Entrada VIII

2.7K 293 18
                                    

Hey

Mais uma semana. Ainda não sei como estou me sentindo, mas estou melhor do que quando cheguei aqui. "Aqui" ainda é a casa do Bruno, a qual parece estar se tornando minha casa também. Não queria deixar isso acontecer, mas me sinto tão bem aqui... Falo disso depois. Vamos, antes, aos acontecimentos da semana.

Fui àquela entrevista de emprego que comentei última vez que passei e, bem, acho que não vai dar certo. Querem que eu trabalhe de segunda a sábado, 44 horas por semana e vão me pagar menos do que a farmácia me pagava pra trabalhar 40. Falei que estava estudando algumas propostas e que ia ver o que dava mais certo pra mim, mas no dia seguinte já mandei um e-mail recusando a proposta. Esse pessoal deve achar que a gente é trouxa; não é possível. Colocam que o salário é a combinar pra propaganda ficar mais interessante, mas, na hora, pff... Chega a ser absurdo.

Depois, resolvi comprar um jornal pra dar uma olhada nos classificados. Ou eu estou ficando muito criterioso ou esses empregadores estão muito mão de vaca. Exigem mão de obra muito especializada e pagam muito pouco. Não reclamo de ter que trabalhar; de forma alguma, mas poxa! Quero um salário de acordo com as minhas qualificações! Não, eu não tenho qualificações ainda, né? Troca "minhas qualificações" por "exigências" que também dá certo. Depois fui ler a seção de "Ofereço" e também tem uma galera que parece estar bem desesperada... Tinha anúncio até de gente tirando xerox a 10 centavos. É mole uma dessas? Sem contar os anúncios sexuais. "Sou morena, alta, gostosa, quase mulher". Quase mulher? QUASE MULHER? Olha, não é nada contra quem é travesti (mas confesso que tenho um pouco de medo), mas a minha dúvida maior é: quem é que vai se interessar por um anúncio desses? E o pior é que, no fundo no fundo, eu acho que a resposta pra minha dúvida é: muita gente; afinal, se o anúncio tá ali, é porque tem consumidor pra isso, né? Tá vendo como esse mundo anda? Tá complicado. No final das contas acabei não encontrando nada de útil pra mim, mas dei umas risadas.

Falando em risada, o Otávio esteve aqui quarta-feira. Não que a vinda dele tenha sido engraçada, mas é que o Bruno me conta umas histórias engraçadas sobre ele. Ele veio conversar com o Bruno. Eu saí, é claro, pra deixar os dois a sós, mas depois o Bruno me contou. Dessa vez eles terminaram porque o Otávio traiu o Bruno adivinha com quem. Com o Felipe, irmão da Analice, e o Bruno não consegue engolir isso. Até onde eu sei, o Felipe é hetero, mas, porra loca do jeito que ele anda ultimamente, qualquer pacotinho de maconha deve convencê-lo a fazer qualquer coisa. Só não perguntei qual foi a circunstância da traição, mas deve ter sido algo nesse sentido. O Bruno permanece irredutível e ambos seguem solteiros.

Apesar de tudo, estou gostando muito de ficar aqui, como eu disse ali em cima. Tem um quartinho da bagunça aqui na casa. É um pouco menor que o quarto do Bruno, mas é um quarto ainda assim. Você acredita que ele limpou/esvaziou o quarto pra mim?, pra eu não continuar dormindo na sala? Achei isso tão legal da parte dele! Fiquei muito surpreso. Daí aproveitei e pedi pra minha mãe mandar entregar o resto das minhas coisas aqui. Mas não vamos estragar o assunto; falo disso depois. Agora tenho "meu" quarto aqui. Fiquei muito feliz. Ainda estou, na verdade. Preciso agradecer muito a Deus por ter o Bruno na minha vida, viu? Não fosse por ele, não sei onde eu estaria agora. E morar com ele é muito fácil. Ele não faz barulho, é muito discreto, não se importa de lavar a louça que eu esqueço na pia, sempre me pergunta se eu quero alguma coisa da padaria... E cozinha muito bem. Sexta ele fez um canelone de comer ajoelhado. Preciso aprender a receita.

Pois então, liguei pra minha mãe e pedi pra ela mandar as coisas. Ela disse que queria me ver; que estava preocupada e com saudade. Uma pena eu não poder dizer o mesmo. Isso também me deixa coisado, de certa forma. Meus sentimentos pela minha mãe mudaram drasticamente. Me sinto órfão de mãe viva. Mas como, apesar de não sentir compaixão pelos sentimentos dela, eu sei que eles existem, marquei com ela no shopping amanhã na hora do almoço. Desde o ocorrido eu não a vejo. E, francamente, não estou sentindo falta. Chega de falar dela já.

Agora que o quartinho é "meu" e minhas coisas estão todas comigo, me sinto melhor. Amanhã eu vou comprar outro jornal, ver se os anúncios mudaram e se tem alguma coisa que possa ser do meu interesse. Torça por mim. Qualquer novidade, eu volto. Boa noite.

Vincent (romance gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora