VENNIA

Capítulo 3

Ah, os Valentines. Sempre invejados ou odiados. Mas nunca amados.

Iremos agora a uma outra parte da história, vistoriar a árvore genealógica daquela família tão atípica. Todos conheciam os Valentines. Por muito tempo, aquela família ficou conhecida pelos boatos de que eram um clã de feiticeiros, isso devido a ignorância popular, e ao fato de todos os membros possuírem cabelos brancos como o luar, e olhos cinzentos quase prateados. Ao passar dos séculos, o rumor sobre serem feiticeiros, acabou de vez, e as pessoas do vilarejo somente ressaltavam o fato do quão infamemente ricos eram os Valentines.  

Porém, a riqueza nada era comparada a falta de amor daquela família. Eram como uma linda maçã estragada. Por fora, vistosa e mui rubra, mas assim que os dentes atingissem a primeira mordida o sabor pútrido vinha de instante na língua. Assim eram os Valentines. Por gerações ocorreram intrigas, traições e desavenças sangrentas entre eles mesmos, por conta da fortuna. 

A linhagem atual dos Valentines consistia por Heron Valentine, o patriarca da família, que casou-se com sua prima, Morgana, e lhe deu um filho; Kairus. Posteriormente, a esposa morreu de hemorragia consequente do complicado segundo parto que tivera, dando a luz à Diana. Anos após o nascimento da filha, Heron relacionou-se com uma cigana que lhe deu um filho, e a este filho, Heron deu o nome de Lewis. A cigana sumiu do mapa. Muitos diziam que Heron havia pagado uma boa quantia de dinheiro para ficar com a criança. 

Diana casou-se e tivera duas crianças; Brandon — este nascera no mesmo dia do seu sobrinho — e Sophie. Como era uma mulher orgulhosa, assim que casou, mantivera o sobrenome Valentine, pois havia se casado com um parente distante. 

Kairus, então adulto, casou-se contra a sua vontade, com uma garota chamada Alana (da qual Kairus outrora imaginou que seu sobrenome fosse Fala Mansa, mas isto é uma outra história), uma moça que foi criada como sendo a filha ilegítima de um lorde quase à beira da falência, pois o homem que a criou como um pai havia se apaixonado perdidamente por uma bela dama, que infelizmente estava grávida de outro cavalheiro. Para que sua amada não caísse em desgraça pela gravidez inconsequente, o lorde casou-se rapidamente com ela, e criou Alana como sua filha. Alana era uma dama de personalidade caridosa e muito humilde. Sua característica mais marcante eram seus encantadores cabelos loiros mui pálidos, além de seus apaixonantes olhos castanhos. Durante um tempo, Kairus e Alana foram bastante felizes, e tiveram um filho da qual deram o nome de Victor. Victor nascera seguindo os traços dos Valentines — os ditos cabelos brancos e olhos cinzentos — porém, o olho direito do menino era castanho. Era a chamada heterocromia. 

A desgraça e amargura de Kairus viera com a morte de sua esposa, que falecera de forma trágica e cruel, no incêndio da igreja de Santa Cristina. 

Enlouquecido por ter perdido o amor de sua vida, Kairus abriu mão de seu filho, Victor, que tinha até então, apenas nove anos. 

Victor perdera precocemente a mãe, e o pai resolvera afastar-se dele sem ao menos explicar-se, sempre indo em longas viagens, com a intenção de não ter de encarar a feição do rebento. Entregou Victor aos cuidados de um padre velho chamado Owen, e pediu para que ele cuidasse da criança. São complicados os laços consanguíneos dos Valentines. Fora muito desgastante para Victor, uma até então criança, sair do leito de seu lar, para ir à casa de um senhor que sequer havia ouvido falar a respeito. Como se não bastasse, Victor havia desenvolvido uma aversão extrema ao fogo. Passava mal por meramente mirar a pequena flama de uma vela ou as chamas crepitando na lareira. Acordava à noite, gritando e chorando, pedindo por sua mãe.  

Mas o padre Owen era paciente com o menino, e criou-o por um ano inteiro, dando-lhe o afeto de um pai. Owen entendia Victor, respeitava seus limites e preenchia as lacunas deixada por Kairus.