Capítulo 29

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A dor ridícula nas costas surgiu na manhã seguinte, assim que Stefan levantou-se da cama. Sentia-se um bagaço de laranja após uma mísera dança com a Srta. Sophie. Voltou para as cobertas, pondo a mão na fronte, sentindo-se até mesmo febril por lembrar-se das feições encantadoras daquela senhorita. Um sorriso desenhou em seu rosto mas logo Stefan tornou-se sério. O que ele estava pensando? Em cortejar uma dama que mal conhecia? Ele era um homem amaldiçoado, além da abrasante verdade em que aquela moça de cerne tão gentil era uma Valentine.

Os pensamentos foram varridos de sua mente quando as cortinas da janela foram afastadas bruscamente, fazendo com quê os raios de sol invadissem o quarto, iluminando todos os possíveis cantos, inclusive, aquecendo a sua pele. Ouviu uma voz álacre achegando-se aos seus ouvidos, e espiou de soslaio quem era. Olivia estava realmente bela e alegre naquela manhã. Era uma garota muito vivaz e bem-humorada, que contagiava a todos com seu semblante agradável. Rodopiou pelo quarto de Stefan, catando as peças de roupa do rapaz que jaziam ao chão.

— Que bagunça, irmão. Não sabes guardar as vossas vestes no baú?

Apesar de Stefan ter sido adotado tardiamente pelo Sr. Fernand, Olivia sempre o tratou com muita afeição fraternal, ralhando com ele nas vezes em que errava, ou elogiando quando Stefan fazia algo certo — e raramente Olivia o elogiava, pois estava sempre ralhando com Stefan. Quando eram crianças, instantaneamente Olivia criou um laço com Stefan, e nos momentos mais difíceis da vida do rapaz, ela esteve ao seu lado, confortando-o. Era uma donzela deveras amorosa com todos os irmãos.

— Oh, Olivia, deixe-me dormir. Estou tão cansado que poderia dormir por dez anos inteiros. Nem mesmo quando eu trabalhava para o Sr. Sullivan sentia-me desta forma.

— Se eu fosse uma vidente, o que não sou, diria que a causa de vosso cansaço é por causa de uma dama cujos cabelos são alvos como a neve, com quem dançastes ontem. Estou correta?!

Stefan assentiu, e Olivia soltou um gritinho de entusiasmo, lançando as roupas de Stefan para os ares, jogando-se na cama do rapaz, ficando ao seu lado.

— Não, Olivia, estou somente de pijamas — Stefan exclamou, envergonhado.

— Como se eu me importasse com isto. Quando pedirás a mão da Srta. Sophie em casamento?

— Que tipo de pensamento é este, minha irmã? Estais a tramar um casamento para mim?!

— Se você tivesse visto o que eu vi ontem no baile, enquanto vocês dois dançavam. Pareciam um casal perfeito. — Olivia abanava com a mão, muito empolgada.

— Não haverá casamento, Olivia. As feridas do meu coração ainda não se recuperaram.

Olivia piscou os olhos, arrependida do que dissera. Bateu os dedos nos lábios e logo voltou a sorrir. Levantou-se em um salto da cama, e piscando seus brilhantes olhos azuis, voltou-se para Stefan.

— Vistes aquele pequeno menino tocando piano no baile? — Olivia pôs as mãos na cintura. — Creio que teria de treinar bastante para ser tão boa quanto ele, ou papai ficará desapontado comigo. Imagine, perder para uma criança pequena.

— Ah, irmãzinha, mas tens de aceitar a derrota, afinal sabes muito bem que toco piano melhor que você.

— Isso porque eu que lhe ensinei tudo o que sabe, Stefan. Ora, veja se pode! O aluno quer ser melhor que a professora. — inflou as bochechas, fingindo uma falsa irritação.

Batidas foram ouvidas na porta, e Olivia rapidamente atendeu, enquanto Stefan escondia-se mais e mais debaixo das cobertas, por conta de ainda estar de pijamas. Olivia fechou a porta e em suas mãos jazia um envelope. Sentou na beirada da cama interessada na carta.

— Uma das criadas veio entregar-me isto. — Olivia colocava o papel contra a luz, tentando bisbilhotar o conteúdo que havia dentro.

— Ora, der-me isto, e não sejas tão curiosa. — tomou o envelope das mãos de Olivia, retirou o lacre e leu a carta. — Estranho! Papai deseja eu retorne para Hampshire, e que hospede-me na mansão da família Valentine. Ah, logo na casa desta família... 

— Por que ficastes nervoso? 

— Deve ser alguma viagem a respeito dos negócios de papai com o Sr. Heron Valentine, e como bem sabes, papai anda bastante atarefado esses dias.

— Está vendo, irmão. É o destino traçando laços com a Srta. Sophie. Logo estarão casados. — Olivia rodopiava de braços abertos.

— Esqueça este casório ilusório, Olivia. Isto só existe em tua cabecinha de criança.

— Não sou criança. E nossos outros irmãos concordam que já sou bem adulta — Olivia mostrou a língua. — Mas se vamos voltar a Hampshire, significa que com um pouco de sorte, tu podes ir para aquele vilarejo vizinho e visitar aquela moça gentil da qual sempre falavas.

Lembranças adocicadas inundaram a mente de Stefan. Era maravilhoso recordar-se de Vennia, de seu sorriso contagiante, de sua teimosia irritante, de sua amizade calorosa.

— Ah, Vennia. Mas eu muito a chamei de Venni, e ela não importava-se por eu chamar seu nome da forma errada. Há anos que não a vejo. Talvez, ela nem mesmo queira me ver, e caso reencontre-me, me receberá com vassouradas. Sou um péssimo amigo.

— Oh, irmão, mas escreveste para ela durante todos esses anos. Quase todos os dias. Não é um péssimo amigo, pois sempre lembrou-se dela em primeiro lugar.

— Mas nunca recebi uma carta de volta. Nada. Nenhum bilhete, ou um mínimo recado em que houvesse ao menos uma linha. Certamente, Venni ainda deve odiar-me por deixá-la.

— Esta tal Srta. Vennia parece-me ser muito importante para ti, caro Stefan.

— Ela foi a minha melhor amiga durante o tempo em que passei em Hampshire, trabalhando na casa do Sr. Sullivan. Deus, isso me traz tantas lembranças. Tanto boas quanto ruins.

— Se ela foi a tua melhor amiga, então, também quero ser amiga dela. — Olivia sorriu. — Estava pensando em uma coisa, mas creio que me acharás uma boba.

— No que estava pensando, minha irmã?

— Que tu poderias casar-te com essa sua amiga Vennia. Não seria fantástico?

— Por que esta obsessão repentina em casar-me, Olivia?

— Desculpe-me, mas não podes dizer que é uma má ideia.

— A esta altura, creio que a minha amiga esteja casada. Ela era uma moça bonita e intrépida, seria muito difícil um homem não ver estas qualidades em uma mulher assim.

— Falas isto com uma voz tão triste. O que te abates, Stefan?

— Ah, Olivia, sabes que toda a dama que eu me apaixono perdidamente, acaba por abandonar-me sem mais ou menos. Estou destinado a nunca mais a ter alguém do meu lado. Sou um homem amaldiçoado.

— Não diga estas coisas. Isso muito me entristece. É como se tivesse perdido toda a esperança.

— Mas por outro lado, agradeço a Deus por tê-la posto ao meu lado. Se não fosse por ti, não faço ideia do que teria ocorrido a mim. Creio que teria desistido da vida.

Olivia sorriu para ele. Se entristecia por conta da maneira melancólica que Stefan via a sua vida.

— Tenha mais uma coisinha para lhe pedir: posso viajar contigo?

— Ah, irmã, há algo que me peça que eu lhe negue?

— E poderei levar as minhas bonecas comigo? Sabe como são preciosas para mim.

— Depois ainda exprime para todos que não és mais uma criança, todavia ainda brinca com bonecas.

— E não sou mais criança. Minhas bonecas são itens de coleção. — mostrou a língua, mais uma vez.

Sem escolhas, Stefan assentiu. No fim daquela tarde, prepararam toda a bagagem, e juntos, regressaram para Hampshire.


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