Dizem que quando você desmaia após um acidente, significa que o seu corpo lhe achou insuficiente para aguentar aquela carga de dor.
Bem, eu concordo plenamente. Assim que acordei, me senti tão impotente que poderia até desmaiar de novo, e talvez eu tenha feito isso por breves segundos. Mas quando finalmente me dei conta onde eu estava novamente, percebi que eu estava encharcado de suor. Como uma câmera focando, a imagem ao meu redor se tornou nítida; a cama infantil, o papel de parede desbotado, a cômoda com adesivo dos Power Rangers, os bichinhos de pelúcia, e a porta aberta para o corredor. Meus braços e pernas estavam presos por uma corda grossa, e tinha mais um problema...
Dor.
Muita dor. Como se um prego quente estivesse sendo enfiado na base da minha coluna. Respirei fundo, tentando reunir toda a força que eu ainda tinha (que já não era muita), e olhei para baixo.
Na perna direita, minha calça estava tingida de uma cor mais escura, ao redor de onde a bala tinha a atravessado para chegar na minha coxa. Me senti tonto e fechei os olhos. A bala ainda estava ali, qualquer mínimo movimento me enviava uma onda de dor lascinante. Eu não tinha ideia de quanto tempo tinha ficado desacordado, bastava dizer muito tempo. O sangue já estava deixando minha calça rígida. A ideia de ter uma bala alojada na minha perna por muito tempo, me deixava ainda mais nauseado.
Lá fora, em alguma parte da casa, eu podia ouvir um som. Algo parecido com um martelo e um prego, fazendo som de metal com metal. O ruído me arrepiou os pelinhos dos braços. Esperava que não fosse minha nova câmara de tortura.
Tentei forçar as amarras dos pulsos, já que qualquer movimento das pernas me deixaria apagado por mais meia hora. As cordas estavam bem amarradas, muito bem por sinal. Meus pulsos estavam imóveis, só os dedos tinham leve liberdade, mas fora isso eu era um completo inútil. O suor deslizava pelo meu pescoço, a dor inimaginável atingia todos os nervos do meu corpo, me deixando com vontade de vomitar, sem sucesso, por não ter nada no estômago.
O tempo passava. As marteladas continuavam, e o meu pânico crescia. Eu só tinha algumas certezas até então, e o período que eu fiquei apagado daria para ter acontecido muitas coisas. As minhas certezas eram; eu estava na casa antiga do Jimin, agora eu entendia tudo que estava acontecendo e que, eu odiava o Carcereiro mais do que tudo.
Após uns instantes, o barulho parou. Seus passos pesados ecoaram pelos degraus de madeira. Ele devia saber que eu estava acordado, então fingir que estava dormindo não era uma opção. Luta física também não era, eu estava muito em desvantagem. Mas joguinhos psicológicos não precisavam de nenhuma dessas ferramentas. Meus pulsos estavam amarrados, uma bala estava alojada na minha perna e eu sentia uma dor nauseante a cada respiração... mas a boca estava livre. Assim que ouvi seus passos no patamar da escada, soltei uma risada nível cinematográfico.
-Até que enfim. -eu disse alto o suficiente para ele ouvir. -O que estava fazendo lá em baixo?-X- Jimin -X-
Estávamos a quilômetros de Seul. A estrada calma norteava meus maiores medos, entre eles; voltar para casa. Busan era minha casa, foi onde eu nasci e cresci, mas assim como foi o lugar dos sonhos, também foi o lugar dos meus pesadelos. Das noites sem dormir. Do medo. Das verdades escondidas debaixo do travesseiro. Da dor.
Pensar na cidade como casa me levava para a minha vida antes do acidente, quando minha família estava unida e eu via o meu padrinho apenas nos feriados. No meu tempo inocente e feliz. Mas então aconteceu o acidente. Eles acreditavam que eu esqueceria disso, mas eu nunca poderia esquecer o meu pai? Então, na semana de feriado em homenagem aos mortos, quando minha mãe saiu com o meu padrinho e me deixou na obrigação da minha avó, eu roubei uma fotografia do álbum do casamento deles e a guardei no cano de ferro da cabeceira da cama.
Por muito tempo eu olhei aquela foto todas as vezes antes de dormir. E se eu fechasse os olhos eu ainda podia vê-la: os dois atrás da mesa com um bolo branco de dois andares; meu pai de terno preto, bonito como sempre foi, os cabelos puxados para trás com gel; minha mãe, de vestido branco de noiva, com uma tiara de brilhantes sobre os cabelos escuros que caiam pelos ombros. Eu amava aquela foto, e felizmente eu consegui pega-lá naquele dia, porque pouco tempo depois ela faleceu, e me foi tirado tudo que me lembrasse ela.
Eu tinha perdido meus pais para aquele monstro, eu não podia perder mais ninguém. Olhei para a estrada com melancolia, respirei fundo e tentei não chorar mais uma vez.
-Ele vai ficar bem, Jiminie. -disse Chanyeol. -Vocês vão.
-Espero que sim.

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The Cure - Jikook
Fanfiction"Devíamos amar quem quiséssemos, não é? Pessoas são pessoas." Jimin vivia sob ordens de um pai rigoroso. Jungkook era seu meio irmão, livre para fazer suas escolhas e forçado a aceitar aquele segundo casamento da sua mãe.