Acordou cedo naquela sexta feira, precisava urgente de um mergulho. O sol não dava mostras de que iria aparecer e a manhã se anunciava mais fria do que o costume. Mas frio não assustava Valentina quando queria mergulhar. Já não chovia mais, olhou para Roberto de dormia profundamente, estava acostumado a acordar depois de Valentina já ter saído. Não sentia culpa alguma em olhar para o marido, havia gostado tanto de beijar Antônia que não tinha espaço para sentir culpa. A vida íntima com o marido era normal, dentro daquilo que Valentina considerava normal, mas nunca, nem na adolescência, nem quando voltou para Cântico, nem depois de casada trocou um beijo com o marido com tanta intensidade. Ela se quer se lembrava de ter beijado com tanta vontade, nem mesmo Denise que considerava, até então, a pessoa que mais havia desejado por toda a vida. Antônia mexia com ela de forma diferente, era uma forma nova de se sentir atraída por alguém, talvez por ser mais jovem, Valentina não sabia explicar, só conseguia de fato aproveitar as sensações que aquilo causava.
No banheiro se olhou no espelho novamente, ergueu o pescoço procurando alguma marca, mas não havia nada. Na noite anterior quando chegou em casa, fez o mesmo. Correu pela sala, ganhando o corredor até chegar no banheiro do quarto, tudo isso com Roberto atrás perguntando se estava tudo bem, só respondeu que sim que precisava de um banho e praticamente bateu a porta do banheiro em sua cara.
Pegou as roupas que usaria para trabalhar, poderia sair do rio, tomar um banho e se trocar na própria fábrica, não precisava voltar para casa.
Cada segundo entre o caminho que fez com o carro para chegar até o píer, ganhar a trilha e colocar os pés na areia, o fez pensando em Antônia, no beijo, em tudo o que haviam vivido até ali. Entrou no rio gelado, a correnteza estava bem mais forte do que o normal, graças a chuva, bem como o volume de água era maior, mas Valentina não tinha medo, já havia mergulhado inúmeras vezes em correnteza até mais brava. Seu ponto de marcação para a volta estava parcialmente coberto, apenas parte da árvores era vista na pequena ilhota. Enquanto mergulhava e lutava contra a correnteza para atravessar os cerca de trezentos metros que a separava até sua marcação, sem contar a volta, se fazia milhões de perguntas. Estava absurdamente ansiosa, queria tanto ver Antônia, será que ela também estava pensando no que havia acontecido? Será que Antônia também sentia alguma coisa? Ela correspondeu ao beijo e ainda lhe puxou para mais um, a boca quente, o modo que a língua dançava sobre a sua, quando beijou seu pescoço puxando seus cabelos, tudo em Antônia a enlouquecia, conseguia ver isso com clareza agora. O tanto que já estava atraída pela garota muito antes do beijo, muito antes do dia em que discutiram na beira do rio e a viu quase nua em sua frente. Estava perdida
em vontades por Antônia provavelmente desde o dia em que se conheceram. Não era difícil, Antônia era linda, graciosa, meiga, charmosa. Não tinha como resistir, era muito difícil. Agora imaginava como seria quando se vissem, será que deveria chama-la para almoçar? Será que deveria mandar alguma mensagem? Queria fazer tudo aquilo, queria ter atitudes que teria se a situação fosse normal. E o que Valentina considerava normal, era ser uma mulher solteira da faixa de idade de Antônia, onde tranquilamente poderia se abrir sobre seus sentimentos. Mas naquilo que realmente eram como poderia agir feito uma moça solteira, fazendo declarações, convidando Antônia para almoçar, dizer a ela que queria mais? Ignorando toda a situação na qual estavam inseridas? Não tinha como fazer isso, não era justo nem com a própria Antônia. Teve que se esforçar um pouco mais contra a correnteza forte para conseguir dar a volta e retornar a areia. Esforço que teria que fazer para lidar com a loucura que se enfiou e da qual não queria sair.
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O taxi estava entrando na propriedade de sua família, ainda era cedo, mas já imaginava que por ali encontraria apenas sua mãe. Das vezes que ficava em Cântico nada nunca mudava, Valentina saía sempre bem cedo, Roberto em seguida, João Pedro na escola e sua mãe em casa, agora acompanhada de uma enfermeira. Até mesmo o controle para o portão que guardava, ainda era o mesmo. Abriu o portão para o taxi entrar e pediu que ele se dirigisse a casa de sua mãe, entre as duas que havia na propriedade. Desembarcou há cerca de duas horas atrás em Maringá. Chegava da Grécia, onde esteve nas duas últimas semanas, estava cansada e também ansiosa. De Athenas pegou um voo para Paris, de Paris para o Rio de Janeiro e do Rio de Janeiro enfim para Maringá, porém com escala em Curitiba. Estava há mais de vinte horas viajando.
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Destino Insólito (Romance Lésbico)
RomansValentina é uma mulher de 44 anos que administra uma produção de café na pequena cidade de Cântico no interior do Paraná. Leva uma vida tranquila ao lado do marido Roberto e do filho adolescente João Pedro. Mas para ter essa vida tranquila, abriu mã...