32 - Valéria

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Ai, Deus, me ajuda! Não quero morrer agora! Não posso morrer agora! Karla, cadê você? Por que foi para a balada? Socorro! Deus!

É como se minhas entranhas tivessem virado uma pedra, logo ao acordar e durante um longo minuto. Cada movimento que faço entre a cama e a escrivaninha onde deixei o celular dói na alma. Fico parada quase ereta ao lado da cama, pois até as pernas parecem não me obedecer. Deus do céu!

Ao sentir um alívio, consigo digitar o número do hospital, mas não completo a ligação, pois o pior já passou. Consigo andar normalmente. Antes de ir para o hospital a pé mesmo, ligo para minha mãe. Quem atende é minha irmã, que só fala do Elton, o quanto ele acabou com minha vida, o quanto esse bebê está me destruindo. Que irmã! Fala como se meu filho, sangue do meu sangue, fosse um bicho qualquer. E por que ela atendeu o telefone da minha mãe?

E se der outra contração dessas? Eu vou morrer de dor!

Ligo para o hospital, chamo uma ambulância com urgência, faço papel de estar com muita dor (uma coisa que ainda trago comigo dos tempos de amizade com a Bia é ser uma boa atriz) e convenço-os a enviar a próxima disponível. Daqui a vinte minutos! Que organização! Que belo atendimento! Ainda bem que não votei nas últimas eleições. Ô, governo ruim! Se eu estivesse morrendo de verdade, em vinte minutos estaria realmente morta.

Última opção. Se bem que Karla deve estar zonza depois da madrugada na festa, pode nem atender, mas não custa tentar. Ignoro uma mensagem que acaba de chegar da Bia.

Assim que ouço seu alô do outro lado da linha, minhas pernas param outra vez, e minha barriga vira uma pedra. Deixo o telefone cair de quina no piso, o que faz tanto a tela quanto o piso racharem um pouquinho. Não consigo andar até a cama de volta, mas também não aguento me segurar em pé por muito mais tempo. Passam-se dez, quinze, vinte segundos, mas sinto como se fossem dez, quinze, vinte minutos! Lágrimas começam a descer no meu rosto, e eu pioro a dor ao tentar apertar a barriga para contê-la um pouco em vão.

Um passo. Mais um e me largo sobre o colchão. Um som de motor em alta rotação chega e para, e as portas da casa se abrem violentamente.

— Val, tá tudo bem, amiga?

Não consigo responder. Meus olhos doem de tanto que os aperto para tentar combater a dor. Que desordem! Karla me levanta em seus braços (quem diria que a grandona é forte como uma égua?) e me leva à moto com cuidado. Não adianta muito, pois cada segundo a dor aumenta. A moto parece estar me rasgando de baixo para cima. Mesmo assim ela me amarra com um tipo de cinto e, após colocar em mim o capacete, me leva ao hospital.

Sou liberada instantes após entrar no consultório, pois o médico nem me examina direito antes de dizer que é só uma contração passageira normal. E uma febre leve.

— Vai ficar tudo bem — Karla diz quando nos preparamos para voltar para casa. Ela passa a mão em meus cabelos com muita suavidade e fica me olhando por tempo demais para o meu gosto. Só agora reparo uma marca diferente no braço dela, como se tivesse pressionado algo com força.

— Vamos — digo antes que isso fique estranho. Nem falo obrigada agora para que ela não me entenda errado.

Quantas dúvidasOnde histórias criam vida. Descubra agora