Entrada XLIII

1.6K 200 20
                                    

Fala, caderno!

Como você tá? Sentindo minha falta? Ou ainda não deu tempo? Acho que não, né? Tô vindo aqui é mais vezes do que de costume; cê deve estar enjoado de mim, isso sim. Estamos na metade da viagem. Quinto dia. Já estou me sentindo em casa. Atma é uma cidade muito legal! Ontem fomos andar à toa por aí (“andar” de carro) pra explorar os arredores e tem muita coisa bonita por aqui. Assim: não é uma metrópole que nem Taigo que tem tipo tudo que você quiser à disposição a qualquer hora do dia ou da noite, mas também não é cidadezinha de interior. É um lugar bom pra exatamente isso que estamos fazendo: vir passar uns dias de férias e depois voltar pra casa.

Fomos ao Parque das Dríades e adivinha o que tinha lá: um monte de ninfas. Claro que não. Tinha um riacho cheio de patos e uns pavões. Depois o parque virava uma mata e nós fomos andar por lá. Só mato, caderno. E árvores enormes. E uns macaquinhos muito bonitinhos também. E teve uma hora que o Paulo parou pra atender o telefone e a gente se perdeu, mas demorou um pouco pra gente se dar conta de que estava perdido. Aquela história de “Vão na frente que depois eu alcanço vocês”, sabe? Fomos eu e o Felipe na frente e o Bruno logo atrás, até ele ter a ideia de ir procurar o Paulo, que estava demorando demais, também dizendo que voltaria a nós assim que o encontrasse. Aí nos perdemos todos, menos eu e o Felipe, que estava comigo e, óbvio, se aproveitou da nossa solidão momentânea e abusou de mim — com o meu total e expresso consentimento. Dar uns amassos ao ar livre, assim, em contato com a natureza, foi uma experiência bastante... ecológica. Isso porque ele queria me chupar no meio das plantas. Vê se pode uma coisa dessas. Vê se eu posso negar um pedido desse pra alguém, especialmente pro Felipe. Tive que negar e ainda bem que o fiz, porque não demorou pra o Bruno e o Paulo nos encontrarem. Já pensou, que situação?

Fomos ao tal quiosque GLS hoje. Foi legal, cara. A garçonete que nos atendeu deu o maior mole pro Felipe e ele acabou ficando com ela antes de a gente vir embora — e nós temos dormido “juntos” esses dias todos. Lá no quiosque, conversei mais com o Paulo do que com o Felipe, que ficou de tititi com a menina. O Bruno tava meio distante, com os olhos pro mar na maior parte do tempo. O Paulo é estranho. Eu já falei aqui que ele é tipo ridículo de tão bonito, né? Meu, vieram dois caras (um deles veio só trazer o recado, na verdade) até a nossa mesa querendo puxar papo com ele e ele dispensou com a maior naturalidade. Paulo é um cara muito elegante, mas acho que tem situações em que não dá pra manter a elegância e não se sentir constrangido. Pois ele conseguiu dispensar os candidatos na finesse, como quem recusa a ajuda de um vendedor na loja de roupas. Fiquei ó: de sobrancelhas em pé. E eu sei que ele não namora, então não tem por que dispensar os caras — o que veio falar pessoalmente era um jovem coroa bem ajeitado. Só se ele tiver começado a ficar com o Bruno aqui e estiver sendo fiel, afinal, só os dois e Deus sabem o que é que acontece dentro daquele quarto quando as portas se fecham. Eu, francamente, acredito que não esteja rolando nada entre eles, não, mas também não duvido dessa possibilidade de forma alguma.

E tá tudo ótimo. Se pudesse, acho que eu ficaria aqui por mais de um, dois meses. Por mais que não tenha tanta coisa pra fazer, o lugar é muito gostoso de estar. Lembro que um dia eu comentei que precisava me sentar no topo de uma montanha pra avaliar o que tá acontecendo comigo ou com a minha vida... Não fui a nenhuma montanha, mas estive na areia da praia vazia e já tive tempo o bastante pra pensar em muitas coisas. Não cheguei a muitas conclusões, mas percebi que, de fato, o fator “não me importo” passou a desempenhar um papel muito maior na minha vida desde que comecei a fazer programa, e considero isso algo extraordinário, porque me importar com o meu eu em vez de com o eu que alguém possa fazer de mim me tornou muito mais livre e autoconsciente e eu não sei por que fiquei filosófico de um parágrafo pro outro. 

Acho que vou ficando por aqui. Vou jogar um pouco com o Felipe antes de dormir. Ainda não sei qual vai ser a programação de amanhã, mas eu volto com mais um boletim informativo daqui a uns dias (o próximo deve ser o último antes de a gente voltar). E acho que vou ser obrigado a conceder ao Felipe o boquete que tive que negar no parque, porque, bem, você sabe, basta uma fagulha pro negócio começar a pegar fogo entre nós, hehe. E você durma bem, tá? Bom descanso e a gente se fala logo logo. Boa noite!

Vincent (romance gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora