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BRIANNA ABERNATHY  dêem ⭐

BOAS VINDAS

Ergui a mão, tentando esconder os olhos do brilho quente dos faróis dos
carros. Tentava enxergar melhor, encontrar o filho da mãe que me jogou ali,
mas já não o via mais.
Comecei a apalpar o chão para me colocar de pé e tive a visão um
pouco mais clara do ambiente. Fui lançada no meio de um extenso círculo
concretado, um dos muitos que enfeitavam a entrada quilométrica da
universidade.
Me vi encurralada. Presa ao cenário ideal para que alguém vivesse uma
aflição desumana.
Meu corpo impulsionou para trás quando um dos automóveis acelerou.
Abri os olhos em cima da clareza dos faróis, e pelas falhas dos dedos que
insistiam em me proteger o rosto por instinto, estavam os olhos dele, de novo.
Como se me desse um aviso:

Aquilo era só o começo.
As rodas começaram a girar e ele veio na minha direção, criando
velocidade, ganhando impulso.
— Para! — gritou minha alma, com certeza.
Uma aflição sem tamanho fluía pelo meu peito e, quando achei que ele
me esmagaria entre os pneus, o som do freio brutal me fez puxar o ar, como
um morto voltando à vida.
O carro fez uma curva, desenhando um rastro escuro no chão e na
minha mente. Os demais começaram a segui-lo, derrapando em um círculo ao
meu redor.
Me coloquei de pé, tremendo como nunca na vida, com a sensação de
que minhas pernas cederiam e que desmaiaria a qualquer segundo. Minhas
pupilas acompanhavam os movimentos. Eram como predadores carnívoros e
eu, o peixe fora d'água. Aumentaram a velocidade, o surgimento de
telespectadores me fez sentir uma fadiga desoladora.
Era um tormento assistido, no qual ninguém interviria.
À medida que o barulho começava a ficar mais intenso, minha pressão
arterial caía em resposta à minha acusticofobia. Um nó se formava em minha
garganta, dificultando a respiração toda vez que o metal dos carros rangiam
ao se moverem em círculo ao meu redor.
O barulho ensurdecedor parecia me dar a possibilidade de tocá-lo, de
tão intenso. Meu abdômen colou nas costas. Não respirava. Tontura iminente.
Indício de falência dos músculos. Mãos nos ouvidos.
Comecei a apertar minhas orelhas de forma cruel, sentindo as lágrimas
escorrerem contra a minha vontade. precisava sair dali, mas a sensação de
impotência me envolvia como uma sombra, obscurecendo qualquer
pensamento claro que eu pudesse ter.
Senti minhas veias se encherem com mais força, quando o Alien do
inferno começou a abaixar o vidro do carro preto que ele pilotava. Em pouco
tempo, acomodou-se com parte do corpo para fora em uma das janelas aberta
e outra pessoa tomou a direção do veículo.
Os estudantes que assistiam vibraram quando ele tirou uma coisa
grande para fora. Era uma pistola, e comecei a entrar em desespero quando vi
que fogo vivo saía dela.
Fogo vivo.
Cru.
Vermelho como o inferno. Eu podia sentir queimar.

Meus olhos se encontraram com os dele e, naquele momento, o mundo
ao nosso redor parecia em câmera lenta. Seu semblante irradiava uma fúria
incontida e inebriante que me dilaceraria se chegasse perto o suficiente.
Aquilo estava mais que claro.
O desgraçado jogou os cabelos escuros para trás e tirou a camisa,
evidenciando o peitoral tatuado e as repartições no abdômen. A demonstração
de poder continuou quando ele soltou outra rajada flamejante direto da arma
para o céu.
Comecei a lacrimejar. Pernas apertadas para segurar a bexiga.
— Olé! — alguém gritou, e meus olhos arregalaram quando um vento
quente soprou em minhas costas. Subindo pelos cabelos, obrigando minha
nuca a arrepiar.
Labaredas subiram por cima de mim e morreram no ar vazio diante dos
meus olhos.
Comecei a ficar tonta, enjoada e sem cor. O rugido dos motores
pareciam ser trovões constantes, ecoando em meus ouvidos e reverberando
em minhas entranhas.
A cada volta que davam, com os pneus frouxos em um círculo torto, a
força do vento me golpeava, fazendo meu cabelo voar descontroladamente ao
redor do rosto.
Cada vez que se moviam, o ar era cortado pelo som agudo dos freios e
a vibração do solo sob meus pés me fazia bambear. Meus músculos estavam
tensos, preparados para qualquer movimento repentino que precisasse fazer
para escapar de seus dedos; pular de volta na água, me salvar.
Mas não sei se seria possível, porque as buzinas, os gritos e risos dos
que assistiam à cena, fogo queimando e sumindo pelo ar, os freios bruscos
que faziam os pneus chiarem em cima de mim… tudo isso contribuía para
que eu enlouquecesse ali no meio e entrasse em pânico.
Apertei os olhos com força e me abaixei. Mantive o corpo encolhido no
chão, gritando contra aquele caos. Gritando de raiva, medo e desespero. Era a
única solução ao meu alcance e faria aquilo até que alguém me ouvisse. Até
que me deixassem em paz.
Começaram a diminuir o ritmo. As vozes ficaram mais altas do que o
som dos motores. Ergui os olhos inchados, tentando escapar dos flashes de
luz das câmeras que registravam a tormenta.
Me levantei, sentindo que meus pés não tinham fixação. Manobrei,
completamente tonta, com a única missão na cabeça: sumir dali. Mas já deveria imaginar que o extraterrestre saltaria do carro e me seguraria com as
garras imundas.
— Eu só vou perguntar uma vez, ratinha. — Sua voz era grossa e os
dedos puxavam a raiz do meu cabelo, me forçando a olhar em seus olhos. —
Onde está o infeliz que chama de pai?
— No inferno — respondi com os dentes cerrados. — Esperando por
você.
Meus olhos desceram inconscientemente até o sorriso que ele abria
devagar. Tive vontade de arrancar um pedaço da boca com os dentes, só para
mostrar que não havia graça alguma, mas ele não me deu tempo para a
realização do meu maior desejo momentâneo. Começou a me empurrar por
uma escada escura, antes mesmo que eu pudesse piscar.

AO CAIR DA NOITE Onde histórias criam vida. Descubra agora