Capítulo 95

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O som dos cascos dos cavalos batendo no chão calçado da estrada que saía do castelo lembrou a Anastácio a cavalgada pela floresta com sua mãe, e percebeu como a lembrança lhe parecia distante agora, assim como Scara, e teve a impressão de que fazia meses desde seu primeiro encontro com a guerreira ruiva. De repente se perguntou qual seria seu parentesco com Scara, reparando agora que eram da mesma família, mas de gerações diferentes.

Se eu sou a filha do primeiro rei Aranlin, e Scara é da última geração.. Quer dizer que eu sou séculos mais velha que ela! Anastácio balançou a cabeça com aquele raciocínio, o pensamento de que ela seria alguma tataravó de Scara fazendo-a se arrepiar.

Seguia o cavalo de Aena agora por ruas sinuosas repletas de casas pequenas e amontoadas numa confusão organizada e colorida, sempre descendo até finalmente chegarem nos muros da cidade.

Os enormes portões foram abertos ao pedido de Aena, e Anastácio se surpreendeu ao ver a floresta começar logo atrás dos portões, as árvores formando um túnel sobre a estrada que levava para fora da cidade.

-Não estamos saindo da cidade. -Aena disse como se tivesse lido seus pensamentos, e Anastácio a olhou interrogativa, ao que prosseguiu: - Essa é a floresta da Árvore de Gelo, ela é dentro de Yonara.

-Então porque a gente saiu dos muros?

-Não saímos dos muros da cidade, apenas entramos nos muros da floresta. A cidade é muito maior do que a pequena distância que cavalgamos do castelo até aqui. - Aena respondeu sorrindo, e o barulho dos portões se fechando às suas costas terminou sua frase, fazendo Anastácio olhar intuitivamente para trás.

Já não se sentia mais tão bem ao ver os guardas observando-a do topo do muro ao fecharem os portões, prendendo-as na floresta quisesse ou não, as árvores anormalmente grandes e escuras se fechando ao seu redor e o cavalo negro de Aena desaparecendo e reaparecendo entre as sombras à sua frente.

Anastácio fez seu cavalo acelerar até cavalgar ao lado da Princesa, olhando ao redor insegura, e Aena, reparando seus olhares, disse:

-Não precisa ter medo de que algo saia gritando e abocanhando da escuridão, a floresta é protegida.

-Como você sabe? - Anastácio questionou. - A Terra da Geada também era.

-A Terra da Geada era protegida pela magia da Joia, a floresta é protegida pela Árvore de Gelo, e esta, até onde eu sei, está inteira. - Aena respondeu, fazendo Anastácio fechar a boca, envergonhada por questioná-la.

-Eu achei que a Árvore era só a estante da Joia..

-A estante da Joia. -Aena repetiu, irônica.

Continuaram cavalgando por mais algum tempo, Anastácio não soube dizer se foram apenas alguns minutos ou mais de meia hora, e quando começou a se perguntar onde Aena a levava, as árvores que estavam mais longe de seu campo de visão, no final da estrada, começaram a ter um tom azulado, até a garota perceber que era luz, e não a cor dos troncos.

Aena não desacelerou quando a atmosfera subitamente pareceu cair, fazendo os ouvidos de Anastácio apitarem e seus cavalos darem passos nervosos para os lados, obrigando suas cavaleiras a se esforçarem a mantê-los no lugar e fazer com que continuassem.

Mas quando finalmente pareceram aceitar que sua única opção era ir adiante, a princesa desmontou, fazendo Anastácio seguir seu exemplo confusa, e acompanhando-a a pé quando continuou andando.

Olhou preocupada para trás, onde Aena a fizera simplesmente abandonar os cavalos, mas eles não pareciam incomodados, e ficaram onde foram deixados. Então, quando a luz azulada parecia estar vindo direto de sua fonte e a garota ergueu o olhar, a Árvore de Gelo apareceu em seu campo de visão. Seu tronco branco, mais largo do que qualquer árvore que Anastácio já tivesse visto em sua vida e repleto de veias azuis, que pulsavam com a luz que viram surgir das árvores há alguns minutos atrás, parecia se mover e contorcer com vida própria, apesar de que quando tentou fixar o olhar em um ponto, estava tão imóvel quanto qualquer outra árvore na ausência de vento.

Anastácio, volte para o castelo agora. Escutou a voz de Zimäh em sua cabeça de repente, e viu sua mente aceitando quase de imediato a ordem imponente da mente do dragão, fazendo seu coração congelar no mesmo momento.

Sabia que Zimäh não usaria seu poder sobre sua mente se não fosse uma emergência, e olhou para Aena desesperada, todos os músculos de seu corpo repentinamente tensos, não sabendo se corria de volta para os cavalos no mesmo instante ou falava com Aena, o que a faria perder tempo. Mas antes que se decidisse, a mulher pareceu perceber que algo não estava certo às suas costas, e se virou para encarar Anastácio, seu rosto imediatamente adquirindo uma expressão assustada ao perguntar:

-Anastácio, o que foi?

-Eu tenho que voltar! - Anastácio exclamou, não sabendo o que mais deveria dizer para fazer Aena entender. -Agora!

A princesa, que havia se ajoelhado na frente da árvore, se ergueu de imediato, alerta, e no segundo em que fez que sim com a cabeça Anastácio se virou e correu. Saltou para a sela já soltando um "Hah!!", fazendo com que o cavalo disparasse de volta pelo caminho que vieram, o coração martelando contra o seu peito como se fosse explodir a qualquer segundo, e o medo invadindo sua mente, imaginando todo tipo de situação para fazer Zimäh chamá-la daquela forma.

Aena veio logo atrás, alcançando Anastácio em pouco tempo, e a garota viu por um segundo a mão da princesa firmemente fechada em torno do punho de sua espada quando sua longa capa voou com o impulso do galope, e sua visível intenção ao cavalgar mais rápido que a aprendiz, se mantendo brevemente à sua frente.

E em toda aquela confusão e desespero repentino, ao involuntariamente observar Aena quando fez seu cavalo ultrapassá-la, vendo a expressão alerta e a postura de guarda da mulher, a mão em sua espada como se estivesse prestes a enfrentar o mundo, Anastácio percebeu que ela sabia muito mais do que ousara revelar tanto para ela sozinha quanto para as outras aprendizes em sua sala, e que havia um interesse muito maior em volta de Anastácio, que acabara de revelar ao mostrar que esperara a chegada de um momento como aquele, fosse por trazer sua espada para a floresta que sabia ser protegida, fosse por sua atitude de se colocar imediatamente entre Anastácio e o perigo, fosse qual fosse, sem mesmo saber o motivo pelo qual a garota decidira voltar de repente e fazê-lo no momento em que percebeu que Aena não a impediria.

Aquilo fez Anastácio mais uma vez questionar o interesse de Aena nela e sua reais intenções, se estava realmente ao seu lado e se deveria desconfiar da mulher afinal de contas. Mas naquele momento, tudo o que sabia era que, estivesse do seu lado ou apenas agindo pelo próprio benefício, o que quer que a estivesse esperando no castelo, teria que enfrentar Aena primeiro. 


E olha quem voltei depois de todos esses anos! Eu disse que faria uma pausa pra ver se a inspiração volta, mas um projeto entrou no meio e eu tive que focar por muito mais tempo do que eu planejei essa "pausa". Mas obrigada pela paciência, e espero que gostem do capítulo <3

Cavaleiros de Dragões II - A Joia PerdidaOnde histórias criam vida. Descubra agora