza que era ela, ele correu, correu o mais rápido que pôde, até abraçá-la e ergue-la pressionando ela contra si mesmo, chorando a perguntou:
- Diz pra mim que é você mesma que eu não tô louco?
- Sou eu sim! - ela o respondeu.
- Não vou conseguir te soltar... - deixou claro ele.
- Então não me solte... - pediu ela.
Ficaram ali por algum tempo, até ele a por no chão, a soltar um pouco para olha-lá, seus olhos se encontraram com tanta intensidade que era como se mergulhassem um no outro. Ela o fez carinho no rosto, o que o fez segurar sua mão e lhe dar um beijinho na palma, sem delongas ela começou:
- Eu estou bem, estou viva...
- Mas Diego... - quis interromper ele.
- Não acredite, porque é mentira, eu estou bem viva, em um lugar seguro, estou bem, sendo bem cuidada... - seguiu ela.
- Mas onde? - interrompeu ele outra vez.
- Em um lugar que você conhece bem, te prometo que nós vamos nos encontrar logo, mas preciso que você fique bem, pra que eu possa ficar bem. - disse e pediu ela.
- Tá bom ... - concordou ele se aproximando dela a beijando suavemente e sendo retribuido.
Ao se soltarem ela olhou o horizonte e lhe disse:
- O sol aqui está se pondo você precisa ir.
- Onde estamos? - perguntou ele.
- Em casa... - respondeu ela.
Ele não a questionou, porque de alguma forma entendia o que ela estava querendo dizer.
- Vai... - pediu ela.
Ele a beijou mais uma vez, a soltou e começou a seguir a trilha olhando pra ela, a uma certa distância ele gritou:
- Karol?
- Sim Rugge! - respondeu ela.
- Eu amo você! - gritou o mais alto que pode ele.
Ela sorriu e lhe gritou:
- Também te amo Ruggerito! Nos vemos logo!