Entrada LXVII

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Boa noite, amiguinho!

Como vai? Acho que finalmente podemos dizer que está tudo bem, sem ressalvas, não? Esta deve ser a bonança que vem depois da tempestade, e olha que a tormenta foi severa, e dentre mortos e feridos, sobramos eu e você, meu amigo fiel, companheiro confessional das horas de alegria, de lamento, de descoberta, de raiva, de vitória, de muita coisa, vai.

Mas, bem, não vamos começar pelo final. Hoje é sábado; um sábado qualquer daqueles que eu estava esperando pra vir à praia com os meninos. Viemos e cá estamos. Bernardo nos trouxe pela manhã e nós quatro passamos o dia quase todo na areia, conversando, nadando, olhando para o horizonte, conjecturando, amando nossos diletos em silêncio, vendo o sol alaranjar o céu antes do anoitecer, trocando carícias discretas quando ninguém olhava... Como previsto, faltou só o Paulo.

Agora é madrugada; todos estão dormindo. Eu devia estar fazendo o mesmo, mas de repente tive um estalo e decidi passar por aqui antes de me recolher. É que eu andei pensando e cheguei a uma conclusão, uma que me fez sentir um frio na barriga e um nó na garganta, mas que, agora, depois de pensar muito mais, vejo que é certa. Ai ai... Não é fácil dizer isso, mas chegou a hora de a gente se despedir, caderno.

Eu vou explicar. Agora há pouco, antes de vir aqui escrever, eu fui passando os olhos pelas entradas anteriores e, nossa! Quanta coisa mudou!... Quando eu comecei a escrever, estava preocupado com a relação da minha mãe com o falecido; depois fui expulso de casa porque flagrei o desgraçado batendo nela; depois fui fazer programa e minha vida deu outra pirueta; daí tomei conhecimento de tanta coisa sobre mim mesmo... Descobri o Bruno, que foi um presente do Céu, o Felipe, o Bernardo, o Paulo, o Bartô... Tanta gente legal entrou na minha vida... E foi tudo tão rápido! Não faz um ano que isso tudo começou! Mas agora... agora sinto que minha vida enveredou por outro caminho, e você já me serviu seu propósito brilhantemente; agora acho que é hora de eu seguir sozinho a partir daqui. Lúcio está morto, Leonor está se cuidando, o canil acabou, Bruno e eu estamos mais ótimos do que nunca, os meninos idem... Você vê? Estão todos bem; daqui pra frente, eu já não tenho mais história pra contar. Do que é que eu vou falar contigo agora? Esses capítulos quase todos da minha vida já foram encerrados. E eu quero, daqui, começar outros capítulos mais felizes, que me deem a chance de compartilhar as coisas que eu sinto e penso e meus bons e maus momentos com pessoas reais, não com um diário virtual. Não me entenda mal, amigo: se você fosse de carne e osso, teria um altar lá no cantinho do meu quarto. É estranho isso, mas, poxa, eu te amo, caderno, e você foi parte importante da minha vida. Não fosse você, teria sido muito mais difícil atravessar isso tudo; embora você seja uma mera extensão do meu próprio pensamento, é como se houvesse, por dentro dessa tela, um ouvido paciente sempre pronto para ouvir o que quer que eu tenha a dizer...

Enfim, não vou me estender muito. Acho que, desta vez, nós vamos nos despedir pela última vez. Deixo dito meu mais profundo e sincero "muito obrigado" por todo esse tempo e por toda essa jornada pela qual você me acompanhou fielmente. Se um dia a gente se encontrar de novo, espero que seja em uma circunstância mais feliz... Agora vou ficando por aqui. Amanhã será um novo dia. De novo. Pra você, este será o último — mas não se preocupe: vou te manter bem guardado em algum cantinho do meu computador e uma cópia em algum cantinho seguro da internet, pra garantir sua existência pela eternidade, tudo bem? Então tá certo. Novamente: muito obrigado por tudo. Fique com Deus e um abraço apertado.

Do seu eterno amigo, 
Daniel Braga Vicentin.

2013/para sempre.

Vincent (romance gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora