Capítulo 43

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Victor tinha oito anos, quase nove, disto ele lembrava-se. Rememorava do cheiro do pó do café, do orvalho da manhã, dos risos de sua mãe...

Ah, a sua adorada mãe. Alana não era uma mulher talentosa ou com dons escondidos. Não sabia cozinhar, tecer, costurar, cantar ou pintar. Além do mais, Alana era um desastre ambulante, mesmo depois de casar-se e tornar-se mãe. Ela tinha suas qualidades. Sempre transitava entre uma personalidade doce e admirável, para uma amarga e insuportável. Seu pavio era extremamente curto, e se lhe pisassem no calo, revidava na mesma moeda. Quando descobriu que se casaria apenas para tirar os pais da pobreza, a primeira coisa que fizera foi encarar seu noivo, e lhe desferir a seguinte bravata; "Só me tocarás quando conseguir conquistar meu coração. E caso tente alguma gracinha, farei questão de lhe dá uma boa surra". Talvez, tenha sido pela firmeza nas palavras daquela moça que Kairus apaixonou-se perdidamente. Ela era bruta, mas assim que ele conseguira quebrar as barreiras que protegiam o coração da moça, descobriu o quão afável era Alana.

Victor amava a sua mãe. Olhava para ela, admirado, espantado. Para o pequeno menino, ela era a pessoa mais preciosa em sua vida. Amava o pai, isto era verdade, porém Kairus sempre estava ocupado com suas incumbências, sobrecarregado demais para passar algum tempo com ele. Quando sobrava tempo para Kairus, brincava com o filho com jogos de tabuleiro, ou simplesmente, o levava para uma agradável pescaria.

O dia, que muito em breve anunciaria uma tragédia, era somente mais um dia apático e normal. Os raios de sol entravam pela janela da sala de estar de Alana, e faziam os frascos coloridos com pequenas flores postos por ela sobre a mesa, adornavam a parede como se fosse um arco-íris. Victor adorava passar o tempo com a sua mãe, e adorava ainda mais, quando ela estava concentrada em sua poltrona, a ler, serenamente, seu livro.

— O que é VI, mamãe? — Victor perguntou.

— Quando você for maior, eu lhe conto — afagou a cabeça do filho, os dedos perdendo-se nos cabelos alvos de Victor.

A porta da entrada abriu-se, e então, Kairus adentrou os aposentos. Beijou a testa da esposa, abraçou o filho. Enunciou que faria uma longa viagem, porque almejava fazer fortuna, e assim sair debaixo da asa de seu autoritário pai, não dependendo mais de suas miseráveis moedas que eram entregues mensalmente. 

— Alana, me amas de verdade?

— Claro que o amo. Por que duvidas?

— Lembro quando estávamos para nos casar. Disseste para mim que apenas poderia tocá-la se eu ganhasse o seu coração. Ou caso contrário, eu levaria uma surra.

— E o obtivestes o meu coração, meu amor. Eu tenho a ti, e ao meu filho, não preciso de mais nada. Queria tanto que passasse mais tempo conosco. Não necessito de tamanhos bens materiais.

— Mas eu quero agraciar-te, meu amor. Minha Fala Mansa. Quem contempla este rosto tão meigo, não imagina a fera que existe por trás.

Kairus achegou-se a Victor, passou a mão em seu cabelo, desarrumando-o, e logo em seguida o abraçou.

— Papai vai viajar. Vou voltar dentre alguns dias.

Kairus sorriu para o filho. Em seguida, beijou a esposa, e partiu.


Naquele mesmo pacato dia, Victor fora flagrado pela mãe algumas vezes, a mexer na lareira com algumas brasas. Espetava um graveto seco nas extintas chamas, tentando incendiá-lo. Quando Alana viu tal gesto, não conteve-se em repreender o pequenino.

— Filho, o que estais fazendo? Brincar com fogo é perigoso. Poderia ter se machucado, meu amorzinho.

— Mamãe, eu só estava fazendo a minha espada de fogo.

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