Capítulo Quarenta e Nove

4 1 0
                                    

Eu ofegava enquanto subia os degraus, chocada que eu tivesse força suficiente para abrir as portas do Santa Rita. Quando se fecharam com um baque surdo, eu desmoronei.

Enquanto a pedra fria queimava perfeitamente fria contra minha bochecha febril, eu ainda me sentiria mais segura mais longe da entrada. Arrastei-me para cima e manquei pelo corredor central, o que parecia não ter fim, e me joguei em um banco da frente.

Deitada de costas, eu tive uma visão impressionante. Os vitrais brilhavam um arco-íris de manchas sobre o granito, mármore e madeira, enquanto a luz solar passava através das grandes janelas. Gravuras ornamentadas enfeitavam as paredes. Formas celestes pintadas fluíam através do teto abobadado me fechando como uma tumba. Grandioso com elegância suave.

Até as portas colossais da frente se abrirem como se fossem palitos. Eu me atirei para cima. E meu estômago caiu.

Com músculos se contorcendo como se um zilhão de serpentes estivessem se aninhando sob sua pele grossa e malhada, o Kalifera se levantou. Como conseguiu entrar dentro da igreja? Em terreno santo?

Meu corpo se moveu antes que meu cérebro desse a ordem e corri com passos silenciosos até parar por trás do enorme altar de mármore. Respiração irregular, eu deslizei para o canto e arrisquei uma espiada. Ainda estava na frente, mas na igreja. Tanto para o meu santuário.

Tentei recuperar o fôlego, mas entre a adrenalina, a exaustão e a tentativa de sufocar a necessidade de vomitar contra o fedor de carne queimada saindo do Kalifera, era uma batalha perdida. Olhei novamente. Manchas de preto, onde a carne estava enrolada como um papel carbonizado me fizeram pensar em um dálmata demoníaco. Ayden tinha dado vários golpes. Mas não o suficiente.

Ele fungou e apalpou o chão. O demônio curvou seu lábio superior como se cheirasse algo repulsivo, cintilando seus dentes pontudos. Sua perna de trás bateu em um banco e seu pé atacou. Madeira quebrou. Um grito estridente que soava muito parecido com Nex riscou de sua garganta, fazendo com que a parte de trás do meu pescoço quase rastejasse até meu crânio. Eu estava correndo para uma porta atrás do altar. Garras arranhando pelo chão me disseram que eu tinha sido vista.

Eu bati em uma parede, mas usei a batida para me impulsionar para a frente. O chão tremeu. Eu pulei para baixo em uma escada, passei voando pelos degraus, mas pousei em uma borda em espiral no fundo das escadas. Ruídos altos de coisas quebrando me fizeram levantar. Eu encontrei uma cozinha. O cômodo brilhava e cheirava a pinho, as bancadas claras, exceto por um pote de pimenta da Torre Eiffel e saleiro.

Enfiei o saleiro no meu bolso e abri as portas do armário com um estrondo. Ouvindo a aproximação do Kalifera, - furtivo como uma manada de rinocerontes - eu varri meus braços nos armários, esvaziando o conteúdo no chão em busca de armas. Eu estava erguendo a tampa de um recipiente de sal de tamanho industrial, quando a parede tremeu. Algo brilhou no canto do meu olho. Um pé com garras passou pela porta e me jogou pelo ar. Minha parte inferior do corpo bateu. Minha cabeça chicoteou contra um armário. Eu caí no chão lutando contra uma vertigem querendo aparecer.

O Kalifera tentou se espremer através da entrada, mas a curva letal de suas omoplatas salientes foi pega no marco da porta. Ele estendeu suas patas dianteiras, mas o último lance me bateu fora do alcance. Eu não sabia onde o pote de sal tinha pousado, mas peguei o saleiro do bolso e tirei a tampa. Algo brilhou na minha visão periférica.

Uma massa de potes e panelas estavam espalhados no chão. A maioria era de aço inoxidável, mas uma panela grande parecia familiar. As mulheres Lahey todas tinham pelo menos uma em suas cozinhas. Uma frigideira de ferro fundido, preta pelo uso. Ferro. Uma arma.

Muito pesada para o meu estado debilitado, eu deixei cair a panela na minha primeira tentativa. Minha cabeça latejava. Minha visão estava turva. E o meu cérebro, que era de ação rápida antes, agora estava em um curto-circuito de pensamentos com impulso físico, e não podia compreender o conceito emocionante.

Sob o ataque, a parede tremeu e fez várias rachaduras que permitiram o Kalifera tropeçar um passo dentro. Eu cerrei os dentes com força, meu esforço e vontade de pegar a frigideira e lança-la com força me fazendo ficar focada.

O acertei com um ruidoso thwang alto e chiado. O cheiro grosso de carne fresca assada veio do ar. Esta panela foi feita para cozinhar, afinal de contas. O monstro gritou. Todos os quatro olhos brilhavam maníacos. As fendas gravadas no batente da porta, gemeram ampliando, e o demônio subiu pela parede em ruínas.

Eu gritei. Meu braço lançou amplamente. Sal voou pelo ar do saleiro aberto na minha mão. Outro silvo lancinante ecoou quando o mineral fez contato com a pele sobrenatural. Eu coloquei a mão no meu rosto, o cheiro de queimado muito forte, e observei a besta se contorcer selvagemente em agonia, mas longe de estar morto, ele se lançou para mim.

Segurei a panela de duas toneladas com as duas mãos e esperei, pronta para infligir dor antes de morrer, mas antes de dentes e garras me atingirem, um peso invisível pressionou de todos os lados, ameaçando me esmagar como uma lata de refrigerante. Na beira de um desmaio por falta de oxigênio, o peso se aliviou, se movendo em volta para bater nas costas do demônio. No momento em que isso rolou, eu comecei a irradiar e deixei cair a panela pesada com um grito de dor, a minha pele vermelha onde havia tocado o agora quente metal.

O Kalifera rosnou um ilegível Divinicus, empinou-se, patas dianteiras girando, pronto para enterrar suas garras em minha carne. Com um grunhido de surpresa, ele congelou.

O monstro e eu olhamos para a flecha translucida brilhante saindo de seu peito. Em uma rápida sucessão, mais três penetraram seu corpo. Todas reunidas no centro. As flechas translúcidas lampejaram brilhantes antes de se dissiparem em tufos nebulosos de fumaça branca. As flechas se foram, e eu temia um novo ataque, mas um grito fraco cuspiu de sua boca e a besta explodiu em estilhaços de névoa negra que giraram em uma nuvem de energia escura e fizeram um redemoinho no chão.

Na porta, com seu habitual casaco esporte, colete, gravata e cabelo neon, Logan estava sombrio e rígido, os olhos de alabastro brilhando. Preparado em uma posição de caçador, ele tinha um arco branco translúcido, estabilizado e pronto para atacar com outra flecha cintilante voltada diretamente para mim.

***

Logan? De todos os meninos, eu não achava que seria o doce, tímido, e quieto Logan que acabaria comigo. Mas hoje ele parecia diferente. Hoje ele parecia selvagem, cruel. E mortal. Algo quebrou dentro de mim e uma risada cansada escapou dos meus lábios. Eu queria lutar. Eu até mesmo peguei uma frigideira, mas a visão dele era uma estaca em meu coração, drenando a minha força de vontade. O que havia em mim que transformava as pessoas que eu confiava em cruéis e brutais?

Lágrimas brotaram, escorregando pelo meu rosto, salgadas. A frigideira escorregou dos meus dedos, e caiu com um forte estrondo no chão.

— Só... faça. Me mate. Acabe logo com isso. — A forte tristeza me fez cair de joelhos.

Os ângulos rígidos no rosto de Logan suavizaram. Seus olhos brilharam de volta à sua cor normal verde esmeralda. Sua expressão se irritou com a confusão, para então se transformar em horror. A arma evaporou, a brisa fresca que vibrou contra a minha pele pegajosa era a única prova de sua existência.

— Aurora — a sua voz, quase um sussurro, tremeu com a emoção.

Eu compreendi que eu ia desmaiar uma fração de segundo antes de acontecer.

#1 - Demons At Deadnight (Divinicus Nex Chronicles) Onde histórias criam vida. Descubra agora