57 - Bia

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Que domingo lindo! Não podia ser mais perfeito! O céu totalmente azul sem nuvens é um milagre nesse lugar! Clima perfeito para uma festa de casamento! E não só eu, mas vamos vários jovens na van. O caminho é curto, mas suficiente para eu avaliar a vida dos meus companheiros de guerra.

Meck, sentado na frente, com o motorista, para variar, está indo bem com seu negócio de artes, o que é uma grande vitória para um rapaz tão fechado como ele. Thalia, aqui do meu lado, também segue firme no FJ, e tem investido em seu talento recém-descoberto: moda; ela escolhe os figurinos de nossos teatros e às vezes até desenha e cria peças novas. Sua mão para costura é tão precisa quanto a de um cirurgião. Só não acho bom o Meck ter desistido dela, pois eu pensei que dariam certo.

Atrás de mim Bruninho fala rápido como a Kawane. Consigo, com muita atenção, perceber que conversa com as meninas sobre alimentação. Ele está aprendendo a cozinhar cada vez melhor, com certeza pela falta que faz sua mãe. É bom saber que ele está feliz, e, principalmente, ganhou força e coragem para assumir sua fé, depois que sua mãe partiu. Como alguns dizem: há males que vêm para o bem. Este pode ser o caso da Valéria também. Ela não vem conosco na van, mas penso nela do mesmo jeito. Faltam poucos dias para chegar o Michael, coitado, e ainda está com aquele problema no cérebro. Ainda, pois tenho certeza de que, no que depender da minha fé, ele será curado, para a glória de Deus!

A van estaciona antes que eu perceba que estamos no centro da cidade grande. Descemos para embelezar a rua, cada uma com um vestido mais lindo que o outro. A Kawane tem o mais transparente entre nós, mas Mokado tem o mais aberto, o que me deixa sem jeito quando chego à igreja e encaro os olhares dos líderes que me conhecem e sabem que meus jovens usam esse tipo de roupa indecente. Uma coisa é marcar a cintura com a roupa bem ajustada (faz parte de ser bonita), outra é mostrar tudo para quem olha meio por cima ou de lado.

— Olha quem tá ali, Bia! — Mokado diz ao meu ouvido enquanto seguimos até nossos lugares. — Ali!

Viro só os olhos para saber de quem ela fala. Aquele jovem de quem tanto me falaram nos últimos meses olha para mim.

— É hoje que você desencalha, hein, obreira!

— Para com isso, Mokado — respondo com um soco de leve.

Ainda no caminho, reparo também Felipe, que mantém o sorriso desde quando saímos de Marazul. Apesar da sua situação com o Paulinho, nada parece abalá-lo. Ao contrário, encontra e cumprimenta alguns jovens em pleno salão com aquele jeito maluco dele, chamando a atenção dos desconhecidos. Ai, que vergonha! Pelo menos já vai começar a reunião.

*

Após a lindíssima reunião, depois de eu arrumar a maquiagem borrada pelo choro pós-busca, chegamos ao salão de festas para o almoço. Felipe, para variar, chega conversando com a maior galera. Dentre eles, o rapaz que a obreira Mokado e o pastor Carlos amam tanto. Só falta ele vir para nossa mesa! Ficamos todos numa só, apenas Meck fica separado na do lado.

— Venha aqui com a gente, Meck.

Ele aperta os olhos e demora um pouco, mas traz sua cadeira para perto de nós. Afasto-me para que ele se sente à mesa do meu lado. Ele ainda deve estar se sentindo mal com a Thalia.

Quando o almoço é liberado, vou com as meninas para a fila do self-service. Kawane é a primeira da fila, para variar! Mas com a fome que estou, não espero formar uma fila para ir ao final. Diferente de Meck, que espera sentado para ser um dos últimos.

De volta à mesa conversamos sobre nossos vestidos até enquanto Meck volta da fila. Felipe chega por último na mesa, e me afasto um pouco para ele chegar à sua cadeira. Sinto algo passando em minha perna, o que me faz travar o coração. Congelo o corpo por um instante e viro a cabeça lentamente. Quando vou bater a mão na perna para tirar o que penso ser um bicho, fico surpresa com a mão de Meck segurando a saia do meu vestido.

— O que foi? Meck?

— Ah, obreira, eu ia me afastar um pouco e a senhora veio primeiro, não deu tempo de tirar a mão. Desculpa.

— Então... então tire a mão!

— É que, como vocês estavam falando, esse tecido é mesmo bem gostoso ao toque. As meninas podiam fazer um com esse tecido pra mim. — Meck arregala os olhos e continua rápido — Para o teatro, eu tô falando.

As meninas riem, mas eu continuo olhando os olhos de Meck. Posso estar errada pela primeira vez, mas Meck não parece ter dito aquilo brincando. Está estranho.

Antes que eu consiga perguntar qualquer coisa para ele, Mokado chega à mesa (com sua segunda rodada) e traz alguém com ela.

— Esse é o Zaki, meu amigo, obreira Bia. Ele é do Universitários aqui de Jakra.

— Olá, obreira Bia, prazer conhecê-la.

— Ah, olá — respondo.

Por mais fria que eu fique, Mokado e ele permanecem na mesa. Aos poucos as meninas saem para pegar sobremesa e nos deixam a sós. Até Mokado ameaça sair, mas mantenho-a na conversa. Se ficar apenas o Meck na mesa será como se apenas Zaki e eu estivessem, pois Meck quase não conversa. E ficarmos apenas eu com um rapaz não é certo. O que faço? Enquanto converso da boca para fora, dentro de mim busco motivos para cortar pela raiz qualquer sentimento, mas não encontro. Graças a Deus a mesa enche de amigos, mas Zaki não sai sem antes ser adicionado ao nosso grupo de Marazul (não sei o que deu na ideia de Felipe em adicioná-lo; agora ele tem acesso ao meu número).

Se bem que não há tanto o que temer. Eu sou fiel, faço a vontade de Deus e estou dentro da mesma. Não tenho nada a perder em apenas conversar com esse rapaz.

Quantas dúvidasOnde histórias criam vida. Descubra agora