Bela efemeridade

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Calum

Os balneários eram um lugar estranho. Sempre iluminados pelas detestáveis luzes fluorescentes que tremiam pontualmente e, para além disso, estavam sempre cheios de corpos suados que infestavam o ar com uma mistura desagradável entre suor e desodorizantes masculinos baratos. Achava igualmente estranho o facto de todos tomarmos banho sem nunca atribuir grande importância à nudez de ninguém, quase como se fingíssemos não reparar nos motivos de vergonha e de baixa-autoestima de muitos ou, em contrapartida, naquilo de que outros mais se orgulhavam. Simplesmente bizarro. Suspirei com a água fria do chuveiro enferrujado no meu corpo quente. Desejei por algo mais confortável; isso e privacidade.

— Foi um bom treino, malta! — uma voz já familiar soou no meio do grande frenesim já instalado. — Na próxima semana, quando o Clifford voltar, temos de treinar um pouco mais o terceiro plano estratégico. Iria detestar se perdêssemos para a outra equipa.

Tal como já era costume, Jack, o capitão de equipa, tentava inspirar-nos com um pobre discurso dispensável sobre o quão fantástica e incomparável era a nossa triste e vergonhosa equipa. Seria impossível pôr em palavras tudo o que me irritava sobre Jack sendo, por isso, suficiente dizer que ele era o perfeito correspondente ao estereótipo de um atleta perfeito aos olhos de todos. Apesar da sua popularidade inquestionável no recinto, era evidente aos meus olhos que, por detrás de todos aqueles músculos e vida social invejáveis, vivia um ser tão hipócrita e oco. Assim sendo, o meu desinteresse em ouvi-lo depois de um treino demorado não era novidade. Enrolei a pequena toalha na minha cintura, pronto para sair dali o mais rápido possível, mas ele tornou a ser inconveniente.

— Hey, Hood! — A sua mão calosa pousou sobre o meu ombro, obrigando-me a encará-lo, ainda que contra a minha vontade. — Bom trabalho hoje. Se continuares assim, temo que o treinador pondere em dar-te a minha posição.

Denotei o sarcasmo combinado com uma insegurança inesperada escondidos nas suas palavras que, acompanhadas pelo seu riso rouco e exageradamente grave, poderiam ter passado despercebidos. Inspirei fundo, e sem saber ao certo o que dizer ou o que fazer, limitei-me a oferecer um simples sorriso. Talvez isso o contentasse.

— Não precisas de te preocupar, Jack. Não tenho qualquer interesse em ser capitão.

— Oh, — começou por dizer, ajeitando a sua toalha. — Interesse nunca há no início, mas até é engraçado pensares que a tua opinião não mudará.

Dei de ombros, pronto a procurar pelo meu saco com roupa fresca e pelo meu telemóvel, mas suspirei por ouvir os seus chinelos guinchar pelo piso molhado até mim.

— Ouve, meu. Desde que cá estás na equipa nunca foste a uma das nossas festas — constatou com um irritante sorriso perfeitamente esbranquiçado, tinha o meu saco na sua posse. — Deverias vir na próxima vez, quem sabe conheces algumas raparigas! Pode ser que te ajude a soltar um pouco mais, pareces sempre tão tenso.

Revirei os olhos pela sua insistência. Tenso? Talvez estivesse tenso porque não queria estar ali? Decidi ignorar a sua tentativa em personificar Dr. Phill McGraw. Sabia exatamente que tipo de festas eram aquelas e seria mentira se dissesse que nunca me ocorreu em dar uma oportunidade, mas ainda havia um pouco daquele que era o bom Calum no meu âmago e eu queria agarrar-me a ele por mais um pouco.

— Vou pensar sobre o assunto — menti, recuperando finalmente as minhas roupas. À minha frente estava um rapaz convencido que, ainda com o mesmo sorriso ofuscante, disse:

— Na próxima sexta-feira, às 21h, na minha casa. Ok?

Estar numa equipa de desporto era uma das condições que me tinha sido imposta quando decidi mudar-me e viver com a minha irmã. Quando vivia com os meus pais, a minha terapeuta dizia-me que "era importante criar hábitos saudáveis" e, segundo as suas palavras, uma atividade em grupo

SICK. - 3 Caminhos CruzadosOnde histórias criam vida. Descubra agora