Ventos improváveis

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Capítulo 2

6:50 A.M.

Tratei de dar um tapa assim que ouvi as primeiras notas que o despertador tocou pela manhã. Graças a minha rotina, o despertador é só por precaução, pois tenho um sono incrivelmente leve quando chega a hora que costumo levantar.

Fiquei mais alguns minutinhos na cama, olhando para o teto. Os raios de sol tocavam no meu rosto e eu sentia o calor emanado vindo da janela.

Sentei na minha cama, olhando para o chão procurando meus chinelos. Sempre é difícil enxergá-los pela manhã. Fiz um café e voltei a sentar na minha cama para tomá-lo. Não sei o porquê, mas não gosto de comer na cozinha quando acordo ou em outra peça da casa, tem que ser sentada na minha cama. Acho que é uma espécie de conforto já que não poderei ficar deitada nela.

Gosto do silêncio matinal. É como se fosse sagrado de mais para ficar conversando ou ligar um rádio ou uma TV, já que passamos o dia inteiro em meio ao barulho urbano, acho justo manter o som somente dos pássaros que cantam na rua. Aliás, acho que é o único momento do dia em que consigo ouvi-los.

Fico sempre muito nervosa nos dias em que faço alguma performance em público. Minhas refeições se resumem em um café pela manhã e um pequeno sanduíche no almoço. Minha ansiedade é tanta que passo o dia ensaiando para o repertório previsto do conserto.

Esse foi um dia desses. As músicas não eram exatamente difíceis, mas mesmo assim não sou tão orgulhosa para pensar que não preciso praticar.

7:54 P.M.

Faltavam exatamente 6 minutos para começar a apresentação e nada do clarinetista chegar. Eu estava em uma pilha de nervos, pois todo mundo sabia que se ele não viesse, eu teria de fazer solo dele.

Sentia o suor descendo do meu cabelo preso para o meu rosto e eu já sabia que não tinha jeito, teria de encarar aquela multidão e tocar a partitura do meu colega.

O maestro levantou a mão. Fez sinal e a música começou. Minhas mãos tremiam no arco, e minha mão esquerda estava escorregando no pequeno braço do violino por conta do suor exagerado de nervos.

Quando comecei o solo, desafinei em uma nota muito alta extremamente difícil e olhei para o maestro que, em consequência, me olhou com desprezo. Quando olhei atrás dele percebi Thomas na platéia. Nossos olhos se cruzaram nesse fragmento de segundo entre o olhar a partitura e o maestro. E de repente seus olhos estavam vívidos, me apoiando.

Senti meu corpo vibrar com toda aquela força que ele parecia estar me mandando.

Então fechei os olhos e comecei a ouvir as vibrações do meu violino. Esqueci a partitura e segui meus extintos de improviso. Eu conhecia bem a música então mentalmente consegui planejar algumas notas por minha conta.

Quando o maestro fechou a mão, fitei o chão com vergonha do ocorrido, mas de repente alguém me cutucou no meu ombro e fez sinal para eu me levantar. Quando olhei a multidão, estavam todos em pé aplaudindo.

Foi a sensação mais incrível que já tive em toda a minha vida. E quando sorri finalmente, Thomas estava lá, sorrindo e aplaudindo junto a multidão.

Desde aquele momento, percebi que ele já não era mais qualquer um.

É como nunca precisar de um carro por exemplo. Você passa por eles todo dia, e nunca repara nenhum deles. Mas um dia você precisa de um e começa a reparar todos que passam por você: a cor, a marca, o tamanho e etc.

Thomas estava se tornando isso para mim. Ele começou a despertar em mim esse tipo de curiosidade.

Outono em mim, capítulo 2

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