CAPÍTULO QUARENTA E UM

2K 136 20
                                    

Fechei meus olhos e tentei focar em alguma coisa. Qualquer coisa que não fosse aquele par de olhos castanhos assustados à minha frente, sem entender o que estava acontecendo.

Encolhi-me na poltrona e abracei minhas próprias pernas. Era para ter sido um dia bom, mas ao contrário, fora um dos piores que eu já tinha passado.

— Perdeu o sono?

Abri leus olhos e vi Christopher sentado na poltrona à minha frente. Seus cabelos estavam bagunçados e apesar da pouca claridade que a lua deixava, eu podia ver seu rosto marcado pela lençol.

— Quer conversar? — Insistiu quando eu não respondi.

— Desculpa não ter chegado à tempo para as fotos, houve um contratempo.

— Tudo bem, seu trabalho é importante né? — Assenti.

Talvez se eu tivesse ido, não estaria acordada no meio da noite, culando-me intensamente pela morte de um paciente.

— Tá frio aqui, não é melhor ir lá para dentro? Vai ficar resfriada.

— Está bom aqui.

— Falar às vezes é bom, sabia?

— Eu sei... é só que... sei lá, acho que falar o que houve torna tudo mais real.

Engoli um nó que parecia ter se instalado na minha garganta. A vontade de chorar continuava, mas eu tinha que permancecer forte. Aquele tipo de coisa acontece e continuaria se repetindo.

— Vou fazer um pouco de chocolate que te pra gente, tá?

Dei de ombros. Christopher se levantou, veio até mim e depositou um beijo no alto de minha cabeça, então, fiquei ali por alguns minutos revivendo minhas últimas horas no hospital.

Quando me chamaram na emergência eu custei acreditar no que havia acontecido. Eu nunca tinha visto aquele hospital tão cheio de crianças machucadas como aquele dia. Um ônibus desgovernado atingiu em cheio o estacionamento de uma escola primária no horário da saída. Ver aquilo me deixou de certa forma, apavorada.

Pisquei algumas vezes tentando voltar a mim quando Christopher voltou, trazendo consigo duas canecas de chocolate e um prato com boscoitos.

— Tem certeza que não quer falar?

— Ela só tinha seis anos. — Abaixei minha cabeça. — Seis anos, e aqueles olhinhos Chris... ela estava tão assustada.

— Quem?

— Eu... eu devia ter pedido uma tomografia, mas não pedi por que ela estava bem. Só estava assustada... — Escondi o rosto entre as pernas e me deixei chorar soltabdo soluços dolorosos. — Se eu tivesse prestado atenção, ela estaria viva.

— Dulce, não dá pra saber. — Senti sua mão acariciar minhas costas e então quando levantei a cabeça me dei conta de que ele estava sentado no braço da poltrona.

— Christopher ela morreu por minha culpa. Eu matei uma criança!

— Para! Para com isso, tá bom? Olha, eu não sei o quê aconteceu lá, mas tenho certeza que você fez o que pôde, meu amor. Pessoas morrem, e infelizmente chegou a hora dela.

— Ela se chama Alice!

— Alice? Como a nossa filha? — Assenti enxugando. — Tá explicado.

— Eu nem mesmo consegui falar com os pais dela. Como poderia?

— Tudo bem, vai passar. Eu sei que é ruim, mas infelizmente sua profissão requer força d coragem pra aguentar coisas desse tipo.

— Eu sei, eu só... sei lá. — Peguei uma das canecas e comecei a tomar o líquido.

[Revisão] Forgive (Vondy)Onde histórias criam vida. Descubra agora