India
Fascinava-me como o tempo voava. Recordava os tempos em que os dias eram tão longos quanto a maior fila para o almoço no refeitório e agora eram tão curtos que, com o pestanejar, desapareciam. Finalmente, era dezembro e eu estava feliz pelas ruas cintilantes e pelos pinheiros em todas as montras. Desviei as cortinas para ver que o sol ainda não tinha nascido e que também não havia qualquer sinal de pequenos flocos de neve a cair graciosamente. Por entre as ruas escuras procurei pelo Michael, talvez tivesse a sorte de o ver logo pela manhã, a ler a correspondência, ainda de pijama. Suspirei por já não o ver há tanto tempo.
Só eu era a culpada pelo estado das coisas entre nós.
— O que se passa contigo? Estás tão calado.Notei quando regressámos a casa. Eu estava cansada, mas feliz pela noite que passámos às estrelas. Estava grata por Michael se ter aberto comigo e contado mais sobre a sua infância. Contudo, ele parecia mais tenso e calado do que o seu habitual. É claro que comecei a culpar-me pela sua súbita mudança de humor, por isso, tornei a insistir:
— Eu fiz alguma coisa? Porque estás assim?
Michael manteve os olhos postos no chão, quase como se não me ouvisse. Soprei, exausta pela sua atitude.
— Não podemos chegar a lado nenhum se tu não me dizes o que se passa...
Do nada, Michael rebentou. Estacou no meio do chão e disse:
— Para! Para de fazer perguntas cujas respostas não vais gostar de ouvir.
Aquela sua explosão foi nova para mim. Sim, já tivemos discussões, mas aquela foi diferente. Talvez pela sua tensão ou pelo modo como me olhava, arreliado. Talvez pelos sentimentos que recusava reconhecer.
— Porque estás a estragar tudo? — Exasperei de volta. — Pensei que estávamos bem, mas pelos vistos não. Se tu achas que vou estar aqui para aturar as tuas flutuações de humor estás muito enganado, Michael.
— India...
— Não. — Sequei as lágrimas que não sabia que tinham caído. — Acho que já chega desta palhaçada.
As íris esverdeadas mostraram-me a mais pura confusão. Incapaz de lhe dar uma explicação coerente e lógica, soprei. Não sabia como lhe dizer, mas também não sabia o que fazer dali em diante. Reconheci que fosse mais um dos meus vários episódios melodramáticos em que eu estava pronta para proteger a minha bolha de tudo o que era desconhecido e assustador. A realidade era que os meus sentimentos por ele cresciam a um ritmo perigoso, tão rápido que não sabia como lidar. Poderia ter recorrido à loucura e ao delírio e gritar-lhe que estava apaixonada, ainda que esse fosse o problema; era algo tão novo e aterrador.
— India, desculpa. Eu ——
Sequei a cara e respirei fundo, dizendo:
— Não acho que faça sentido continuarmos a alimentar isto, o que quer que isto seja.
Arrepiei-me pela amarga recordação da nossa última conversa. Corri a cortina, apercebendo-me do quão ridículo seria esperar que ele lá estivesse à minha procura, tal como eu o procurava todos os dias.
As longas semanas tinham passado demasiado rápido e jamais voltariam. Pareceu que um pedaço de mim também tinha ido embora sem nunca mais voltar. Todas as manhãs eram passadas a encarar o pequeno monte de comprimidos de todas as cores e feitios dispostos à minha frente. Todas as tardes eram passadas a tentar lidar com as consequências dos meus atos. As noites eram mais cruéis. Eram casa para o choro e para a revolta. Chorava pela realidade nua e crua pelo conceito de melhoria ser inalcançável. Chorava ainda mais por tudo se estar a desmoronar-se lentamente diante de mim.
Tentei afastar o aperto habitual do meu coração, engolindo toda a vontade de deitar uma simples lágrima por saber que tudo estava frio: a rua, eu e o Michael.
Deixem os vossos comentários nas caixinhas eheh
Com amor,
MukeCakesauce
VOCÊ ESTÁ LENDO
SICK. - 3 Caminhos Cruzados
Fanfiction| História premiada por um Watty 2015 na categoria de Melhor Fanfiction | Primeiro volume da trilogia SICK. Na cidade chuvosa e melancólica de Fall River, três adolescentes estão prestes a ter suas vidas entrelaçadas de maneiras inesperadas. India...