Bilhetes anónimos

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India

— India, vamos chegar tarde! — Ella tentou coordenar os seus passos apressados com a quantidade de sacos nos seus braços.

— Podes ir primeiro do que eu, ainda preciso de ir ao cacifo.

Íamos passar a noite em casa de Merida, um bom hábito nosso, então queríamos apanhar o autocarro até sua casa. No entanto, tinha deixado a minha carteira atrás. Quando a porta metálica se destrancou soprei por ver um papel cair aos meus pés. Preciso mesmo de organizá-lo, pensei, mas estranhei a caligrafia nele escrita.

"Olá, India."

Vinquei o sobrolho. Procurei no seu verso por alguma continuação, mas estava vazio. Também não tinha qualquer assinatura.

Que estranho.

Ao ver que Ella me ligava, despachei-me em agarrar na carteira e juntar-me a si lá fora, mas a sua expressão descontente logo fez-me perceber que o autocarro já havia partido.

— Tenta falar com o Ashton. Talvez pode dar-nos boleia?

Como era expectável, Ashton estava disponível, sobretudo quando Ella lhe procurava. Ambos falavam num tom animado sobre algo que não entendia bem, a minha mente levava-me de volta para o pequeno bilhete arrumado no bolso. Voltei a ler as palavras cravadas no papel amarrotado à espera que pudesse reconhecer a caligrafia, mas sem sucesso algum.

— Meninas! — A rapariga de cabelos encaracolados sorriu pela nossa presença. Apertou-nos num grande abraço. — Já pensava que não vinham.

— Culpa a India. Como sempre, só se lembrou da carteira no último minuto — Ella rezingou.

— Até magoa saber que falavas muito mais alegremente com o Ashton há uns minutos. — Provoquei-a, recebendo um olhar

Merida guiou-nos pelos corredores conhecidos da sua casa. Fui afogada pelo seu quarto exageradamente rosa.

— A minha mãe deixou estes queques para nós.

— Oh, — Ella gracejou. — A tua mãe é um anjo.

Os pais de Merida tinham saído da cidade e nessas situações Merida convidava-nos para fazer aquilo que sabíamos de melhor: conversar e comer. Toda a tarde tinha sido passada em conversa sobre os últimos mexericos da escola e, depois de quatro pizzas encomendadas e de dois pratos de comida chinesa devorados, deitámo-nos na cama. No fundo tocava um dos seus álbuns favoritos dos N'Sync e todas as outras evidências do seu pobre gosto musical.

— Não sei como ele se sente em relação a mim... — Ella balbuciou. — Há dias em que me liga e falamos ao telemóvel durante horas, outros dias parece que nem me vê.

— Ugh! — Merida revirou os olhos. Pincelou o verniz nas suas unhas. — Porque é que todos os homens são iguais? Oh, espera. Nem todos são assim. Não é, India?

— Meninas... — Soltei um riso nervoso pelos olhares intensos. — O que posso dizer para além de ter tido sorte?

— Sorte! É raro encontrar um rapaz com todas as qualidades do Michael. — Ella salientou.

— Inteligente? Sociável? — Merida brincou.

— Tem interesses próprios? Dedicado? — Ella rematou e escondi a minha vergonha atrás da almofada. — Ainda bem que aceitaste estar com ele, serias parva se não o fizesses.

— Eu tenho algo para vos mostrar, por acaso. Alguma de vocês reconhece esta caligrafia? — Ambas analisaram cada letra no papel atentamente, mas logo negaram. — Estava no meu cacifo, mas não tenho ideia quem poderá ter sido.

— De certeza que é alguma brincadeira, não ligues.

Sem atribuir muita importância ao assunto, ambas voltaram ao tema inicial da conversa. Imitei-as, não era necessário analisar ao pormenor algo tão insignificante como aquilo. Provavelmente tinha sido só uma brincadeira de alguém.

Sim, é o mais certo.

Com amor,

MukeCakesauce

SICK. - 3 Caminhos CruzadosOnde histórias criam vida. Descubra agora