NATÁLIA AMARALNO DIA SEGUINTE
Assim que amanheceu, resolvi voltar para o Vale do Café. Não quis atrapalhar Eloá, já que ela parecia feliz demais ao lado de Corrado, e eu estava ainda mais feliz por minha amiga. Ela merece ser feliz, e Corrado me pareceu ser um homem bom. Quando cheguei em casa, encontrei o mesmo homem de sempre na porta, estaciono meu carro. Desço e ele vem ao meu encontro.
- Bom dia, Natália!
- Bom dia, Davi! - Tento passar por ele, mas sou impedida. É sempre a mesma coisa. Davi deve ter uns 29 anos, cabelo mal cuidado, barba grande, roupas sujas. Não acredito que seja morador de rua, mas não deve viver uma situação muito boa. Seu sorriso cínico nos lábios me assusta, morro de medo dele. Acho que tem algo de mal nele.
- Vai me deixar entrar hoje? Preciso de um banho. - Respiro fundo, com uma dor de cabeça de matar e as vistas doloridas, tento não perder a paciência com ele.
- Estou sozinha, Davi, e não posso receber homens em casa. - Respondo chateada. Ele sempre monta barraca aqui na porta, exigindo entrar na minha casa. Um dia, eu o vi tentando pular o muro. Liguei para o vizinho Josué, e ele expulsou Davi de cima do muro com algumas pauladas. Sou terminantemente contra violência, mas em alguns casos é necessário.
- Sempre a mesma desculpa. Vocês precisam me deixar investigar. Vocês devem alguma coisa, por isso nunca permitem que eu entre. Quando eu descobrir, vou colocar todos vocês na prisão. Não existe apenas eu à procura, Natália. - Com suas novas ameaças, ele me deixa no portão e se vai. Mais uma vez, sinto um frio na espinha ao imaginar quem mais pode estar por trás disso. O pior é saber que meus pais não se importam com minha segurança. Já relatei um milhão de vezes as ameaças que recebo do Davi e até mesmo de alguns carros rondando nossa casa, mas é sempre a mesma resposta: Davi possui problemas mentais e não tem ninguém mais por trás de suas ameaças sem fundamentos.
Suspirando, abro o portão e o tranco. Ligo o alarme e sigo para dentro de casa, trancando a porta para poder respirar fundo. Sei que preciso destrancar antes de Eloá aparecer, mas acredito que posso ter um momento de alívio no banho antes de ter a casa aberta e o pressentimento de que vou ser atacada a qualquer momento por um maluco.
Guardo minha bolsa e resolvo ir direto para o banheiro. Retiro meu vestido e percebo que ainda estou sem calcinha. Entro no box e ligo a ducha, deixando a água cair por meus cabelos e corpo. De olhos fechados, ainda consigo me lembrar de cada toque e arrepio que William causou em meu corpo, cada palavra autoritária e comando. Se eu tivesse sido um pouco mais inteligente e contado a ele que era virgem, talvez a nossa noite tivesse acabado de uma forma diferente.
Depois de me lavar, visto uma minissaia e um top. Amarro meus cabelos em um rabo de cavalo e sigo para a cozinha. Às vezes, minha vida é muito solitária, e isso me deixa um pouco deprimida. Já quis adotar um gatinho ou um cãozinho, mas depois desisti. Não vou condená-lo a uma vida infeliz como a minha.
Preparo meu lanche e, para não comer sozinha, invado a ala proibida. Bato na porta e custam a me atender.
- Deixe-me entrar, dona Camélia. - Ela me olha com reprovação.
- O que faz aqui, menina? Se seus pais a pegarem aqui, estou na rua da amargura. - Eu passo por ela com minha bandeja de café da manhã.
- Bobagem. Sabe que eles não param em casa, por isso você está aqui, não é? - Camélia sorri com os olhos, mesmo fingindo desaprovar minha desobediência. Eu nunca fui muito de seguir regras, até porque meus pais nunca as impuseram. A única regra do meu pai era nunca vir para essa ala, e na primeira chance que eu tive, eu a quebrei. Apenas por ser proibido. Eu tinha doze anos na época, e desde então sempre venho aqui. Me sinto menos sozinha na companhia de Camélia. Me sento no pequeno sofá da modesta casinha de telha colonial. É bem pequenininha, mas aconchegante. Ela possui uma sala com dois sofás e uma estante antiga com uma TV de tubo, alguns quadros de fotos, alguns vasinhos de flores. Na cozinha, tem uma mesa redonda de quatro cadeiras, um armário de madeira antigo, com panelas que chegam a brilhar de tão bem areadas, alguns poucos pratos de vidro, outros de alumínio, xícaras pequenas de enfeite e algumas de alumínio para tomar água. Tem um filtro de barro e um fogão de quatro bocas. Começo a comer meu sanduíche observando Camélia arrumar suas coisas no lugar ao tirar poeira.
- Percebi que não dormiu em casa essa noite. - Revela minha travessura, e eu sorrio para ela. O que me faltou de conselhos e broncas da minha mãe, eu tive de Camélia.
- Eu fui a um clube de sexo. - Revelo, e a pobrezinha quase tem um ataque cardíaco. Ela chegou a se sentar.
- Você o quê? - Ela grita histérica, sentada no sofá, me encarando. Eu sorrio travessa e tomo um gole do meu suco.
- Fui a um clube de sexo, Camélia. - Ouvimos um ataque de tosse ao fundo, e eu cubro minha boca.
- Me perdoa, Maria. - Grito, mesmo sabendo que a pobrezinha não pode me responder, pois estou longe do quarto dela.
- Por que você foi a um clube de sexo, Natália? - Dou de ombros e termino de comer meu sanduíche.
- Curiosidade? Eu recebi dois passes e resolvi que deveria ser um pouco ousada e fui até lá. - Explico, deixando a pobrezinha vermelha. Ela corre até o quarto de Maria, e eu a sigo, deixando a bandeja na mesinha de centro da sala. Chegando lá, vejo Maria de olhos abertos e escorada na cabeceira da cama. Eu me aproximo com cuidado.
- Sente-se aqui, minha querida. - Sua voz rouca e fraca me chama, e eu me sento ao seu lado enquanto ela segura minha mão.
- Conte-me o que aconteceu. - Ela pede, não com reprovação, mas com curiosidade e preocupação. Então narro tudo o que aconteceu, até mesmo a parte do quase sexo, e ela sorri quando termino, com lágrimas nos olhos.
- Oh, minha querida, ele não tirou sua virgindade. - Ela explica, e eu a encaro indignada.
- Mas doeu.
- Não é porque doeu ou porque ele a penetrou com os dedos que você não é mais virgem. E nem foi culpa dele. Conheço você muito bem, minha querida. Quando você bebe, não possui filtro, e não devemos mexer com o que não conhecemos, certo?
- Sim, a senhora tem razão.
- Claro que tenho, minha querida. Você é uma mulher tão bem resolvida, mas quando se trata dos caminhos do coração, fica perdida. - Maria me entende tão bem. Quando eu ainda era adolescente, sempre desejei que ela fosse minha mãe. Mas Maria é um pouco doente, vive acamada, sempre aos cuidados de Camélia, nossa única funcionária. Meu pai permitiu que ela morasse aqui com sua irmã, desde que ela fosse minha babá e cuidasse dos serviços de casa, e Camélia prontamente aceitou.
- Pelo que entendi, você travou ao perceber que sua primeira vez não iria sair do jeito que sempre idealizou. Uma coisa que você precisa entender, minha querida, é que a vida nunca sairá da forma que planejamos. Sempre precisamos ter os pés no chão e nos preparar para a realidade, seja ela qual for. - Eu me inclino e abraço ela, que corresponde imediatamente com carinho.
- Às vezes me pergunto o que seria de mim sem você. - Falo fungando.
- Apenas a senhora me conhece, apenas a senhora sabe quem sou de verdade. - Choro ao sentir todo o carinho que Maria tem por mim.
- Eu vivo por você, minha criança. - Desde que a conheço, ela sempre me diz isso, e eu sempre chorava quando ela dizia essa frase tão carinhosa. Um carinho que não recebo dos meus pais.
- Natália, um carro muito chique parou na esquina. Acredito que seja sua amiga. Está na hora de você se despedir de minha irmã. Sabe que esse é um dos segredos que devemos manter escondidos. - Concordo com a cabeça e me aproximo dos cabelos negros e volumosos de Maria, beijando-os, enquanto seus olhos estão brilhantes e seu sorriso é amoroso.
- Eu volto amanhã.
- Estarei esperando, minha querida. - Então saio do quarto, e Camélia já havia levado minha bandeja. Saio da ala proibida e corro para minha casa, me preparando para sorrir e conversar com minha querida amiga.❤️NOTA DA AUTORA❤️
Esse capítulo é crucial para o livro. Gostaria de ouvir suas teorias sobre quem é Davi e o que ele busca. Confesso que estou indecisa sobre o papel dele na trama.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Ligados Pela Obsessão
RomanceLivro+18 Natália, uma jovem de 25 anos do interior de Minas Gerais, sempre viveu sua vida sem limites, até que um furacão de caos e dominação chamado William entra em seu caminho. William, aos 34 anos, é um membro da Máfia siciliana que veio ao Bras...