Entrada XXXV

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E aí?

Pois bem, vamos aos acontecimentos dos últimos dias, em ordem cronológica. Senta aí e fica confortável que a história é boa, hehe.

Como você leu na minha última vinda aqui, eu estava naquele dilema entre mostrar ou não a conversa que eu tive com o Miguel pro Bruno. Depois de muito ponderar, achei que seria melhor contar, sim. O cara tinha o direito de saber, poxa. Chamei ele aqui no meu quarto e tentei preparar o território pra soltar a bomba. Fiquei me sentindo aquelas pessoas que têm que explicar pra criança órfã que o pai ou mãe dela morreu. Credo. Falei que precisava mostrar algo pra ele e que era sério; que eu tava preocupado com a reação dele, mas que achava que seria melhor assim... “Mostra logo, Daniel, não precisa ficar me preparando. O que é?”. Tá, né? Já que não precisava preparar... Abri o Face do Vincent e fui em mensagens. Cliquei na conversa com o Miguel e abri em tela grande. “Pode ler”, respondi. Me levantei pro Bruno se sentar e ler com cuidado e assim ele fez. Eu fiquei de pé, de braços cruzados, atrás dele, só olhando e esperando a reação. Ele mal piscava os olhos... Eu fiquei preocupado, cara. Ele deve ter lido e relido aquilo umas cinco vezes. Em silêncio. Depois olhou pra mim com uma cara que eu não consegui entender o que queria dizer. Fiquei meio sem jeito. Eu não disse nada; ele também não. Sentei na cama e fiquei esperando ele reagir. E nada. “Fala alguma coisa, cara...”, eu pedi; tava me incomodando aquele silêncio. Ele apoiou o queixo sobre uma mão e, sem me responder, continuou relendo a conversa. “Não tenho o que dizer... Tá tudo dito”, ele respondeu, finalmente. Não sei o que ele tava sentindo. Não sei se estava triste, se estava puto, se estava chateado... Não sei. “E o que você vai fazer quanto a isso?”, perguntei. Ele fechou a página e se levantou da cadeira. “Você vai à festa na casa da Analice hoje?”, ele perguntou. Eu ainda não sabia se ia ou não justamente por causa dele, mas respondi que sim, sem pensar muito. Ele meneou a cabeça e continuou: “Então me espera pra gente ir junto. Obrigado por ter me mostrado isso. Te amo”. Apertou meu ombro carinhosamente e saiu do quarto. O Bruno tem umas que eu não entendo. Eu esperava uma reação completamente diferente, e acabou que não teve reação nenhuma.

Bom, como não dá pra ficar tentando entender o Bruno, deixei pra lá. Minha parte, que era contar a verdade, eu fiz; ele que se virasse pra lidar com o resto. Voltei às minhas atividades normais, depois saí pra fazer um programa à tarde e, mais ou menos às oito da noite, voltei pra casa. O Bruno já estava se arrumando pra festa. “Eita! Pensei que você fosse ir mais tarde!”, eu disse. E pensei mesmo — apesar de que, não sei por que, quando tem festa na casa do Felipe, raramente o pessoal amanhece lá; vai dando duas, três da manhã, todo mundo vai embora. Acho que é pra evitar problemas com os vizinhos. “Pode tomar um banho, se trocar, não tô com pressa, não”, Bruno respondeu. E foi o que eu fiz. Tomei um banho rapidinho, coloquei uma roupa da hora, passei meu perfume e pronto. Já falei que decidi que vou manter meu cabelo assim como está agora? Gostei mesmo dele curto; é muito mais prático. “Você quer ir a pé ou de táxi?”, perguntei. A casa do Felipe não é longe daqui; dá menos de vinte minutos andando. “Não me importo de ir a pé”, ele respondeu. Eu também não me importava. Na verdade eu até achei bom que fosse assim, porque eu queria ficar um tempo sozinho com o Bruno e ver se ele tocava no assunto do Miguel de novo.

Saímos de casa e seguimos andando sem pressa. Conversamos pouco durante o trajeto, e em nenhum momento ele tocou no assunto. Eu estava me mordendo de curiosidade, mas não me senti no direito de perguntar diretamente sobre isso pra ele, afinal, por mais que eu não soubesse o que ele realmente estava sentindo, sei que a situação era bastante desagradável. De qualquer forma, eu sabia que ele faria alguma coisa, porque o Bruno é legal mas não deixa essas coisas passarem batido de jeito nenhum — basta lembrar que ele e o Otávio terminaram por causa de um beijo. E, no fundo, eu queria mais é que ele e o Miguel terminassem mesmo, que eu não gostei nada desse negócio de ter sido trocado.

Vincent (romance gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora