Voltamos para casa assim como saímos de lá, apertados no banco de trás do carro, muito mais por causa das pelúcias. Levemente curvado e um pouco desconfortável, mas com Jungkook fazendo carinho nas minhas pernas. Quando já chegávamos na minha rua, pedi ao Namjoon Hyung que parasse um pouco longe para que saíssemos sem barulho, ele parou duas casas antes e eu e o Jungkook saímos a passos silenciosos, com um saco contendo os prêmios dele. Não era muito tarde, e provavelmente meu pai estava em casa naquela hora, se ele tivesse nos procurado durante esse tempo... estávamos ferrados. Eu só podia pedir que ele estivesse profundamente adormecido na sua cadeira, ou na cama, com as portas trancadas. Acenamos para o carro quando ele se foi pela rua, e então fomos caminhando para casa. Jungkook pegou minha mão e fomos um pouco abaixados sob os portões baixos, até na frente da nossa casa. Abaixados na frente de um murinho de tijolo amarelo que era da casa vizinha, eu e ele nos inclinamos para analisarmos as janelas, todas escuras, menos a minha e a do quarto deles. Jungkook girou nos calcanhares para me olhar e sussurrou.
-Vamos entrar em casa pela porta da frente. -ele disse apontando para a casa. -Ou se você não quiser risco, podemos tentar te mandar pela varanda.
-Eu vou cair. -respondi irritado. -Não consigo fazer isso, já disse.
-Então vamos pela frente, ou podemos ir pela cozinha. -sussurrei voltando a olhar as janelas, não era opção subir por lá, havia o corredor externo ao lado da casa, o carro ficava de frente e encaixava perfeitamente da largura do corredor, mas só entrávamos caso fossem muitas compras de supermercado. Aquela era a forma mais segura de entrar. Tateei os bolsos a procura das chaves de casa e elas chacoalharam no meu bolso, segurei firme a sacola de bichinhos e voltei a minha atenção pra Jungkook. -Passamos pelo corredor, e lá trás nos tiramos os sapatos para não fazer barulho, então eu abro a porta e nós subimos.
Eu me ergui um pouco, mas ele me puxou de volta para baixo.
-Ainda é muito cedo Jimin! -ele segurou pelo braço e olhou o relógio no outro pulso. -Ainda são sete e meia!
-Ele dorme às oito.
Meu estômago revirou, talvez ele estivesse na sala nos esperando, eu conseguia imaginar aquela cena perfeitamente, sentado no sofá que tanto se gabava de ter comprado por um preço altíssimo, analisando a TV desligada como se nela estivesse passando todos os seus pensamentos do que faria quando chegássemos em casa. Suas regras o faziam dormir às oito restritamente, e eu também tinha esse costume, por isso que dentro do carro meus olhos pesavam tanto, dormir tarde eram casos que aconteciam vez ou outra por motivos justos, como trabalhos atrasados.
Tínhamos então que esperar até que desse as oito, puxei Jungkook para que se sentasse no chão, abaixados ali na frente do murinho amarelo o único perigo era que a vizinha novamente resolvesse aguar suas plantas de noite. Ele entrelaçou nossos braços e ficou encarando a rua vazia. Ficamos em silêncio total por aqueles longos trinta minutos, assistindo o vento balançar as folhas da cerejeira no jardim da casa à frente, aquele jardim pela tarde era lindo, tão cheio de flores em canteiros organizados que dava a impressão que sempre era primavera naquela casa. Já na nossa, o jardim era apenas um gramado liso, sempre aparado. Meu pai nunca deixara que nem uma flor fosse plantada naquele jardim, ele era simples e complicado ao mesmo tempo, como nós deveríamos ser. Era uma casa sem nada demais por fora, mas que entre todas naquela rua, chamava atenção, pois entre todas era a mais neutra e seria, em tons cinza e branco, com sacadas de vidro e ferro, sem piscina, sem churrasco aos domingos, sem flores, cercas, crianças, árvores, e sem carros parando de vez em quando com pessoas para fazerem visitas. Não se enfeitava para o Halloween, Natal ou Ano Novo, era uma casa tão sem vida como os donos dela. Foi uma surpresa a todos os curiosos da rua que pela manhã aguavam seus jardins e trocavam fofocas, quando meu pai apareceu com uma mulher e um garoto já adolescente, os dois ainda pareciam muito vivos para se relacionarem com pessoas como nós. Para mim também foi uma surpresa, já que eu nunca havia ouvido uma risada tão livre e feliz como a de Jungkook, nem tinha visto uma relação tão verdadeira quando a dele com os amigos dele. Eu não sentia inveja daquilo, eu admirava, e gostava de assisti-lo ser tão vivo, eu gostava dele porque ele não era como eu. E meu pai não gostava dele, porque ele não era como nós.
Ao meu lado, Jungkook empurrou meu ombro para me avisar alguma coisa. Segui seu olhar e vi que a luz do quarto dele havia apagado. Ele apontou para o corredor e se virou para mim.
-Vamos agora?
-Vamos. -respondi e ele se levantou ainda curvado e eu o segui. Fomos abaixados rente à parede, até chegarmos lá trás, onde um grande espaço se abria, a lavanderia ficava colada entre a outra parede e a casa, sob uma cobertura de madeira. Havia também uma única porta ao lado da janela dupla de vidro, era para lá onde íamos, a entrada da cozinha. Tiramos nossos sapatos já quase na soleira da porta, o saco de pelúcias estava com Jungkook e fazia um barulhinho irritante no meio de todo aquele silêncio. Ele estava segurando os sapatos e o saco plástico quando girei para vê-lo antes de entrar em casa, tirei as chaves do bolso e me aproximei dele. -Então até amanhã.
-Eu disse que ia dormir no seu quarto. -ele sussurrou irritado. -Não vai me expulsar assim.
-E se meu pai for nos procurar amanhã de manhã? Hum?
-Se insiste. -ele revirou os olhos e se inclinou me beijando, segurei os lados da sua camisa, ele por ser mais alto me fazia quase ter que levantar um pouco mais os pés. -Então se lembre de mim essa noite quando estiver entediado.
-Eu vou. -sorri e me virei para procurar a chave, desci uma por uma bem devagar na argola que as prendia para que não fizessem barulho, até que achei a certa. A girei na fechadura e abri a porta. Entramos tao quietos que eu estava quase ouvindo meu coração, fechei a porta com o mesmo cuidado e a tranquei. Nenhum som vinha da sala, nenhum TV ligada e nenhum sinal de que ainda estavam acordados. Eu fui atras do Jungkook, ele ia pisando como uma bailarina, oque me fez querer rir, mas me concentrei e continuei a andar daquele jeito esquisito até a sala, por sorte, ela estava toda apagada e ninguém estava lá. Pude respirar aliviado. O desafio era subir as escadas sem que rangessem. Dessa vez eu fui na frente, deslisando os pés como se fizesse carinho nos degraus, depois veio Jungkook desajeitadamente fazendo a madeira estralar como as costas de uma idosa. Com muito esforço chegamos no último degrau, onde pudemos rir aliviados do medo.
-Boa noite mochi. -ele sussurrou com os lábios rente a minha orelha. -Não quer mesmo que eu vá?
-Não, fique longe do perigo. -eu ri empurrando-o em direção a porta dele.
-Você é um perigo? -perguntou me olhando de cima a baixo. -Não sabia que o perigo era tão pequeno.
-Eu só não lhe bato porque eu não posso. -ergui uma mão fingindo que ia o bater e fui para o meu quarto. -Boa noite. -respondi antes de fechar a porta. Era bom e ruim estar ali de novo, muita aventura era cansativo.

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The Cure - Jikook
Fanfiction"Devíamos amar quem quiséssemos, não é? Pessoas são pessoas." Jimin vivia sob ordens de um pai rigoroso. Jungkook era seu meio irmão, livre para fazer suas escolhas e forçado a aceitar aquele segundo casamento da sua mãe.