Existe, fora da literatura, aquela coisa de "falha fatal", a nítida fenda escura que se estende e racha uma vida ao meio. Eu costumava achar que não. Agora acho que sim. E penso que a minha é assim: a ânsia mórbida pelo pitoresco, custe o que custar.
A moi. L'histoire d'une de mes folies. (Para mim. A história de uma das minhas loucuras)
Meu nome é Camila Cabello. Tenho vinte e oito anos, e só conheci a Nova Inglaterra e Hampden College aos dezenove anos. Sou de Los Angeles.
Cresci em Santa Mônica, cidadezinha costeira de Los Angeles. Sem irmãs ou irmãos. Meu pai tocava um posto de gasolina, e minha mãe cuidou da casa até eu crescer, quando a vida ficou mais difícil, ela precisou trabalhar, atendendo telefones numa das maiores fábricas de Santa Mônica.
Honestamente, não me lembro de muito mais daqueles anos todos que passei em Santa Mônica. Eu não tinha amigos; não era uma aluna excepcional; mas ia bem nas matérias; gostava de ler os livros de Tolkien e assistir televisão deitada no carpete da sala vazia, nas longas tardes monótonas após a escola. Mas um certo estado de espírito permeava tudo, um sentimento melancólico que associo a assistir O mundo maravilhoso de Walt Disney no domingo à noite. O domingo era um dia triste - ia cedo para a cama, escola na manhã seguinte, constantemente preocupada que minha lição de casa estivesse incorreta -, Tais circunstâncias, pelo menos para mim, forneciam argumentos sólidos para a melancolia. Meu pai, era medíocre, nossa casa, feia, e minha mãe não me dava muita atenção; eu usava roupas ordinárias e ninguém na escola parecia gostar muito de mim; e como tudo isso era verdade desde que eu me conhecia por gente, considerava que a vida prosseguia nesse rumo deprimente até onde podia vê-la. Em resumo, minha existência estava envenenada, de um modo sutil porém essencial.
Suponho que não se estranhe, portanto, que eu encontrasse dificuldade em compatibilizar minha vida com a de meus amigos em Hampden, ou pelo menos com a vida que levavam conforme minha percepção. Charlie e Christian eram órfãos (como invejava essa sina cruel!), criados pelas avós e tias e tios numa casa na Califórnia: uma infância riquíssima. E Robin, sua mãe, quando ela nasceu, tinha apenas dezessete anos - garota pálida, caprichosa, com cabelos ruivos e pai rico, que fugira com o baterista de uma banda. Voltou para casa depois de três semanas, o casamento foi anulado em seis; e como Robin gostava de contar que os avós as criaram como se fossem irmãs, ela e a mãe; eram tratadas em estilo magnânimo que até ao tagarelar impressionavam - babás inglesas e escolas particulares, verões na Suíça, invernos na França. Incluam até a Dakota, a enganadora, se quiserem. Filha de um ex-jogador de futebol americano que se aposentou e virou banqueiro. Quatro irmãs, nenhum irmão, criada numa casa imensa no subúrbio.
Não tenho agora, nem nunca tive qualquer coisa em comum com qualquer um deles, nada exceto conhecimento de grego e o ano de minha vida transcorida em sua companhia. E, se o amor for algo de que se possa compartilhar, suponho que tivemos isso em comum, também, principalmente com Lauren, embora perceba que isso possa soar bizarro, à luz da história que estou para contar.
Por onde começar...
Depois do ginásio, fui para uma faculdade pequena, em minha cidade natal (meus pais se opuseram, sempre demonstraram claramente suas expectativas: esperavam que eu ajudasse meu pai no posto ou que conseguisse uma vaga na fábrica onde minha mãe trabalhava, uma das muitas razões para minha ansiedade em fazer matrícula), e nos dois anos que passei lá, estudei grego antigo. Isso não se devia ao amor pela língua, e sim a minha intenção de seguir carreira médica (o dinheiro era o único jeito de melhorar minha sorte, e médicos ganhavam muito dinheiro, quod erat demonstrandum (já foi provado), e meu supervisor aconselhou que eu estudasse o idioma, para preencher os créditos em humanas; como as aulas de grego aconteciam de tarde, escolhi grego para poder dormir mais na segunda-feira de manhã. Foi uma decisão totalmente aleatória, mas, como irão ver, selou meu destino.
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A História Secreta - Camren
Fanfic...Os fantasmas existem mesmo. As pessoas, em todos os lugares, sempre souberam disso. E acreditamos neles, assim como Homero. Só que hoje em dia usamos nomes diferentes. Lembranças. O inconsciente. E Camila sabia bem disso, pois os fantasmas do pa...