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Okay.
Eu não sabia de nada daquilo. Eu não deveria me sentir culpado pelo que eu quase fiz, não é? Mas eu me sentia tão mal.
Eu iria fazer uma burrada imensa, e nem sabia das consequências que traria para a pessoa que eu mais amo no mundo. Quando estava disposto a fazer aquilo, tudo na minha mente era que eu estava tirando um peso dos ombros de muitas pessoas. Afinal, eu não era tão fácil de lidar assim. Jungkook se veria livre para procurar uma pessoa menos problemática, mas talvez tudo que ele precisasse fosse uma pessoa problemática a quem curar. Abraçado a ele, percebi naquele momento que tudo tinha acontecido para chegar àquele ponto. Onde estaríamos expostos um ao outro, totalmente sem armaduras. Ele sabia dos meus mais profundos defeitos e tudo que tinha acontecido para eu me tornar assim, e eu estava começando a aprender sobre a vida dele, e a me perguntar porque todo esse tempo eu nunca o questionei sobre isso.
O aperto mais entre os meus braços e respiro fundo, ainda com o rosto apoiado num dos seus ombros.
-Desculpe, yaegiya. -sussurro. -Eu deveria ser mais atencioso com você, ao invés de só chorar as minhas pitangas. Me desculpa.
O ouço rir baixinho e beijar o meu ombro.
-Tudo bem. Eu também não gosto de falar muito disso. Gosto de cuidar de você.
Me sinto extremamente impotente, como se ao ouvir isso dele, eu então me visse incapaz de cuidar dele tão bem quanto ele cuidava de mim. Estreito nosso abraço ainda mais, parece que podemos nos unir em um só.
-Hoje, eu tirei tudo de ruim que tinha guardado desde o hospital. -admiti. -Se quiser fazer o mesmo, eu estou aqui.
Ele ficou em silêncio, como se estivesse pensando na possibilidade, então afagou minhas costas e suspirou.
-Sabe, eu não senti muita vontade de chorar desde o hospital, mas eu estou tenso. -ele esclareceu. Realmente, ele se fingia de calmo o tempo todo, mas eu via seu olhar atento às coisas, e seus braços duros como pedra quando tentava me abraçar para dormir. -Acho que... eu estou com medo de ver ele de novo. Quase em pânico. -ele deu uma risadinha. -Ele me machucou bastante naquele dia, mas era apenas eu. Tenho medo do que ele pode fazer com você.
Enfiei os dedos nos seus cabelos e massageei a nuca. Ele suspira com o rosto encostado no meu ombro.
-Ele deu um tiro na minha perna. Eu apaguei na hora. -ele disse com naturalidade o suficiente para me assustar. Parei. Ele nunca tinha me contado como foi. -Primeiro, ele me deixou na mala do carro, por horas. Então chegamos na sua casa, e ele me fez subir as escadas me ameaçando com a arma. Lá em cima ele me contou a história da sua família, do Chanyeol, da vida frustrada dele. Então... ele apontou a arma no meu peito. -ele pausou.
  Me afastei um pouco e virei seu rosto para mim. Ele estava com os olhos marejados, e tentou virar o rosto para que eu não o visse chorando, mas eu trouxe-o de volta com firmeza. Jungkook me encarou, com os olhos molhados, os lábios apertados se curvando nos cantos instintivamente com a intensa vontade de chorar. Ele fungou e soltou o ar pela boca.
  -Pode chorar. -sussurrei, já que eu mesmo estava começando a querer chorar. -Pode parar de ser forte por mim.
  Então foi a vez dele desabar. Em um momento ele estava segurando, respirando pela boca para engolir o choro, no outro ele soltou os lábios comprimidos, que imediatamente soltaram um soluço. Jungkook abaixou o rosto e eu o abracei pelos ombros, assim, ele enfiou o rosto na minha camisa e chorou. Aos poucos eu sentia minha camisa ficar úmida, enquanto eu afagava os seus cabelos e tentava não chorar tanto quanto ele.
  -Eu fiquei com medo. -ele admitiu, a voz abafada pela camisa. -Eu só conseguia pensar em... -ele parou e soluçou. -Eu nunca mais ia ver nenhum de vocês. Nunca mais ia ouvir você rindo com os meninos. Nunca mais ia ver nada.
  Seus braços tremeram ao meu redor, assim como os ombros chacoalharam. Puxei seu rosto para cima, e ele me olhou encharcado de lágrimas. Os olhos inchados e vermelhinhos. O lábio inferior sugado para que não tremelicasse. Passei os dedos sob os seus olhos e tentei sorrir em meio às minhas lágrimas.
  -Eu achei... -ele continuou. -Quando ele atirou em mim, que era o fim. Então como último pedido, eu quis mentalmente te ver. E eu sonhei com você, sonhei que estávamos sentados em frente à escola debaixo da árvore. Achei que nunca mais ia te ver sorrir. Então eu te vi no hospital e... eu te vi, entende?
Balancei a cabeça, sem conseguir proferir uma palavra sequer. Sequei as minhas lágrimas e tentei um esboço de sorriso, mas eu não conseguia sorrir, porque eu o amava muito, e ouvir aquilo era como se estivessem lavando cerâmica com o meu coração.
  -Eu te amo. -consegui dizer com esforço. Ele riu. -Muito. Muito. Muito.
  -Eu também te amo muito. -disse passando as mãos no rosto. Então com ar decidido, respirou fundo e pousou às mãos nas minhas pernas. -Me deixe levantar, eu tenho que fazer uma coisa.
  Sai de cima dele. Ele, com cuidado, pôs a perna enfaixada no chão e pegou impulso com a outra. Levantou e passou a manga do moletom nos olhos. Assisti enquanto ele ia até a mala dele e a abria. Passou um minuto procurando entre suas roupas alguma coisa, e quando achou a enfiou no bolso do casaco. Esse intervalo serviu para me ajudar a secar as lágrimas, meu rosto devia estar vermelho e inchado como uma maçã.
  -Vem aqui. -Ele disse, parado no meio do quarto.
  Me levantei um tanto desengonçado procurando as pantufas e corri até ele. Ficamos de frente um para o outro, a dois metros das portas duplas de vidro. Imaginei que devíamos estar um charme; Amassados, de roupa de dormir, com os rostos inchados de choro e fungando.
  -Estamos passando por tantas coisas difíceis. Fica quase impossível de ter um momento, sem lágrimas e confissões. -ele esticou o braço e limpou um resquício de lágrima do meu rosto. -Eu não posso me ajoelhar. -disse rindo. Franzi a testa. Ele tirou do bolso um anel. Arregalei os olhos quando entendi a situação. -Park Jimin, você quer oficialmente namorar comigo e ser meu para sempre?
  Encarei a aliança sem reação por um momento. Então lembrei da primeira vez que ele "admitiu" seus sentimentos para mim, ao dizer que eu nunca deveria ser de ninguém além dele. No inicio achei estranho, agora eu entendia. Não. Eu queria ser dele para sempre.
  -Jimin? -ele chamou preocupado.
  -Claro que eu quero. -respondi meio bobo de amor. Minhas pernas bambeavam. Ele sorriu e pegou minha mão direita, encaixando-o no dedo anelar.
  Olhei o anel brilhando no meu dedo e sorri. Ele pegou minha outra mão e colocou na palma outra aliança. Enchi o peito e o ouvi rir.
  -Você prefere o seu sobrenome ou o meu?
  Ele ergueu uma sobrancelha.
  -Já está planejando o nosso casamento?
  -Até qual será a tinta que pintaremos o nosso quarto. -brinquei e ele sorriu.
  -Gosto de ouvir Jeon Jimin. -deu de ombros. -Park Jungkook também não é ruim.
  -Jeon Jungkook. -pausei, mas meus olhos ficaram fixos nos dele. Por um instante, esqueci que deveria falar, creio que ele também. Era só o seu nome, puro e límpido. Eu o saboreava em cada sílaba e o desejava a cada letra. Então minha mão abaixou. Ele franziu a testa. -Me desculpa por tudo de ruim que te fiz passar, mas se aconteceu foi por algum motivo... -olhei as alianças e ri. -Bendito seja o dia que imaginei se você estava com fome e levei a bandeja no seu quarto.
  Ele sorriu.
  -Estava ótimo.
  Dei de ombros e voltei a encara-lo.
  -Jungkook... -suspirei. -Quer casar comigo?
  Ele arregalou os olhos. Acho que nenhum de nós esperava essa proposta assim do nada. Até eu me surpreendi. Minhas bochechas coraram e eu senti minhas mãos tremendo.
  -Quero dizer... -tentei me corrigir, mas ele pôs um dedo na frente dos meus lábios pedindo silêncio.
  -Eu quero. -respondeu convicto, segurou meus ombros e nos aproximou mais. -Claro que eu quero. Somos jovens e irresponsáveis, não podemos casar ainda. Mas eu quero.
  Então, olhando seus olhos afogueados, entendi oque ele quis dizer. Claro, não agora, mas daqui a uns anos talvez. Não estava me dispensando, igualmente não estava dizendo sim. Estava transformando nosso namoro na forma mais pura de amor. Aquele sem limite, sem tempo, sem título, sem dias. Um amor igual a quando vamos para a piscina num dia de verão intenso e esquecemos a hora enquanto somos beijados pelo sol e pela água. Não queríamos mais nada além um ao outro e o futuro.
  Sorri diante sua posição.
  -Eu prometo. -ele disse. Peguei sua mão e coloquei a aliança. -Vamos casar um dia, e você irá ficar todo emocionado enquanto eu vou tentar fingir que não estou com uma vontade imensa de te beijar antes que digam que podemos.
  Eu ri.
  -Quando isso acontecer, se lembre que eu te amo, e isso é tudo.
  -É impossível de esquecer.
  Jungkook agarrou minha cintura e me puxou para perto, me arrebatando em um beijo de tirar o fôlego.

***
  Na manhã seguinte, acordamos bem cedo para ir fazer a visita ao hospital. Até a cidade eram duas horas, ou duas horas e meia. Yoongi Hyung e os seus namorados tinham se oferecido para nos guiar, os outros dois disseram que não era necessário uma comitiva para visitar um hospital. Eu achava que tinha sido o primeiro a me arrumar quando desci as escadas já com a mochila nas costas, mas quando parei na porta da casa, Yoongi Hyung estava parado do lado de fora, olhando o horizonte com um olhar vítreo e fora do ar. Tentei seguir seu olhar, mas tudo a nossa frente era o jardim, o carro estacionado na frente da casa, e os muros altos encobertos de cerca viva. Me aproximei devagar até estar ao seu lado e suspirei. Ele me olhou de soslaio e riu.

  -Pode ao menos me contar o motivo do nosso "passeio especial"? -perguntou enfiando as mãos nos bolsos.

  Então eu não tinha me enganado, ele realmente tinha ficado incomodado com a ida. 

  -Meu padrinho pediu que eu fosse lá.

  Ele arregalou os olhos.

  -E você vai?

  -Por que não?

  -Jimin, -ele me olhava incrédulo. -Ele tentou matar o seu namorado. E a você indiretamente. Acha que qualquer coisa que venha dele pode ser confiável?

  Encarei seu rosto preocupado. Yoongi Hyung era da minha altura, diferente dos outros, que eram todos mais altos que nós. Não conversávamos muito, eu conversava mais com o Taehyung e o Hobi Hyung, então não esperava uma cena de preocupação dele.

  -Claro que não, Hyung. Mas ele me pediu para procurar alguém, disse que era um presente. -suspirei. -Por mais que eu não queira, não posso evitar em me sentir curioso.

-Pode ignorar que ele esteja mantendo contato. -sugeriu dando de ombros. -Aquele hospital não guarda só pessoas com o cérebro arruinado. -ele disse, mas suas palavras tinham um fundo falso onde deveriam estar guardadas suas mágoas daquele lugar.

-Então oque ele guarda?

Yoongi suspirou e me olhou como quem diz: Quer mesmo saber? Continuei olhando-o para o incentivar a me contar. Ele tirou as mãos dos bolsos e se virou para mim.

-Pessoas com vidas arruinadas. O cérebro pode estar intacto, mas se o mundo não as aceitar, -ele sorriu -É para lá que elas vão. Algumas conseguem fugir, outras decidem que o mundo é muito ruim, e ficam.
Franzi a testa para ele, mas quando estava a ponto de falar que eu entendia oque estava me contando, Jungkook e Taehyung saíram de casa. Jungkook saltitou até o meu lado e beijou a minha bochecha. Taehyung correu com uma touca até Yoongi e a enfiou na sua cabeça cobrindo-o até os olhos.
-O que estavam falando? -perguntou Jungkook, apoiando o braço nos meus ombros.
-Em como a visita será intimidadora. -respondi.
Yoongi puxou a touca para cima, tirando o cabelo da frente dos seus olhos. Ele esticou o braço e o passou pela cintura de Taehyung.
  -É, vai ser... divertido. -disse com sarcasmo, mas os outros dois não pareceram notar.
  Por último, Hobi Hyung saiu da casa  com uma mochila enorme nas costas, aparentemente levando toda a bagagem dos três. Iríamos no carro de viagem, o qual usamos para chegar na casa e que cabia nós sete perfeitamente. Dessa vez, portanto, só levaria cinco de nós.
  -Prontos? -perguntou Hoseok. -Taehyung, pegou o celular?
  Tae arregalou os olhos e entrou em casa correndo. Yoongi riu e bateu as mãos nos bolsos para garantir que também não esquecia o seu. Enquanto isso, fomos entrando no carro. Yoongi iria dirigindo, não havia divisão de motorista e passageiros, era completamente livre o movimento, então ficamos no banco mais perto dele para não ficarmos tão separados. Hoseok ficou no banco do passageiro, e ao voltar, Taehyung sentou-se logo atrás de Yoongi, eu no meio e Jungkook do lado. Atrás de nós sobrava um banco vazio que cabia mais três pessoas.
  Já de portas fechadas e todos com sinto, Hoseok virou para nos olhar e sorriu.
  -Não ponham tanto pensamento negativo nessa visita. Talvez não seja nada.
  Yoongi deu partida no carro e riu em discordância.
  -O que não existe naquele hospital é "nada".
  Jungkook suspirou.
  -Então vamos lá, descobrir alguma coisa. -disse ele. -Quanto antes eu puder quebrar a cara daquele idiota, melhor.
  -Você não vai quebrar a cara de ninguém. -reclamou Yoongi quando o carro começou a andar. Ele fez a volta na fonte no meio do jardim e seguiu reto para os portões. -Vai ficar quietinho, sem confusão.
  -Se ele tiver lá, eu quebro ele. -disse Jungkook, como se mal houvesse o escutado.
  Passei uma mão na sua perna, pedindo em silêncio que se acalmasse e não ficasse tão ansioso por aquilo. Ele deve ter entendido, pois beijou os meus cabelos e sussurrou um pedido de desculpas. Assenti e deitei a cabeça no ombro dele. O "passeio especial" seria longo.

The Cure - JikookOnde histórias criam vida. Descubra agora