VENNIA

Capítulo 53

Vennia, que decidira adotar seu verdadeiro nome, despertou naquela manhã com o cheiro delicioso de torta de romã que lhe agraciava as narinas e provocava roncos em seu estômago. Lavou o rosto na bacia com água sobre a mesa de cabeceira, e enxugou o rosto gentilmente. Sentou-se frente ao toucador e apressou-se em escovar o longo cabelo, e enquanto penteava as mechas, lembrou-se do que aconteceu dias antes...

Na saleta de casa estava Miriam a falar com um investigador, quase em um tom de dolorosa súplica, para que ele analisasse o caso de sua irmã, pois para a jovem loira, poderia ser qualificado como crime de sequestro. O investigador era muito imparcial dizendo-lhe que era impossível reabrir um caso naquele momento, pois a vítima jazia sem memória do que lhe ocorrera. Obviamente, Miriam aborreceu-se, e após uma breve e acalorada discussão, o investigador se foi.

Vennia parou de escovar o cabelo, encarando o reflexo no espelho, muito precisamente, a cicatriz na têmpora direita. Tocou-a com os dedos, deslizando-os devagarinho sobre a forma de lua crescente. Oh, como ela almejava descobrir o que houvera consigo nos quatro anos em que ficou desaparecida. Mas, e se ela presenciara coisas terríveis? Não seria o seu esquecimento uma benção? Abanou a cabeça, abandonando aqueles pensamentos tão funestos logo tão cedo.

Pegou-se até mesmo pensando em Victor. Mordeu os lábios, a mente muito embaralhada. Se o visse outra vez, o agradeceria por ter dado à ela a alegria de reencontrar a sua família. Sim, agradeceria ao rapaz por aquele feito. 

Escovou o longo cabelo mais uma vez. Decidiu enfeitá-lo com uma presilha, mas irritou-se demasiado, pois a bendita presilha não prendia seu coque por nada no mundo, sempre desfazendo seu cabelo. Ah, como sentia falta da Sra. McBride e de suas mãos ágeis. Penteou o cabelo mais uma vez, e prendeu-o em uma trança. Felicitou-se e logo tratou de colocar a presilha na lateral de sua cabeça, bem acima da orelha esquerda. 

Por fim, abotoou o vestido, e cumprimentou Miriam e Hope com um bom dia que poderia ser tido como um sussurro. A avó e a irmã corria de um lado para o lado, mui afobadas. A moça, tão logo abateu-se, pois explicou para Miriam e Hope, que queria sentir-se mais à vontade, e apesar de todo o tratamento que lhe dava, Vennia suplicou para que as parentes a tratassem da mesma forma como outrora lhe tratavam. Não almejava ser tratada daquela maneira, como se fosse uma espécie de boneca de cristal, pois muito sentia-se mal. Ressaltou ainda, que era a mesma Vennia, apenas havia perdido as suas memórias. Após o breve discurso, abriu um sorriso franco, e sentou-se à mesa.

Miriam desculpou-se com a irmã, revelando que aquelas não eram as suas reais intenções, somente almejavam deixar Vennia confortável com a sua atual situação, pois muito se compadecia pela moça ter perdido todas as suas lembranças. Tratou de servir os ovos cozidos para Vennia, que muito alegrou-se. Durante o desjejum, Vennia questionou sobre o doce aroma de torta de romã. Hope esclareceu que Miriam fazia as tortas e as vendia no mercado, com a ajuda do Sr. Eric, para obter uma renda alternativa para manter os custos da casa. Hope também dissera, que torta de romã era a favorita de Vennia. Oh, como ela gostaria de lembrar das coisas que um dia foram tidas como suas prediletas.

Foi um pequeno almoço bastante agradável, onde Vennia contou um pouco sobre os McBrides e em como sentia falta deles. Elucidou que muito em breve, escreveria uma carta para eles, para mantê-los a par do que estava a ocorrer com ela em seu novo lar.

Enquanto degustava os ovos cozidos, em algum momento, Miriam narrou sobre os acontecimentos de muitos anos para Rosie, agora Vennia, quando ambas eram meninas, e após a morte dos pais tiveram que serem transferidas para um lugar que cuidava de crianças órfãs, chamado de Casa. Dissera, muito emotiva, como Vennia a protegia e em como renegava a comer para oferecer sua precária refeição à irmã. Vennia desejou replicar e continuar a conversa, porém nada lembrava-se das coisas que Miriam lhe falava, e no final, silenciou-se, como se todos os fatos que Miriam mencionava fossem as ações de uma outra pessoa, e não as dela.