Capítulo 20

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  Emily

Quero chorar de frustração.

A sensação que eu tenho, durante esses anos nove anos desde que as merdas do meu pai foram jogadas no ventilador, é que eles esperam por toda e qualquer oportunidade para vir perguntar sobre meu pai, mais conhecido como Rodrigo Fox.

No início, eram as fofoquinhas de bairro, "vocês viram o que aconteceu com o Rodrigo?", depois, as pessoas foram evoluindo. Depois que a fama do meu pai foi crescendo, já era quase impossível ir a algum lugar, sem ouvir: "você que é a filha do Rodrigo Fox?". Parecia que todos os católicos e familiares de pessoas que se trataram na ONG esperavam pelo momento em que eu, minha mãe e minha irmã sairíamos de casa, para surgir.

Quando Rodrigo recebeu um "convite" para se retirar, gentilmente, de sua banda na igreja de São Domingos, o falatório voltou com força total. Se sua fama tinha crescido rápido, as verdades sobre quem realmente era o meu pai vieram à tona com ainda mais força, mais rápido que um corredor de Fórmula 1.

A fama ruim foi estendida a família também. Eu, Ágatha e dona Cecília — que de nada tínhamos culpa — começamos a ser excluídas de um grupo e outro, os mesmos que rezavam na nossa casa, agora xingavam a gente tanto pelas costas, quanto pela frente.

Como se eu tivesse culpa! Que culpa eu tinha se meu pai era um hipócrita filho da puta? Nenhuma. Que culpa eu tinha se ele palestrava coisas que não vivia? Nenhuma. Que culpa eu tinha se todas as pessoas que compraram os CD'S com músicas autorais e testemunhos ditos falsos? Nenhuma.

— Para de fazer isso. – a voz de Hugo me assusta, fazendo com que eu deixe um prato cair, o quebrando em mil e um caquinhos

— Eu...hã....é.... – tento buscar as palavras, mas falho

Hugo suspira drasticamente, me dando um olhar acusatório.

— Você sabe que, em vez de ficar na cozinha organizando a ordem dos pratos por cor e tamanho como uma lunática, você poderia muito bem conversar sobre o que aconteceu?! Sabe, não sabe?! – vejo a veia do pescoço de Hugo saltar, jogando na minha cara o tamanho da sua irritação

— Desculpe, eu... — sinto meus batimentos em meus ouvidos, me fazendo lembrar de respirar fundo — Não fiz por mal. Nem tinha percebido que estava fazendo isso, até você chegar. – digo

O que não é mentira. Para mim eu ainda estava parada ao lado da cafeteira esperando o café ficar pronto, não agindo como uma "lunática" organizadora de pratos.

Odiava também esses momentos, onde eu fico tão imersa em meus pensamentos que não percebo o que estou fazendo. Geralmente, acontecia de eu começar a organizar papéis espalhados na mesa, por exemplo, ou de dobrar tudo que estivesse a minha frente — essa opção, em especial, é a que minha mãe e Scott mais amam. Ainda não sabia o que era isso, um tique, talvez?

— Vá pegar uma vassoura e uma pá, para a gente limpar isso – o loiro manda e eu obedeço calada

— Toma – entrego a pá a ele

Observo os caquinhos no chão, vendo como se assemelham a mim. Em um minuto estou inteira, polida, pronta para viver a vida, e no outro eu me deixo partir em diversos cacos de vidro, uns grandes e outros pequenos, por coisas bobas da vida. Porque sou frágil.

— Fale sobre Fátima. – Hugo ordena e eu balanço a cabeça, em uma tentativa falha de demonstrar que não é importante. — Não estou te dando opção, Emily. Fale. Sobre. Fátima.

Suspiro chateada, varrendo os meus cacos até a pá.

— Ela fez o que eles sempre fazem, Hugo. — dou de ombros — Perguntou sobre nosso pai, se estava bem e se precisava de alguma ajuda, perguntou também se eu estava namorando com Oliver e elogiou minha magreza. – reviro os olhos

Do Nosso Jeito - CONCLUÍDA Onde histórias criam vida. Descubra agora