61 - Bia

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Todo dia dessa semana Zaki mandou pelo menos uma mensagem para meu particular. Admito que ele é insistente; mas isso não é tão grande coisa, pois o diabo também é. Mas a pior mensagem, se posso dizer assim, é esta de hoje mais cedo:

Zaki FJ Jakra (14h21): Boa tarde

Zaki FJ Jakra (14h21): Hoje te visitarei no Conexão aí em Marazul :)

Direto, sem nada antes nem depois. Também não respondo.

*

Arrebentou o Conexão! Alguns jovens novos que vieram por nossa evangelização na praça fizeram valer a pena todo o esforço. O problema é depois que a maioria vai embora e apenas Meck e o pastor Carlos ficam comigo enquanto o pastor não fecha a igreja. Felipe saiu batendo nos bancos, todos viram que estava revoltado com algo. E na porta a obreira Mokado me chama com alguém ao lado.

— Vamos tomar um sorvete, Bia?

— Ou, se as senhoritas me permitem, um açaí — responde seu amigo, o visitante.

A sorveteria fica pertinho da igreja, graças a Deus.

— Nossa! Desculpa aí, gente, eu tenho que ir embora!

— Obreira Mokado! Não, você vem também! — digo.

— Tem muita louça pra lavar hoje, Bia. Foi mal. Tchau. Cuidado vocês dois, hein?

— Mokado, volte aqui! Você nem lava a louça dia de sábado!

Meu grito ecoa na rua escura e vazia. Zaki ri de nós duas.

— Essa obreira é um pouco maluquinha — Zaki diz antes de chegar até o balcão para pedir seu açaí.

Sou tão educada! Deveria ser menos e deixar esse jovem sozinho na mesa. Essa obreira Mokado só dá dor de cabeça.

— Então, obreira Bianca, está sabendo do evento que acontecerá na capital em maio?

— Só Bia. E estou sim, o Cultura Day, certo? Inclusive estamos preparando um teatro violento para apresentarmos. Você vai ver!

Depois de falar essa frase sinto uma vergonha, como se agora eu o tivesse chamado para o evento.

— Com certeza não perderei o evento, especialmente pela peça teatral do seu grupo.

Tento encerrar aí a conversa, mas Zaki continua falando sobre os projetos da FJ, comparando nossas igrejas e resultados. Ele emenda com as outras reuniões, outros assuntos e dá uma pausa rápida, que aproveito para me levantar da cadeira.

Meu braço fica, pois Zaki me segura. Quem lhe deu permissão para tocar em mim? Antes que eu consiga falar umas verdades, ele vai direto no assunto.

— Bianca, você aceita namorar comigo?

— Como? Zaki, a gente mal se conhece. Ore e peça direção...

— Isso de orar não existe. A senhorita não frequenta a Terapia? Esse orar apenas fazia os jovens perderem tempo. Comigo é pela fé, e a fé é como um raio.

Não respondo, apenas puxo o braço e caminho até a calçada. Zaki ainda me oferece carona, mas recuso sem muita educação. A obreira Mokado me paga!

*

— Mokado! — falo em tom firme ao entrar no apartamento.

— E aí, como foi, Bia?

— Tá brincando? Aquele jovem veio com umas conversinhas que tá amarrado!

— Poxa, Bia, você não deu uma chance pra ele? O Zaki é um menino tão bom, honesto, de Deus. Top.

— Por que você não fica com ele então?

Apresento minhas razões. Zaki é muito educado, polido, atencioso a detalhes e fala muito correto. É perfeitinho demais. Irrita.

— Parece alguém que conheço, daria certinho um pro outro...

Encho os pulmões e solto o ar com um ruído alto pelo nariz.

— Bia, se você procurar o homem perfeito, nunca vai achar. Não existe príncipe encantado. Você é uma menina tão linda, tão abençoada, eu me preocupo, quero o melhor pra você. Acha que lhe apresentaria um rapaz qualquer?

Não consigo argumentar contra Mokado. Por isso, com humildade, decido pedir uma orientação ao pastor amanhã de manhã, depois da reunião principal. Talvez até com Zaki, já que ele fica este fim de semana por esses lados.

Antes de dormir, porém, minha mente sai dele para ir até Bruninho. Faz tempo que ele está inconstante, não evangeliza comigo como antes, nem vai nos ensaios do teatro. Falta só um mês para o Cultura Day, e parece muito, mas o tempo voa. Não tem como substitui-lo em cima do dia. E além dele há vários afastados para ir atrás amanhã à tarde.

Zaki FJ Jakra (22h39): Boa noite

Zaki FJ Jakra (22h39): Amanhã depois da reunião podemos conversar?

Quantas dúvidasOnde histórias criam vida. Descubra agora