CAPÍTULO 64

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               NATÁLIA AMARAL

Essa noite, quase não dormi. William me acordou umas três vezes para fazermos sexo. As duas primeiras vezes foram desesperadas; ele me colocou contra a parede e tomou meu corpo de maneira faminta. Mas, da última vez, foi diferente. Parecia haver sentimentos. Não precisou de ordens, de toques ásperos ou de desespero. Foi lento, carinhoso, cheio de olhares e sem nenhuma palavra. Foi tão intenso que algumas lágrimas escaparam dos meus olhos, como se fosse uma despedida, pois ele nunca agiu assim comigo. Nunca me tratou com tanto cuidado, carinho e atenção. Foi com ternura, quase um adeus, e até agora não tive coragem de abrir os olhos, temendo não encontrá-lo mais aqui, temendo que, como das outras vezes, ele tenha partido me deixando sozinha, e desta vez sei que será para sempre. Talvez eu deseje que não haja despedidas. Eu não saberia conter meus sentimentos, não conseguiria gritar "eu te odeio" quando o amo. Eu só queria que essa dor sumisse, que ficassem apenas boas lembranças, mas não é tão simples assim, nunca é.

— Vai fingir que está dormindo por quanto tempo mais? — Minha visão já nadava em lágrimas, temendo o pior, quando ouço sua voz rouca e baixa. Viro-me para o lado dele e, temendo ser apenas um sonho, abro meus olhos bem devagar. Nossos olhares se encontram, o azul escuro dos olhos dele tirando meu fôlego. Seu rosto é marcante, seu olhar parecia querer desvendar todos os meus segredos. A sobrancelha bem delineada acentuava ainda mais sua expressão determinada. Seu nariz reto, a boca bem desenhada, os cabelos pretos lindos, a barba por fazer, só acrescentando charme e periculosidade a ele. Um combo perfeito. Ele poderia muito bem ser o homem com quem eu uma vez idealizei uma família de comercial de margarina, daquela que eu poderia ter filhos que amaria mais que a própria vida, um lar cheio de amor e harmonia. Sem poder me conter, ergo a mão e deslizo por seu rosto. William, num primeiro momento, se assusta e chega a erguer a sobrancelha, mas quando acaricio seu rosto de leve, ele fecha os olhos e me surpreende ao pegar minha mão e beijar o dorso.

— Você está aqui. — Afirmo, e ele me encara confuso. Eu sorrio. Percebo que meu corpo está nu quando sinto um arrepio de frio correr pelas minhas costas e seios.

— Onde mais estaria?

— Não sei, imaginei que ontem seria nossa... hum. — Ele nega com a cabeça, discretamente.

— Ainda não. Entretanto, voltaremos para o Vale do Café em dois dias. — Sua resposta corta-me ao meio.

— Isso quer dizer que nosso tempo juntos está se esgotando. — Sussurro, e o vejo engolir em seco. Ele não me responde, ficando em silêncio.

— Vá tomar um banho e se arrumar. Quero levá-la para conhecer alguns pontos turísticos que fazem parte da pousada. — Pela primeira vez, ergo a sobrancelha para ele.

— Você não vai trabalhar hoje? — Ele nega com a cabeça. — Não vai viajar? — Novamente, ele nega. — Vai passar o dia comigo?

— Acho que mereço um descanso. — Revela ao se levantar da cama e caminhar para fora do quarto, me deixando só. Ontem, as revelações que fiz a William tiraram um peso que eu nem imaginava sentir. Poder dizer tudo que aconteceu em voz alta foi libertador. Ter a quem desabafar, chorar e a quem me agarrar me fez sentir mais forte. O que passamos naquela noite ainda me assombra e me tira o sono às vezes. Eu nunca tive coragem de perguntar a Maria e a Camélia sobre o que foi dito naquele dia, acredito que por medo da verdade. Mesmo que, lá no fundo do meu inconsciente, eu saiba a resposta, não estou preparada para o impacto que isso teria não só na minha vida, mas na vida de toda minha família.

Resolvo me levantar, ir ao banheiro e tomar um longo banho. Escolho uma calça jeans preta e um cropped branco, nada muito revelador; apenas quero ficar confortável para o passeio. Tentarei não pensar que terei apenas mais dois dias ao lado de William.

Ligados Pela ObsessãoOnde histórias criam vida. Descubra agora