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Nem mesmo brasa poderia queimar tanto naquele momento, não conseguia abrir os olhos pela dor maçante que estava na barriga, uma dor conhecida, mas que não tinha coragem o suficiente de olhar para ver o que estava acontecendo.

Sentiu as veias que jaziam no pescoço saltarem ao grunhir, a mão segurou firme o lençol da cama. O coração acelerou e de repente, nada, nenhuma dor ou incômodo.

O ar saiu dos pulmões ao mesmo tempo, em que a visão embaçada teve contato com a luz, mas não há luz do dia, uma luz diferente, quase celestial. Apenas um filete que desapareceu no momento em que olhou para o abdômen.

Levantou o edredom apenas para ver o corpo despido e ter a certeza da dúvida, e sim, tudo estava em ordem, como se a sessão de automutilação nunca tivesse sido feita. A respiração irregular ainda estava presente quando se sentou na cama e olhou em volta, a procura de algo, alguém, mas o silêncio era absoluto no cômodo e até mesmo na mente.

A água entrou em contato com a boca seca, revigorando os órgãos e seu interior lascivo. Sentia que algo estranho tinha acabado de acontecer naquele quarto, mas os olhos fechados e a pequena inconsciência de minutos atrás impossibilitaram a visualização.

A mente silenciosa era pretexto para sentir que a própria paz tinha adentrado de alguma forma em meu interior, pelo menos naquele momento. Porque em oito meses, foi a primeira vez que o silêncio foi encontrado na própria cabeça.

Se levantou e foi rumo ao banheiro, olhou no espelho por desencargo de consciência, mas os olhos não haviam pregado peças, estava inteira, totalmente regenerada.

A água morna limpou o sangue seco da madrugada, o único vestígio de que não tinha enlouquecido e que fez uma barbaridade e deixou todos com medo. Olhava para todos os lados a procura do diabo, mas ele não apareceu, por enquanto estava hibernando.

A roupa abraçou meu corpo de forma confortável quando se vestiu, era bom não estar exposta para quem quer que adentrasse o quarto. A audição apurada fez o chafariz de atenção ir para o nome Jefferson. Principalmente quando Cheryl citou meu nome e não soube o que responder, a amiga agia bem sobre pressão, mas não quando se tratava de Susan.

O barulho da porta sendo aberta e dos meus passos chamou a atenção das três figuras na cozinha, que me olharam tão assombradas que eu poderia ser confundida com um fantasma.

Wednesday me olhou dos pés a cabeça, porque ela viu o estado que havia me deixado a meia hora atrás. Delirando pela febre, falando ao vento coisas vergonhosas da minha própria sogra, se recordava em específico daquela parte.

— Mas o quê? — As palavras de Cheryl sumiram no meio do caminho.

— Me dá o celular — E ela fez, completamente aterrorizada, mas fez — Susan, é a Enid.

— Doutora Langford, quanto tempo — Sabia que seu tom carregava algo a mais, uma curiosidade tamanha que poderia ser confundida com bronca — Você gostaria de me explicar um pedido de guarda provisória com o título em alta diagramação com denominação de urgência enviada pela seu sogro, sem contar a denúncia que chegou nesse exato segundo no meu e-mail com o mesmo nome da garota na qual pediu a guarda?

— Quer a explicação rápida ou a demorada onde eu e a senhora vamos passar horas conversando?

Cheryl estava surpresa com o tom na qual foi utilizado, ela custaria a entender que eu e a juíza tínhamos o mesmo cargo de importância na sociedade, e não tínhamos medo uma da outra, apenas respeito. E o respeito entre nós era direto, isso incluia nossa forma de falar.

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