Capítulo Cinco

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E o sucesso de 1984, fica por conta do gato, Bruce Springsteen.

1984

Agora morávamos na mesma cidade que minha avó Carmen, minha tia Carla e o avô postiço, Lauro.

Passávamos por uma grande dificuldade financeira. Meu pai sem trabalho, minha mãe continuou na antiga cidade trabalhando como professora, pois era funcionária do estado e não havia como ser transferida.

Alugamos uma casa e compramos móveis novos; porém, meus pais não puderam pagar e tudo foi devolvido à loja. Ficamos com a casa quase vazia.

Certo dia, não tínhamos nada o que comer, então uma moça que estava lá em casa fez fogo lá no quintal, colocou uma frigideira em cima de tijolos, pôs gordura e mexeu com farinha de mandioca. Foi o que comemos naquele dia. A essas alturas, meu terceiro irmão foi parar na casa da minha avó, devido à necessidade que estávamos passando. Mas, como ele era orgulhoso e meu avô postiço também, não se acertaram.

Por volta dessa época, minha tia Graça e o marido dela passavam
por muitas dificuldades e tiveram que deixar meus dois primos na casa da minha avó Carmen. Mas, eu também passava muito tempo por lá.

Matricularam-me num bom colégio, mas me senti um peixinho fora d'água no início. Embora minha prima, filha da tia Eron, estudasse no mesmo colégio, ela não me dava a mínima.

Fui matriculada no segundo ano do Propedêutico, que era o mesmo curso que eu fazia no ano anterior. Nos primeiros dias, eu ia de muleta, pois a perna ainda estava engessada.

Em março, depois de dois meses, tirei o gesso. Foi um alívio, pois até àquelas alturas, eu ia e voltava de van do colégio.

Com o tempo, eu fiz amizade com uma turminha de meninas. Principalmente com a Eliane, uma loira muito estudiosa e gente fina. Éramos muito apegadas. Nosso grupinho sempre ia embora junto depois da aula, mas o mais importante é que sempre estávamos estudando e fazendo trabalhos juntas.

Uma vez que eu agora morava em uma cidade e estudava em um colégio com pessoas mais cultas, não havia aquele bullying que eu sofria no primeiro ano, no que era chamado de segundo grau, à época; entretanto, deparei-me com outro tipo de preconceito velado, mas tão cruel quanto: o preconceito contra a pobreza. Não sei se os colegas eram racistas, pois não havia afrodescendentes no colégio, apenas nipônicos. E, aparentemente,  a discriminação era com quem não tinha posses, não frequentava clubes, nem matinês e, inclusive, não tinha corpo de modelo.

Fiquei chocada com essas constatações, mas a única coisa que eu poderia fazer era me dedicar aos estudos. E foi o que eu fiz, no intuito de sair daquela situação penosa.

Certo dia, depois de uma prova de Matemática, no início do ano, a professora Cleir disse:

____ Quero parabenizar a Ana Clara e a Isadora por tirarem dez na prova.

Foi aquele alvoroço na sala e minha prima ficou abismada, porque quando eu morei com eles, aos oito anos, eu tirava notas baixas. Mas, como ficamos separadas aqueles anos todos, ela não tinha ideia como eu era estudiosa.

Aquele foi o primeiro de uma coleção de notas dez que eu costumava tirar em Matemática, Geografia, História e Física. Em Biologia, minha média era nove ou nove e meio. Mas não ia muito bem em Química, pois ficava em torno de sete e meio ou oito. Em Língua Portuguesa, minha média era oito e meio. Por mais que me esforçasse, minha professora era muito rigorosa; no entanto, vivia me elogiando, pois sempre pegava meu caderno para corrigir os exercícios com a turma oralmente e minhas tarefas eram impecáveis. Literatura, eu amava. Devorava os clássicos; por exemplo, José de Alencar. Consequentemente, no terceiro bimestre eu já havia sido aprovada.

IsadoraOnde histórias criam vida. Descubra agora