Crueldade

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Michael

Contrariar a vontade de a procurar pelo meio do tumulto da hora de almoço era uma tarefa difícil. Indisposta, India decidira que era melhor voltar para casa e descansar. Era estranho estar na companhia dos seus amigos sem tê-la ao meu lado a navegar num mundo que era só dela.

— Não achas, Michael? — Suspirei por ter perdido o fio à meada da conversa. — Joan, a professora de Física, já devia estar reformada.

— Sim, claramente — concordei.

— Vês? Não sou o único que pensa assim. — O seu dedo indicador ergueu-se para Ella. — Aquela mulher só causa danos emocionais a todos os seus alunos.

Tentei concentrar-me mais um pouco na conversa, mas não adiantava forçá-lo. Desculpei-me com uma ida rápida à casa-de-banho. Não sabia se era normal sentir tanto desalento por não estar junto dela, talvez estivesse tão habituado à sua companhia que uma simples tarde longe de si era o equivalente a um método de tortura meticulosamente concebido. Torci o nariz ao reparar que estavam outras pessoas na casa-de-banho que falavam alto e a bom som entre si, principalmente sobre raparigas e sobre todas as diferentes posições em que já as tinham visto. Tentei não prestar atenção a uma conversa tão baixa e pobre quanto aquela, mas foi quando o seu nome foi dito que não me contive. Surpreso, os meus olhos migraram para o grupo.

— Juro-te — um deles continuou a falar sob uma gargalhada incontrolável e engoli em seco pelo que estava prestes a dizer. — Quando o Hood me contou o que aconteceu na festa, nem quis acreditar.

— Sempre soube que debaixo daquela imagem de rapaz certinho estava uma fera pronta para ser solta! Só não entendo o porquê de escolher alguém tão enfadonho como a McConnel...

— Ei! — Aproximei-me. — Estão a falar do Calum? Calum Hood?

— Clifford, não ouviste? — um dos rapazes assentiu ainda com um riso perseverante. — Foi na última festa do Jack. Temos até fotos, se quiseres ver.

Um calor inexplicável subiu-me à cabeça.

O Calum? A India? Fotos?

Não pude acreditar. A minha respiração descontrolada tornou difícil formar qualquer pergunta ou até condená-los por fazerem parte de um rumor tão doentio quanto aquele, então fui embora. Apesar de todos os convites de Jack para ir às suas festas, segui o conselho de Ashton e nunca lá meti os pés. Eram sempre deploráveis e nunca valiam a pena. Não havia nada de inesperado sobre Calum ir a uma dessas festas, mas não fazia ideia de como é que um rumor como aquele surgira. Era imperativo vê-la. Apressei-me até ao refeitório e, como um relâmpago, agarrei nos meus pertences, pronto a ir.

— Michael! — Merida chamou-me, mas não havia tempo para lhe explicar o que se tinha passado. — Michael, o que se passa?

Tudo aos meus olhos estava tingido num tom vivo de escarlate. O meu subconsciente criativo poluía-me com imagens perturbantes de India nas mãos de alguém como Calum. Desconfiava da veracidade de algo tão obsceno. Aliás, sabia que era mentira, só podia ser. Ela não teria voltado para aquele traste depois do que tinha feito. Era impensável. Ainda assim, precisava de vê-la. Excedi a velocidade por entre as estradas com pouco trânsito, algo que imediatamente agradeci e, ao avistar o bairro familiar, estacionei em frente a sua casa.

— Um minuto! — a sua voz ressoou ao ouvir-me bater à porta com tanta intensidade que, quando me viu, mirou-me confusa. — Michael? Está tudo bem?

Rompi pela sua casa adentro seguido por ela que, mesmo que me perguntasse mil vezes a mesma coisa, não consegui pôr em palavras o que tinha acabado de ouvir. Estava perdido de coragem e de uma boa escolha de palavras.

SICK. - 3 Caminhos CruzadosOnde histórias criam vida. Descubra agora