Capítulo XLIV

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Para: Pedro ♡

2 anos se passaram...

Não faço a mínima idéia de como começar a escrever esta carta, que para mim seria mais um desabafo sobre sentimentos que se acumularam dentro de mim e preferi deixa los quietinhos por um tempo, do que uma verdadeira carta.

Como posso descrever o que senti durante esses dois anos e ainda permanecer viva e não tentar o suicídio?

Seria egoísmo da minha parte não dizer que meu esposo Pedro, permaneceu do meu lado durante esses dias intermináveis e tentou suprir de alguma forma o vazio que nossa pequena Ana Clara nos deixou no dia 9 de junho de 1981.

Mesmo não conseguindo.

Só quem sente a verdadeira realidade da depressão, sabe que não é brincadeira como muitas pessoas acham ou pensam. Confesso que era uma dessas pessoas... Até eu sentir a vontade de sumir por um tempo, e acreditar que tudo aquilo que estava acontecendo era unicamente minha culpa.

Mesmo não sendo...

É estranho você ter a expectativa de algo e no final sair de uma forma que nem na suas maiores fantasias poderia imaginar.

Nunca iria imaginar...

Cada detalhe do enxoval fui eu que escolhi. A cor rosa e branco que iria definir o quarto da minha pequena, já estava sendo construído. Meus pais  me ajudando nas consultas médicas e financeiramente.

Todos te esperavam...

Quando finalmente senti as dores do parto. Logo senti uma agonia no peito que desde do início, achei ser ansiedade para te conhecer.

Mas não foi...

Respirei fundo. E naquela mesa de parto eu dei todas as minhas forças para te colocar no mundo...

Cada aperto de mão. Cada choro. Toda vez que sabia que iria perder minhas forças entrava em desespero... porque prolongava o tempo de te conhecer.

"Força mamãe, mais uma vez"

Eu ouvi tanto isso naquela madrugada, que minha cabeça ainda escuta as vozes apreensivas com a minha demora para dar a luz. Sentia que não iria conseguir...

Minhas forças estavam acabando. O quarto girava e sentia uma náusea que meu estômago revirava... Até que tudo ficou escuro...

Acreditava que assim que acordasse desse cansaço repentino que senti... estaria com você nos meus braços e o médico dizendo que tudo acabou bem.

Mas não aconteceu...

Quando abri os meus olhos, não desejava ouvir aquela notícia.... preferia ter morrido naquela mesa de parto junto com você minha pequena. Saber que a razão da minha vida não iria viver comigo... arrancou meu coração.

Não sei explicar a dor de uma mãe que perde o filho. É uma dor que não anestesia nunca. O tempo faz com que, a gente consiga viver sem querer cometer suicídio.

Mesmo que eu tenha tentado.

Pedro me encontrou jogada no chão do banheiro, com vários vidros de remédios espalhados ao meu redor. Sei que, naquele dia percebi que não estava apenas torturando a mim. Estava torturando a ele.

O cara que jurou me amar por toda a vida, diante de um altar. Que me fez e faz feliz todos os dias e que, estava do seu jeito tentando superar uma perda e não desejava outra.

Ver o seu rosto inchado e vermelho de tanto chorar. Seus cabelos bagunçados de uma tal maneira, como se ele tivesse descontado todo seu nervosismo neles. E mesmo assim, sorrir e dizer que me ama, que continua do meu lado.

Aquilo me fez perceber que você tinha ido minha pequena. E que se, eu tentasse me destruir iria prejudicar o papai. E seguir minha vida não significava que não te amava. Apenas, iria ter um anjo da guarda do meu lado.

E assim tive certeza...

Que Deus apenas estava começando seus planos nas nossas vidas... Do seu modo. Da sua maneira.

Estou trabalhando numa loja de roupas como atendente. E pedro está trabalhando como pedreiro. Depois de dois anos, estamos seguindo nossas vidas... a dor da perda continua aqui.

Mas, a vontade de ser mãe continua dentro do meu coração. Mesmo sendo, mamãe do meu anjo do céu.

Ana Clara. (09/06/1981)

Hoje você estaria completando dois aninhos... e mamãe não estaria derramando lágrimas que molham esse papel. Mas, Deus quis assim.... Então, apenas vivo com a dor e a fantasia de estar com você do meu lado.

Te amo filha ❤

                              Lúcia

09 de junho de 1983


Coração de Papel ( Revisado)Onde histórias criam vida. Descubra agora