70 - Giulya.

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Epílogo 3 - 4 anos depois.

Engoli o choro preso na garganta, é tão difícil deixar tudo para trás assim, mas também, é tão necessário desapegar daquela dor que lhe faz mal.

Saber a hora de sair de cena é um dos conhecimentos mais importantes que se pode ter, e demonstra bom senso, amor próprio, coragem, independência, liberdade e autonomia. Nem sempre é fácil ou óbvio perceber que o nosso tempo chegou ao fim. Nem sempre conseguimos assimilar ou acreditar que aquilo que queríamos tanto não está reservado pra gente. Nem sempre conseguimos abrir mão de nossos planos, sonhos desejos e expectativas numa boa, mesmo que nossa hora tenha passado. Não é fácil entender que nem tudo que a gente quer, nós servirá. E saber sair de cena, mesmo que isso cause muita dor, é algo que não nos ensinam, mas que precisamos aprender.

1 mês atrás, eu decidi ir embora, recomeçar com o meu filho, em outra realidade. Eu sempre soube, desde que o Richard estava na barriga, que ele carregava um nome de alguém muito forte nas costas, que ele comandaria e herdaria tudo que o pai dele deixoou. Mas eu sempre almejei também, um futuro diferente para o meu filho. Que mãe deseja ver o filho nos altos e baixos que é o crime? Dói, dói pra caralho.

Eu penso no Riquelme 24h por dia, parece que eu não vou superar nunca, cada dia que passa eu sofro mais, tudo nessa casa tem ele, tudo nessa casa me lembra ele, por onde eu passo, é como se eu fosse esbarrar com ele a qualquer momento, esse lugar é DELE.

A comunidade não é um lugar ruim para se viver, longe disso, a realidade dali é verdadeira, não há Photoshop. Mas, ainda guardo em mim, muitas memórias, muitas lembranças que não me permitem ir para frente.

Me dói ir, mas eu vejo uma necessidade muito grande, enquanto o Richard estiver sobre a minha responsabilidade, EU irei proporcionar a realidade outra para ele, destacando e lembrando sempre quem foi o pai dele e tudo que pertence à ele. A partir do momento em que ele fizer 18 anos, cabe a ele tomar suas próprias decisões, por mais dolorosa que for pra mim, me resta aceitar.

Foi uma confusão real, quando eu conversei com o Nego sobre ir embora, ele não aceito tirar o Richard da comunidade, chamou A, B e C, mas como a lei manda, eu sou a mãe, foi muito desenrolo, mas concedido, eu não poderia sair do Estado. Eu nunca que sairia fugida daqui, não sou nem louca, se a ordem fosse pra mim ficar, eu ficaria.

Mas todos sabem o que eu ando passando, a minha mudança como pessoa, aparência, tudo. Eu nunca mais estive com ninguém, quando eu acho que a dor amenizou, ela volta.

— Já tô com saudade! — Carina falou agarrada em mim

— Eu te amo muito, e te agradeço desde sempre e pra sempre tudo que você fez por mim! — falei abraçada nela

— Você é forte, guerreira, exemplo de mulher! Seu coração é lindo — ela falou chorosa, beijei a bochecha dela

Ficamos abraçadas um bom tempo, é duro demais deixar minha pretinha, Gabriel chegou chorando também, aí foi um chororo só.

— Tchau Richard, titia te ama! — Carina falou dando tchau, fora do carro

— Tchauu titia! — ele falou botando a cabeça pra fora da janela e mandando um beijo pra ela e para Melody

— Aí gente, eu não aguento isso! — Gabriel falou com a mão no rosto, controlando o choro

Minha mãe dirigia, e eu chorando, daqui até Itacuruça é longe mas o lugar é absolutamente lindo. Comprei um apartamento perto da praia, juntei um dinheiro pra conseguir me manter, minha mãe só vai fazer esse bate e volta mesmo, agora é definitivamente, eu e meu filho! 💚

Às vezes você se encontra tentando soltar algo, mas é como se você estivesse nadando no oceano por muito tempo e então você sente que pertence a ele.  Você se torna as ondas, o calor da água, a imensidade e seu corpo se move em sincronia com o oceano, você apenas continua nadando para ficar na superfície, mas então você cansa e se deixa afogar. E quando finalmente você chega ao fundo, se sente tão pesada porque perdeu contato consigo mesma por tanto tempo. E naquele momento você consegue nadar e chegar à praia, mas acaba caindo em colapso na tentativa de encontrar o equilíbrio que um dia perdeu. Depois de tantas tentativas você levanta e observa todo o horizonte em sua volta e  percebe que não importa o quanto o mar seja bonito, ou o quão ele lhe fez sentir, ele nunca será seu  e um dia você iria o perder, por mais que ainda sinta as ondas se movendo e queira mergulhar novamente. Você sabe que deixar não é fácil, e que não a nada melhor do que nadar no oceano, mas também sabe que esse mesmo oceano lhe machucou durante as tempestades, por melhor intenção que ele tivesse você não era feita para o mar.

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Delírios - Livro 2.Onde histórias criam vida. Descubra agora