Capítulo 13

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Charlie e Christian haviam alugado um apartamento mobiliado no terceiro andar de um prédio em North Hampden. A porta de entrada dava para uma pequena sala de estar, com paredes inclinadas e janelas de água-furtada. As poltronas e o sofá empoeirado eram revestidos por tecido brocado, puído nos braços: estampas rosadas com fundo bege, bolotas e folhas de carvalho sobre verde musgo. Havia, por toda a parte, pequenos guardanapos bordados, encardidos pelo tempo. No console da lareira (que, descobri depois, não funcionava) reluzia um par de candelabros esmaltados, ladeado por objetos de prata escurecida.

O local não era exatamente sujo, mas quase. Pilhas de livros por toda parte; mesas cheias de papéis, cinzeiros, garrafas de uísque, caixas de chocolate. Guarda-chuvas e galochas dificultavam a passagem pelo corredor estreito. No quarto de Christian, havia roupas espalhadas pelo chão e uma profusão de gravatas penduradas na porta do grada-roupa; a mesa de cabeceira de Charlie estava lotada de xícaras de chá, canetas vazando, um copo de água com um maço de malmequeres secos. Aos pés da cama, um jogo de paciência por terminar. A distribuição do apartamento era peculiar, com janelas e corredores inesperados levando a lugar nenhum, portas baixas pelas quais se passava abaixando a cabeça. Onde quer que eu olhasse, encontrava uma novidade surpreendente: um velho estereograma (avenidas ladeadas de palmeiras em Nice, assombrada, sumindo ao longe, em sépia); pontas de flechas num mostruário empoeirado; um vaso de chifres-de-veado; o esqueleto de um pássaro.

Christian foi para a cozinha, onde passou a abrir e fechar armários. Charlie serviu um uísque irlandês da garrafa que apanhou em cima da pilha de National Geographics.

- Já esteve no parque La Brea? -, ela perguntou, puxando conversa.

- Não. -, Desamparada e perplexa, desviei os olhos para a bebida.

- Imagine só. Chris -, ela disse, virando-se para a cozinha, - ela mora em Los Angeles e nunca esteve no parque dos fósseis.

Christian surgiu na porta, enxugando as mãos num pano de prato.

- Sério mesmo? -, ele disse, com assombro infantil. - Por que não?

- Sei lá.

- Mas é muito interessante. Já parou para pensar nisso?

- Conhece muita gente de Los Angeles aqui? -, Charlie perguntou.

- Não.

- Mas Ariana Grande você conhece.

Surpreendi-me: como ela sabia disso?

- Ela não é minha amiga. -, falei.

- Nem minha -, ela disse. - No ano passado, jogou um copo de cerveja no meu rosto.

- Eu soube -, falei rindo, mas ela nem sequer sorriu.

- Não acredite em tudo o que escuta. -, ela disse, levando o copo à boca novamente. - Sabe quem é Ashley Gilbert?

Já ouvira falar nela. Havia uma turma californiana fechada, esnobe, em Hampden, vinda de L. A. e San Francisco, principalmente; Ashley Gilbert era sua líder, cheia de sorrisos falsos e entediados, ela tinha uma cruz que carregava no pescoço e mantinha a faixada de boa samaritana. As outras garotas de Los Angeles, Ariana Grande inclusive, a endeusavam fanaticamente. Era o tipo de garota que frequentava o banheiro feminino nas festas, cheirando cocaína direto de um compartimento da pequena cruz que carregava.

- É amiga de Dakota.

- Como pode?

- Cursaram a escola preparatória juntas. A Saint Jerome, na Pensilvânia.

- Sabe como Hampden é -, Christian disse, sentando em uma poltrona e tomando um gole admirável de uísque. - As escolas progressistas adoram estudantes problemáticos, os coitadinhos. Ashley veio de uma faculdade no Colorado, onde cursou apenas o primeiro ano. Saía para festas diariamente e acordava tarde, acabou reprovada em todas as matérias. Hampden é a última chance no mundo...

A História Secreta - CamrenOnde histórias criam vida. Descubra agora