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BRIANNA ABERNATHY  dêem ⭐

Boas vindas II

Os universitários sem noção nos seguiam de perto como se estivessem
indo para uma festa, com bebidas na mão e lasers elétricos.
Reconheci o ambiente no momento que vi as pilastras. Era um
estacionamento subterrâneo.
O ar úmido e pesado do subsolo parecia prenunciar o que estava por
vir. O lugar escuro e vazio começou a encher e se tornar aceso. O som
distante de gotas de água pingando, que ecoava pelas paredes, sumiu e outro
começou a aumentar no fundo de um dos carros.
— Você prefere o jeito difícil… também acho mais gostoso —
sussurrou no meu ouvido.
Vi quando arrastaram uma cadeira velha e a jogaram no meio do lugar,
as mãos fortes dele me levaram até lá, mesmo que lutasse para não ir.
— Soube que ela é caloura de medicina. — Um cara estranho de cabelos azuis se aproximou, cantarolando, e percebi que podia ver dois dele
na minha frente. — Bom, estou com meus materiais…
— O quê? — Franzi o cenho. Estava longe de ver bem, mas ouvir eu
ainda conseguia, ou achava que conseguia, porque duvidei do que ouvi.
— Testes com a ratinha… que tal, Alien? — completou, olhando para
mim.
— Me solta! — Tentei me debater. Esforço em vão. A aspereza da
corda grossa arranhou meus punhos estendidos para trás e o cheiro de poeira
me sobreveio às narinas, quando amarraram uma gaze velha na minha boca.
A mochila do cara foi aberta e alguns equipamentos reluziram aos meu
olhos, mas o Alien do inferno agarrou uma seringa.
Balancei a cabeça, negando. Ele não precisava fazer covardia para
conseguir alguma coisa, mas quem disse que minhas súplicas seriam levadas
em consideração?
— Cadê o nerd da biologia? — Ergueu a voz e um garoto apareceu. —
Trouxe seu baixinho, nerd?
O garoto balançou a cabeça em afirmação e se virou. Enquanto isso,
uma ruiva e dois outros caras se aproximaram de nós.
— Se divertindo, Alien? — o de pele marrom-clara e sorriso fino
perguntou.
— Você acha que não, Brandon? — a ruiva respondeu, pendurada no
pescoço de um loiro. — É disso que ele gosta. De estar no controle.
— E de obter informações — o tal Brandon destacou.
Quando menos esperei, o nerd voltou com uma gaiola enorme que
deixava escapar as pontas das asas de algum animal pelas partes pergoladas.
— Eu até deixaria ele se alimentar por conta própria, mas acho que o
morcego do Kaio ainda toma mamadeira, então… — Ergueu a seringa e o
maluco de cabelo azul, como um palhaço, sorriu. — Enfermeiro do segundo
semestre, que tal fazer as honras?
Pressionei as costas contra a cadeira quando, seguindo as ordens dele, o
cara segurou o meu braço e enfiou a seringa na minha veia. Dor dilacerante.
A agulha rompia minha pele seca, me fazendo sentir cada camada ceder.
Olhei para baixo. Uma fita vermelha alimentada pelo sangue fresco que
escorria do braço era sugada pelo piso cinza do lugar.
— Aí, infeliz. — O Alien bateu no ombro dele. — Melhor consertar
isso. — Referiu-se à pequena poça que se formava nos meus pés.
Senti uma fita adesiva grudar na minha pele sensível. Meus olhos lacrimejaram diante da quentura do sangue acumulado na bolsinha de ar entre
a cola do plástico e minha pele.
— Sangue direto da veia! — Alien exclamou e empurrou o êmbolo,
fazendo o líquido vermelho esguichar para cima.
A ave batia as asas tão forte que o garoto não conseguia segurar a
gaiola nas mãos.
— É tão bom assim? — O de cabelos azuis abriu a boca, arrancando
risadas das pessoas. Fechei os olhos. Que porra era aquilo? — Hum…
Docinho… — completou. — Que delícia!
— Tem sorte que ela é limpa — o meu pesadelo mencionou enquanto
se aproximava. Seu dedo indicador me forçou a erguer o rosto para ele. — Li
a ficha completa, nem mesmo anemia essa ratinha tem. — Tirou o pano da
minha boca.
— Me deixa ir, por favor… — pedi, minha voz embargando.
— Onde ele está? — insistiu. — Espero que não diga "inferno".
Mesmo sem forças, me esforcei para responder.
— Eu não sei…
— Ah… você sabe, sim. — Ergueu a mão e pegou outra seringa vazia.
— Aí, aspirante a médico, ouvi dizer que tiram sangue da veia no pescoço
também, é verídico?
Meus olhos abriram com força assim que assimilei o que ele tinha dito.
— Não faz isso, por fa… — O pano estava lá de novo, me impedindo
de falar. Ele colou os lábios no meu ouvido.
— Shhh… — Senti lágrimas voltarem a banhar meu rosto. — Se não
for verdade, teremos o primeiro teste agora. — Seus dedos deslizaram pela
pele do meu pescoço.
Arrepios.
Arrepios para um caralho.
O toque dele era diferente. Tinha intenção, ia além do “só fazer”.
Ele fazia meu sangue bombear como se não houvesse amanhã com um
único toque. Seu polegar pressionou uma das minhas veias e o ouvi suspirar.
— Elas estão aparecendo para mim sem que eu peça… que adorável.
— Riu. — Vamos lá, se abrir a boca agora… — sussurrou. — Juro que te
poupo o sofrimento.
Balancei a cabeça, sentindo a fraqueza me alcançar quando a agulha
ameaçou romper minha pele.
Fechei os olhos.

Ele iria me matar. Perfurar a minha jugular. Eu iria gotejar pelo
pescoço como um boi no matadouro.
No entanto, tão rápido quanto se aproximou, afastou-se. Meu suspiro de
alívio pareceu sair da alma. Suas mãos se entenderam, ele pegou a seringa
cheia e deu um sinal na direção de alguém.
— A vadia das bijuterias. Aqui!
Uma pessoa, da qual eu não conseguia enxergar sequer a cor dos
cabelos, se aproximou e ela entregou alguma coisa ao desgraçado.
No dente, ele abriu o que parecia ser um pingente em forma de tubinho
e derramou meu sangue lá dentro. O pequeno tubo foi fechado e ele o
pendurou em uma corrente no pescoço, antes de me mostrar de perto.
— Quer dizer que pertence a mim agora — sussurrou a centímetros dos
meus lábios. — E espero que saiba o que isso significa. — Minhas mãos
foram soltas em um só golpe. Ele ainda mantinha os olhos nos meus olhos.
— Corra.
Percebendo que estava livre, me levantei como uma maluca para dar o
fora dali, cambaleando, tonta e sem ar. Passar pela multidão de universitários
que dançavam foi um verdadeiro sufoco, mas consegui. Estava mais perto do
que nunca de um refúgio.
Só não esperava que esse refúgio fosse coberto de sombras que
pareciam dançar acima da penumbra, e que levaria a minha consciência
devagar, como um orvalho.
E ali, no meio da corrida, antes mesmo de conseguir alcançar as luzes
fracas do campus, desmaiei.

AO CAIR DA NOITE Onde histórias criam vida. Descubra agora