Calum
Tapei a panela fumegante ao ouvir Maggie chegar a casa. Dei os últimos retoques na mesa posta, deitei um pouco da bebida em dois copos e fui ao seu encontro. Surpreendida, puxou-me para um beijo de boas-vindas.
— Vinho numa taça, cheiro a risotto e um pano sobre o teu ombro... — ela brincou. Levantou um dedo pensativo ao andar pela cozinha. — O que é que tu fizeste, Calum?
— Eu? Porque haveria de ter feito alguma coisa? — Puxei-a para outro beijo demorado. — Tenho estado tão ausente ultimamente e quis fazer-te uma surpresa.
— Pois é. — Margaret suspirou. Sentou-se à mesa. — Hoje não foste ao hospital?
— Fui ontem. — Servi um pouco da comida no seu prato.
— E anteontem também... — salientou. — Mas houve alguma novidade ou ela continua inconsciente?
Deitei outra porção no meu prato. Novidades não havia absolutamente nada para lhe contar, a não ser a presença constante de Michael ao seu lado. Sentei-me, levei uma garfada à boca, mas sempre com os dois olhos rasgados de Maggie em cima de mim.
— Não há novidades, pelo menos até agora.
— E achas que vai haver? — Ao reparar na minha hesitação, desconversou. — Não quero insinuar nada, mas tendo em conta o tempo que ela está assim...
— Bom, os médicos dizem que as chances são de 50/50. — Dei um gole na bebida fresca. — No entanto, mesmo que ela acorde, o seu tempo connosco não vai ser muito longo...
Não sabia ao certo como me sentir por dizer aquelas palavras em voz alta. Era uma verdade universal entre todos os envolvidos na situação, ainda que ninguém o dissesse; eu sabia-o bem, mas não o dizia até então. Senti uma tristeza misturada com um vazio difícil de ser explicado.
— Não quero falar mais sobre isto — cortei a conversa. — Esta noite é nossa e só nossa. Vamos aproveitá-la. — Maggie anuiu, mas sem o sorriso divertido que esperei encontrar. — Não gostas do jantar?
— Não, o jantar está fantástico. — Pousou os talheres. — Só não sei como me sentir com toda esta história da India. Claro, eu e tu agimos mal, mas eu nunca desejei que ela tivesse este fim; nem sabia que ela estava doente.
A dona dos cabelos curtos evitou o contacto visual. Distraía-se com as pontas do guardanapo, dobrando-as. Estiquei-lhe a mão.
— Eu também não. — Entrelacei os nossos dedos. — Aprendi que não é possível mudar o passado, mas é sempre possível alterar as condições do presente.
A noite foi passada com dois copos sempre cheios, música a tocar alto num telemóvel e dois corpos suados, perdidos. Ela dormia junto de mim, a cabeça sempre na cova do pescoço, e o braço ao longo da minha barriga. Quis pregar o olho naquela noite, confortar-me na companhia de quem eu amava, mas houve algo que não o permitiu. Na altura não soube exatamente o que era, mas contentei-me com o ingénuo pensamento de que seria tão bom se ela estivesse tão confortável quanto eu, aninhada debaixo do cobertor e rodeada de amor.
Com amor,
MukeCakesauce
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SICK. - 3 Caminhos Cruzados
Fanfic| História premiada por um Watty 2015 na categoria de Melhor Fanfiction | Primeiro volume da trilogia SICK. Na cidade chuvosa e melancólica de Fall River, três adolescentes estão prestes a ter suas vidas entrelaçadas de maneiras inesperadas. India...