Flocos de neve escorregadios

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India

Ouvia repetidamente o mesmo álbum de MaydayParade, enquanto folheava a revista desinteressante escondida no meu quarto. Para além de dicas sobre como alcançar a maquilhagem perfeita e de ideias inovadoras para encontros românticos, não havia nada que valesse a pena continuar a ler. Revirei os olhos perante a ideia de "encontro romântico" e do quão distante isso me parecia. Por detrás das cortinas, tive um vislumbre de Michael a entrar no seu carro, seguindo viagem. Bufei por quase ter aberto a janela e gritar pelo seu nome.

O Natal estava a apenas uns dias de distância. Alegrava-me sempre que encontrava a árvore cintilante com todos os presentes embrulhados à sua volta. Ri com a ideia de os meus irmãos tentarem adivinhar o que estaria por debaixo do papel de embrulho de cada um, o que provocava subtis ataques nervosos à nossa mãe por quase estragarem a surpresa. Aquele Natal tinha quase tudo para ser perfeito. Tinha neve, tinha frio e tinha chocolate quente todas as tardes. A única coisa em falta — e de longe a menos importante — era ter Michael de volta. Por muito que fosse uma contradição essa minha atitude, as saudades eram mais fortes do que o meu orgulho. Ao fim de todos os dias em que o nosso contacto não passava de simples trocas de olhares no meio da rua, o egoísmo cresceu em mim e a fazer-me querer implorar-lhe para que voltasse para mim. Já tinha estado mais longe de quebrar a distância entre nós, várias foram as tentativas de pegar no telemóvel e ouvir a sua voz, mas contive-me.

— Onde vais? — perguntou o meu pai ao ver-me vestir o casaco.

— Pensei em dar um pequeno passeio.

— Não te demores muito. Dentro de pouco teremos um nevão.

Tinha nevado durante a noite inteira. Não havia nada melhor do que o cheiro a neve pela manhã. Pensei que sentir-me-ia mais perto de Michael se visitasse o pasto com o carvalho, por isso, comprei um chá antes de seguir o caminho até lá. Queria lá passar o resto do dia, se a neve me deixasse.

— Um chá de camomila, por favor — pedi a Jeff, o senhor ao balcão que resmungava por tudo e por nada.

Reparei em todos os casais e grupos de amigos que lá estavam. Acolhidos pelo calor do café, conversavam ou trocavam pequenos beijos. Corei pela imagem. Sabia que poderia ser eu e ele numa daquelas mesas, se não fosse por mim.

— Para mim um café, por favor.

O espanto foi imenso quando reparei quem estava ao meu lado. Quais eram as chances de nos encontrarmos naquele exato momento? Ele arqueou as sobrancelhas quando reparou em mim.

— Oh, India!

— Calum! Também costumas estar por estes lados da cidade?

— Sim, por acaso moro na rua mais abaixo — apontou.

— Oh, que bom! Eu moro no bairro ali a diante.

— Então somos quase vizinhos de ruas — Calum gracejou. — Ainda estou a ambientar-me à cidade, não sei bem como ocupar o tempo.

— Por acaso estava a caminho de um passeio. Podes acompanhar-me, se quiseres.

— Isso seria ótimo!

Calum era um rapaz alto, moreno, de cabelos escuros encaracolados. Tinha uns olhos bondosos e um sorriso brilhante, bem como um sotaque particularmente diferente. Lembrou-me o do Michael, pelo que decidi começar por lhe perguntar:

— Como vieste parar a Fall River?

— É uma longa história, na verdade — confessou. — Digamos que está a ser um novo capítulo para mim. Decidi vir viver com a minha irmã.

SICK. - 3 Caminhos CruzadosOnde histórias criam vida. Descubra agora