Capítulo XIX

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Eu ainda estava tentando ver onde eu errei para Ana correr daquele jeito. Fui precipitado de tocar os seus lábios, mas não pude resistir aquele tom rosado tão bem desenhados nos traços finos da sua boca. Seus olhos castanhos brilhavam, percebia sua pupila dilatar devagar. Admiração talvez. Mesmo assim, ela fugiu desengonçada e tropeçando nos móveis. Foi a imagem mais bela que pude ver, depois dos olhos vermelhos de tanto chorar da minha mãe Lúcia quando me viu com o joelho ralado.

-Samuel, porque a mocinha foi embora sem se despedir de mim? -Perguntou minha avó, com uma  touca bege cobrindo os cabelos grisalhos. Pelo o vestido amarrotado, acabará de acordar.

-Estava tarde.

Amélia sorriu maliciosamente.

-Tentou agarrar a moça né garanhão?

Tossi disfarçando.

-Eu sou tímido.

Ela sentou do meu lado no sofá. E pegou o controle remoto da minha mão. No qual, começou a mudar os canais aleatoriamente.

-Timidez é só uma fachada para os homens pegaram as mulheres.

Olhei seu rosto enrugado, e os olhos negros perdidos na tela da TV. Acredito que sua mente vagava em algum canto do passado. Minha avó não gostava muito do meu pai Pedro. Os dois costumavam brigar muito. Desde da cor do céu até a forma que deveriam me educar. Sendo eu o único neto.

-Meu pai era tímido e nunca fez disso para pegar mulher.

Ela gargalhou.

-Seu pai tirou a virgindade da sua mãe no primeiro encontro.

Eu já sabia dessa história. Isso foi um dos fatores para minha avó odiar ele. Além claro, de ser apenas filho de um padeiro.

-Minha mãe quis vó.

-Lúcia era inocente.

Se entregar a alguém não significa perder sua inocência ou ser uma desviada. Meus pais se amaram desde do primeiro dia que os seus olhos se cruzaram. E diante disso, Pedro não mediu esforços para conquista la.

-Os dois ficaram casados 22 anos.

Amélia gritou e jogou o controle no chão. Ouvi apenas o barulho dele se espatifando no chão.

-CONTRA A MINHA VONTADE!

Ela deu de ombros e subiu as escadas. Deixando me sozinho na sala. Apenas tentando entender que ódio era esse, mesmo depois dele ter morrido.

                 †††††††††††††

-Samuel!!!!!!!!!!

Ouvia se os gritos histéricos do meu chefe ecoar pela a lanchonete. Aquele dia estava agitado demais para uma segunda qualquer. Muitos pedidos para atender, pessoas gargalhando e contando uma para as outras como foi o seu fim de semana. E aquela mesa. Bom, estava vazia até agora. Sentia meu coração apertar toda vez que via aquela cadeira sem sua figura pequena e delicada. Toda vez que fechava os olhos, o gosto dos seus lábios vinha na minha mente.

-SAMUEL!!!

Tentei sorrir para o senhor que tomava um copo de leite e comia biscoitos. E corri até os fundos da cozinha. Onde meu chefe batia o pé com força e resmungava algo que com certeza eu serei acusado.

-Sim senhor!

Seus olhos amarelos pousaram em mim. E antes que pudesse dizer alguma coisa, ele agarrou meu colarinho.

-Anda me roubando seu moleque? -Seu hálito insuportável soprava no meu rosto.

-Do que está falando?

Aquele asqueroso apertou mais ainda meu pescoço. Sentia meus pulmões ficarem pequenos e sem ar.

-Anda sumindo meu dinheiro...

Não conseguia falar nada. Estava sendo sufocado. E antes que eu pudesse desmaiar alí mesmo. Dei um chute na sua canela. No qual,  fez com que ele me jogasse no chão. Caí sobre o meu braço, e sentia leves pontadas no meu músculo.

-...está louco seu moleque?- Sua voz mostrava o quanto estava com raiva. Nem precisei ousar olhar nos seus olhos para ter essa certeza.

Me levantei meio sem jeito do chão sujo e frio daquela cozinha. Com uma mão segurava o braço que ainda doía levemente. Permaneci com a cabeça baixa. Sem ter a atitude de fitar seus olhos amarelos. Mas, sentia que ele me encarava.

-...você me rouba e ainda quer dar de machão?

Segurei todo o ar e disse:

-Não te roubei.

Ele gargalhou irônico. Andando em passos curtos e lentos pelo o piso marrom. Aquelas sandálias estilo novela bíblica da record, deixava amostra suas unhas doentes e grandes. Seu pé realmente era um grande queijo parmesão.

-Sumiu 220 reais do meu caixa, e não foi você?

Meu coração acelerou e senti meu corpo inteiro se arrepiar. Não tinha sido eu. Mas, sou o único que trabalha naquela merda de lanchonete, nem para pagar funcionários aquele duende com bafo de cebola serve.

-Sei que pode parecer mentira...

Ele andou lentamente até mim.

-...mas, não fui.

Antes que pudesse reagir, recebi um soco no estômago. Todo o ar fugiu dos meus pulmões e caí no chão. Em seguida, recebi chutes na costela e pontapés. Meu corpo inteiro começou a doer e minha visão ficou turva. Tentava reagir aquela agressão só que, estava paralisado com a imensa dor que consumia meus músculos. Fechei meus olhos e comecei a rezar. Lágrimas rolavam queimando no meu rosto. Gritava de dor. E ninguém naquela lanchonete me ouvia.

-Você vai aprender a ser homem!

Ouvia sua voz bem longe. Como se estivesse perdendo meus sentidos. Minhas pálpebras pesavam uma tonelada. Minha boca seca e os olhos ardendo. Sentia cada chute perfurar minha pele. Tentava pedir ajudar. Mas, as palavras saíam como um balbuciou.
 
Antes que desmaiasse, ouvi uma voz doce e serena invadir a cozinha.

-Está louco?!

Tentei enxergar quem era. Porém, meu corpo adormeceu e tudo ficou escuro...

Coração de Papel ( Revisado)Onde histórias criam vida. Descubra agora