Quando as luzes se acenderam, e o círculo de escuridão deu lugar aos contornos mundanos e familiares da sala de estar _ escrivaninha desordenada; sofá baixo, irregular; cortinas empoeiradas, com formato requintado, que sobraram para Robin depois de um dos expurgos da decoração da casa da mãe _, foi como se eu tivesse acendido a luz após um longo pesadelo; piscando, percebi aliviada que as portas e janelas encontravam-se ainda em seus lugares, e que a mobília não se movera sozinha, por mágica diabólica, no escuro.
Alguém girou a maçaneta. Robin entrou na sala. Ofegava, puxando irritada os dedos de uma luva, para tirá-la.
- Caramba, Lauren -, ela disse. - Que noite.
Eu estava fora de sua linha de visão. Lauren olhou para mim de relance e pigarreou discretamente. Robin virou a cabeça.
Pensei ter olhado para ela sem me trair, mas evidentemente não o fiz. Creio que meu rosto denunciava tudo.
Ela me encarou por um longo tempo, a luva metade presa, metade solta na mão, pendurada.
- Ah, não -, ela disse depois de um tempo. - Lauren. Você não podia.
- Mas contei -, Lauren disse.
Robin fechou os olhos com força, depois os reabriu. Ela estava branca, de uma palidez seca como talco, como giz numa superfície áspera. Por um momento, pensei que ela fosse desmaiar.
- Está tudo bem -, Lauren disse.
Robin não se mexeu.
- Calma, Robin -, Lauren disse, um tanto rabugenta. - Está tudo bem. Sente-se.
Respirando fundo, ela cruzou a sala e desabou pesadamente na poltrona, procurando um cigarro no bolso.
- Ela já sabia -, Lauren disse. - Como eu previ.
Robin olhou para mim, com o cigarro apagado tremendo na ponta dos dedos.
- Sabia? - Ela perguntou num sussurro.
Não respondi. Por um momento, imaginei se tudo não seria uma brincadeira de mau gosto monstruosa. Robin levou a mão ao rosto, desacreditada.
- Suponho que a esta altura todos já saibam -, ela disse. - E nem mesmo sei por que me sinto tão mal a respeito.
Lauren havia ido até a cozinha para pegar um copo. Serviu o scotch e passou o copo para Robin.
- Deprendi miserum est. -, ela disse.
Para minha surpresa Robin riu, numa risadinha sem humor.
- Meu Deus do céu -, ela disse, tomando um longo gole. - Que pesadelo. Nem imagino o que está pensando de nós, Camila.
- Não faz diferença -, falei sem pensar, mas logo percebi, abalada, que era verdade; não fazia diferença, pelo menos não do modo preconcebido que se poderia esperar.
- Bem, acho que se pode dizer que estamos encrencados -, Robin disse, esfregando os olhos com o polegar e o indicador. - Não sei o que vamos fazer com a Dakota. Quase dei uma surra nela quando estávamos na fila do maldito filme.
- Você a levou a Manchester? -, Lauren perguntou.
- Sim. Mas as pessoas são muito abelhudas, e a gente nunca sabe quem está sentado atrás de você. E o filme não prestava.
- O que viram?
- Uma porcaria qualquer sobre despedida de solteiro de um sujeito. Eu só queria tomar um remédio para dormir e ir para a cama. - Ela tomou o resto do scotch e serviu outra dose. - Minha nossa -, disse, dirigindo-se a mim. - Você está sendo muito legal nesta história toda. Eu me sinto terrivelmente sem graça.
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A História Secreta - Camren
Fanfic...Os fantasmas existem mesmo. As pessoas, em todos os lugares, sempre souberam disso. E acreditamos neles, assim como Homero. Só que hoje em dia usamos nomes diferentes. Lembranças. O inconsciente. E Camila sabia bem disso, pois os fantasmas do pa...