Dulce Maria Saviñon
SEXTA-FEIRA, DIA DO JANTAR BENEFICENTE
Uma neblina espessa envolvia a cobertura que ficava no topo de um arranha-céus de quase trinta andares.
Quando Alexander disse que eu teria que comparecer a um evento beneficente, eu imaginei que fosse acontecer no museu de arte ou em algum hotel badalado, não na cobertura de algum figurão de Manhattan.
Misturado ao seleto grupo de pessoas de sangue azul, havia artistas, modelos, influenciadores e uma variedade de pessoas famosas o suficiente para postar alguma coisa que desse notoriedade para aquele tipo de evento.
Eu odiava chegar sozinha a qualquer lugar que fosse, mas já fazia algum tempo que tinha parado de chantagear Annie ou minhas outras amigas para irem comigo a compromissos como aquele.
Minha missão ali era ser vista, socializar um pouco e, se Deus ajudasse, ficar até o discurso do anfitrião da festa.
Mesmo não querendo chamar a atenção, fui parada uma dúzia de vezes até conseguir chegar ao bar.
— Um Dry Martini com duas azeitonas — pedi ao atendente.
Enquanto esperava pela minha bebida, troquei algumas mensagens com Alexander.
Se não fosse esse evento idiota, eu poderia estar em casa bebendo uma generosa taça de vinho e vendo porcaria na TV.
Enviei e a resposta chegou em segundos.
Querendo beber vinho sozinha em plena sexta-feira
Você se transformou em uma solteirona rabugenta.
Caí na risada.
Eu tive um bom professor.
Estava prestes a guardar o celular quando as portas do elevador, que ficava bem ao lado do bar, se abriram e meus olhos o viram pessoalmente pela primeira vez depois de muitos anos; era como se eu estivesse diante de um fantasma.
Christopher Uckermann estava lindo como sempre em um smoking completo e foi como se o tempo tivesse congelado, a música cessado e as vozes desaparecido.
Sabia que ele sempre tinha sido ambicioso e que suas decisões inteligentes e ousadas o tornaram dono de um império muito rapidamente, no entanto, achava que essas eram as únicas características que ainda existiam dentro da personalidade do Christopher que eu conhecia, pois a poucos metros de mim estava um homem que poderia facilmente ser confundido com alguém que fora nascido e criado no círculo que eu frequentava.
Após passar por mim sem esboçar nenhum sinal de reconhecimento, ele se juntou a um grupo formado por empresários de diversas vertentes.
De onde estava, analisei friamente sua figura, que exibia a mesma virilidade e confiança que eu já tinha visto no passado, mas atualmente esses traços vinham acompanhados do sucesso financeiro que tantos sonhavam e poucos conseguiam alcançar.
O olhar implacável continuava o mesmo enquanto escutava friamente a conversa dos bajuladores, como se soubesse exatamente o que cada um da roda desejava conseguir dele.
Fiquei paralisada, sem reação, pois embora ele circulasse pelo mesmo círculo social que eu, nós nunca tínhamos nos encontrado.
Esse não é o seu círculo, mas do Alexander, uma voz alertou.
Nos primeiros anos, eu tomei cuidado para que isso não acontecesse e sempre pedia para que Sanders me alertasse sobre a lista de convidados de todos os eventos aos quais eu comparecia, mas depois de um tempo eu entendi que isso era besteira e resolvi viver sem ter medo de dar de cara com o passado.
Um descuido imperdoável da minha parte, porque aquilo tinha acabado de acontecer e eu não sabia como reagir.
— Sua bebida, senhorita — o garçom avisou.
Virei-me de frente para o bar e tomei a dose de uma só vez, como se a bebida tivesse algum poder mágico de me fazer desaparecer daquele lugar.
Enquanto eu pensava em uma forma de ir embora sem ser notada por ele, solicitei outra dose ao garçom.
Quando o drink ficou pronto, peguei a taça e perguntei onde ficava o banheiro. O garçom me mostrou a direção e eu caminhei entre as pessoas, sem focar o olhar em ninguém, tentando passar despercebida.
No fim do corredor eu entrei no banheiro, fechei a porta e liguei para Annie.
— O evento está tão tedioso assim? — respondeu com voz de sono.
— Ele está aqui — falei baixo como se estivesse com medo de escutar minhas próprias palavras.
— Ele quem?
— O falecido — declarei.
— Porra, Dulce, que merda — esbravejou. — Ele te viu?
— Não, assim que ele passou por mim eu vim para o banheiro.
Estaria mentindo se dissesse que nunca imaginei que um dia fôssemos nos encontrar, mas nunca tinha ensaiado nada para falar, porque depois de alguns anos eu simplesmente parei de culpá-lo por algo que não era para ser.
— Dulce, não acho que você deveria se esconder, muito menos ir embora por causa dele. Os anos a transformaram em uma mulher confiante e determinada, não deixe que a presença desse babaca mude as regras do jogo. Não pense nele como um magnata, para você, ele sempre vai ser o idiota que quebrou seu coração em milhões de pedaços e merece todo o seu desprezo — ela declarou e acabei rindo.
— Não sei o que seria de mim sem os seus conselhos — admiti.
— Se depender de mim, nunca vai saber. Agora volte para a festa e mostre o que ele perdeu.
Finalizei a ligação sorrindo e voltei para o salão.
[...]
Christopher Uckermann
Cinco minutos no tal evento beneficente e eu já estava entediado, louco para ir embora. Às vezes eu me questionava por que ainda me dava ao trabalho de ir àquele tipo de festa, cheia de gente medíocre e bajuladora. Meu único consolo era saber que quando chegasse ao meu hotel, iria foder Natália até a exaustão.
Enquanto ela se afastava para atender a uma ligação, eu me aproximei do bar e pedi uma dose de uísque.
Assim que o recebi, levei o copo aos lábios e sorvi um gole da bebida preguiçosamente, olhando tudo e nada o mesmo tempo, afinal, aquele evento era a penas mais um entre tantos. Foi então que meus olhos capturaram um corpo esguio, levemente curvilíneo em uma roda de pessoas, cujo som da risada me chamou a atenção.
Subi o olhar desde o par de saltos agulha com solado vermelho e fui mapeando todas aquelas curvas até chegar ao cabelo, que estava preso em um coque elegante. No instante em que a bela mulher se virou de frente para cumprimentar um senhor que se aproximou da roda, eu finalmente tive um vislumbre de seu rosto completo.
A pele de porcelana evidenciava os olhos castanhos e os lábios escarlate.
Trinquei o maxilar ao perceber que a poucos metros de mim estava a única mulher que eu amei nessa vida e que nunca mereceu um pingo desse amor.
Mesmo com raiva, fiquei admirando cada detalhe, feito um sádico matando a saudade de algo que só lhe fez mal. Todavia, por mais desprezo que eu sentisse, não poderia negar que Dulce Maria Saviñon era uma beldade. Tinha uma beleza tão rara e delicada que era possível captar o olhar de inveja das outras mulheres, que não conseguiam chamar a mesma atenção que ela.
— Senhor Uckermann, desculpe a demora, podemos ir até o meu escritório agora se quiser — o anfitrião da festa disse ao se aproximar.
Avaliei todas as possibilidades, incluindo a de ir falar com ela, e concluí que evitar que ela me visse ali seria a melhor maneira de manter as coisas como estavam.
Dulce Maria tinha sido o primeiro amor de um Christopher que não existia mais, então era melhor me trancar em um escritório com um velho fedendo a charuto, do que ficar ali apreciando a beleza de uma mulher que nunca mais faria parte da minha vida.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Dinastia
RomanceDulce Maria Saviñon e Christopher Uckermann se conheceram na universidade, um encontro improvável entre mundos opostos. Ela, herdeira de uma das dinastias mais influentes e poderosas do planeta, sempre viveu cercada de poder e luxo. Ele, um jovem ne...