Capítulo 10

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      O salário do pecado era a morte. Vincent nunca esteve tão perto de achar que iria morrer, e que a qualquer momento, a Morte chamaria por vosso nome e o levaria para o abismo das almas perdidas.

O calor era agoniante. Ah, calor miserável! Queimava impiedosamente cada centímetro de sua pele, e fazia a cabeça de Vincent, latejar. O que ele não daria para descansar à sombra de um oásis...

Enfrentar o deserto era quase uma peleja infernal. Até o sopro do vento, que deveria ser um alívio, era seco e quente. Enxergava infinitas dunas em tom carmesim. No presente momento, encontrava-se no deserto escaldante, próximo à cidade de Jerusalém.

Estar ali faziam-no sentir falta dos meses em que passara em alto-mar.

Foram nove meses em alto-mar, sobrevivendo no Rainha do Oceano, caravela que atravessara a imensidão azulada e áquea e trouxera Harrington e Vincent para terras estranhas.

Andar por aquele imenso deserto, para Vincent, era como uma forma de pagar pelo seu delito. Havia matado alguém. Um garoto da mesma idade que a sua. Um não! Quatro garotos!

Levou os olhos até o sol que lhe punia com a sua luz cegante. Ao seu redor apenas dunas e mais dunas de areia quente. Não havia rastro de civilização, construções, nada! Somente areia. Os riscos de suor desciam pelo rosto e nuca. Ao menos estava suando e suar era bom, pois evitava que o corpo desidratasse ou que a temperatura do corpo aumentasse drasticamente e entrasse em colapso.

Piedade, Deus, não deixe-me perecer! Suplicava em delírios.

O mundo inteiro parecia resumir-se ao deserto. Uma grande, quente e infinita caixa de areia.

O calor abrasava as bochechas de Vincent, e o jovem sentia um estranho cheiro de carne queimada. Puxou o lenço que jazia no pescoço, para proteger os lábios rachados pelo calor extremo.

Água. Desejava saciar-se com água. Sentia que a qualquer momento sua garganta iria sangrar.

— Conheço este caminho com a palma de minha mão. — o vecchio dissera confiante. — Não preciso de mapas ou bússolas.

Harrington estava montado em um camelo ao seu lado, e pouco parecia incomodado. Um lenço enrolava por completo o rosto e o alto da cabeça, deixando apenas seus olhos de raposa à amostra.

Jerusalém estava tão distante. A areia parecia ter engolido o mundo. O camelo sacolejava para frente e para trás, em um ritmo nauseante.

— Vejo um amontoado de pedras, Vincent, e uma tenda colorida. — Harrington anunciara galante. — Estamos chegando.

Vincent semicerrou os olhos e contemplou, emergindo das areias, muros pardacentos, ciprestes e casas construídas com pedras e o domo dourado da mesquita, que chamava-se Cúpula da Rocha.

Estou em Florença, pensou delirante.

O garoto de olhos rubros queria somente saciar-se em uma fonte de águas cristalinas, que refrescasse a sua alma.

(...) 

      O árabe fumava essência de pêssego em seu narguilé, no conforto de sua tenda com bandejas com tâmaras e uvas, sem contar nos criados à sua disposição. Ao vislumbrar Timóteo Harrington surgindo do horizonte avermelhado, montado em um camelo, muito alegrou-se. Ghalib recebera o vecchio de braços abertos. Deixara o narguilé, largando sua mangueira, soltando fumaça pelas narinas e confraternizou-se com o velho amigo.

— Timóteo! Há quanto tempo, meu amigo — abraçava o italiano, dando tapas abafados em suas costas. — Estais mais velho!

— O mesmo digo de ti, Ghalib, pareces um ancião agora. Como tem passado o tempo? Apenas fumando em seu narguilé, olhando para este mar de areia?

BRAVURAOnde histórias criam vida. Descubra agora