70 - Felipe

31 7 0
                                    

Nossa! Perdi a manhã inteira nesse posto à toa. Enfrentei fila para finalmente ser atendido e o médico vem falar que o Paulinho está com uma virose. Nunca tem fila, mas é como se hoje todo mundo tivesse acordado doente. Só faltava a Valéria! Tá amarrado!

Já que nem fui trabalhar, passo na igreja para evangelizar com a galera, e dar uma animada no movimento para encher o Conexão de hoje. Paulinho no meu colo.

— Quanto tempooo! — diz Bia direto com os braços abertos para pegar meu garoto.

— Cuidado, obreira, ele não tá muito bem.

Bia foca no rosto dele, faz umas caretas e consegue lhe tirar um sorriso. Quando ela fala dos olhos vermelhos do Paulinho, ele espirra e suja a cara da Bia, e a coitada larga o menino em mim e corre para se limpar no banheiro.

— Aôo, Bia, acabou de pegar o menino e já passou gripe pra ele? — digo e rio. Zaki chega da frente da igreja e ri comigo.

Engraçadinho, diz Bia só ao fechar pela metade os olhos.

— Quer saber — agora ela fala abertamente —, vai descansar com o Paulinho, Felipe.

— Não, obreira, faz tempo que não evangelizo com vocês, hoje tô voltando pra arrasar. Vamos encher o Conexão, tá ligado?

— Sua família em primeiro lugar, Felipe, certo?

Zaki chega ao lado da obreira, o que faz meu peito dar um pulinho seco.

— Que... obreira, Paulinho tá na mão de Deus, e isso aí que o médico falou de virose e suspeita de Zika, não vai dar nada!

— Ah, que seja, vai na sua fé — Bia responde sem me olhar.

Como assim? A Bia, sempre perfeitinha, dando sermão, agora nem insiste comigo para mudar? Algo de errado não está certo. Até meu primo e as meninas ao redor dele trocam olhares entre si e com Bia.

Zaki chega por trás da obreira e lhe abraça, o que me faz revirar o estômago. Quando ele tenta beijá-la, até meu equilíbrio se abala. E no fim, quando ela aceita o selinho, cara, eu pego o Paulinho e luto para conter a vontade de apertá-lo mais do que ele suportaria.

Pego um dos montes de panfletos separados e vou para a calçada fazer um ponto de fé sozinho enquanto os jovens não vão à praça. Povo enrolado! Desse jeito nunca vão ganhar almas.

Quantas dúvidasOnde histórias criam vida. Descubra agora