Anastácio não fazia a mínima ideia do que acontecia com ela naquele momento, e a falta de Zimäh a deixava ainda mais nervosa. Há poucos segundos estivera no celeiro com Kady e Shilamir e os dragões, e agora um homem enorme e musculoso e ruivo a escoltava por uma cidade muito bonita. As pessoas a chamavam de Alteza e Ha'shiina, e o enorme e pesado manto de pele do guerreiro esquentava seus ombros e braços, antes totalmente expostos ao frio cortante do inverno em que fora parar.
Anastácio andava em silêncio ao lado do guerreiro, e depois de algum tempo começaram a subir uma enorme escadaria, arquitetada no belo estilo da Europa medieval, assim como o resto que vira da cidade. Sua memória estava confusa, imagens iam e vinham em sua mente, lembranças desconhecidas pra ela surgiam, mas desapareciam tão rápido quanto.
—Hmm.. Com licença.. Senhor. —a garota ruiva segurou seu braço, se surpreendendo com o tamanho dos músculos, não se lembrava de alguma vez na vida ter visto um homem tão grande e musculoso. O guerreiro parou e olhou-a com uma expressão gentil, e Anastácio continuou:
—Eu acho que está me confundindo com alguém, eu não...
—Alteza. —O guerreiro riu e deixou sua pesada mão cair sobre seu ombro magro. —Não é aconselhável tentar enganar uma pessoa duas vezes da mesma maneira. Lembre-se que hoje terás que receber seus primos e tios, então dê-nos um tempo de vossas brincadeiras e fugidas.
Anastácio o encarou boquiaberta, o homem estava convicto de que ela era uma princesa, e que havia fugido do castelo em algum momento, e ela não tinha a menor ideia de como convencê-lo do contrário. Ao que parecia havia sido mandada para outro lugar de um segundo para o outro, e não parecia haver um portal que a levasse de volta. Também não parecia adequado dizer a um guerreiro de elite "olha tio, eu sei que eu pareço uma princesa, mas eu tenho uma missão importante pra realizar, eu preciso salvar o mundo", então apenas deixou a coisa acontecer, assim como em seu primeiro encontro com os Cavaleiros de Dragões e o outro mundo.
Também não teve mais tempo de se preocupar com qualquer maior reviravolta; naquele momento o castelo surgiu à sua frente, enorme e elegante, com milhares de torres brancas e estandartes azuis com um brasão que não era da Terra da Geada, mas lhe parecia estranhamente familiar.
Anastácio nem percebeu que havia parado de andar para contemplar a beleza do castelo, e o homem lhe deu um puxão delicado no braço para que prosseguisse, só então notando sua expressão fascinada.
—Alteza.. Estás se sentindo bem?—Perguntou, com tom de voz preocupado, fazendo Anastácio tirar os olhos do castelo.
—Eu estou bem. Nunca tinha visto um castelo tão bonito.. —soltou antes que percebesse, se perguntando se deveria começar a fingir que sabia quem era ao vê-lo franzir as sobrancelhas.
—O castelo é vossa casa, Alteza. Você o vê todos os dias.
Anastácio ficou calada, sentindo seu rosto ficar pálido, tentando gaguejar algo, mas o homem apenas continuou a guiá-la, após um enorme portão levadiço se abrir para os dois. Vários guardas em armaduras douradas os cumprimentaram em tom simpático, aos quais o homem ruivo acenou com a cabeça e sorriu ao passar.
Logo entraram no pátio do castelo, tão grande quanto se esperaria ao olhar para o castelo de fora, com vários chafarizes espalhados pelos caminhos de pedra, decorados com roseiras que se enroscaram neles com o passar do tempo.
Anastácio observava a tudo maravilhada, cada detalhe da enorme construção era simples e fascinante ao mesmo tempo, cada pedra do castelo parecia ter sido colocada com toda a dedicação do mundo, como se a própria rainha tivesse planejado e supervisionado a construção do palácio.
A alguns metros de distância das enormes portas duplas na entrada do castelo, passaram por debaixo de um arco de mármore branco entalhado com desenhos encaracolados de pequenas flores, delicadamente pintadas de azul, e Anastácio não resistiu à tentação de tocar o arco, passando os tetos pela pedra fria e pelas flores nela entalhadas.
O homem ruivo assistiu-a em silêncio, logo depois abrindo uma das enormes portas para que a garota entrasse.
O interior do castelo era ainda maior, um enorme hall de entrada se estendia à sua frente, com guardas em armaduras elegantes e lanças nas mãos a cada dois metros.
No final do grande salão de entrada uma escada larga subia para o segundo andar, se divindindo no topo, dando em dois grandes corredores e um pequeno andar aberto em volta do salão. Parados ao corrimão deste, mais guardas estavam parados, estes porém de armaduras prateadas e armados com lanças, olhando para baixo onde Anastácio e o guerreiro ruivo acabaram de entrar e atravessavam o salão.
—Vosso pai ficou preocupado, Alteza. —o homem falou quando começaram a subir as escadas, e suspirou. —Como sempre...
—M-me desculpe. —Anastácio murmurou desconcertada, ainda não sabendo lidar com a situação toda, imaginando quem seria seu suposto pai.
—Diga isso ao vosso pai, não a mim.
Percorreram um largo corredor com um lado aberto para o pátio em volta do castelo e decorado com flores coloridas e armaduras de armas em punho a cada cinco passos, e estandartes com o brasão do reino esvoaçavam ao vento frio no lado aberto do corredor.
Viraram uma esquina e o guerreiro ruivo abriu uma grande porta dupla, exibindo outra escada larga, que se dividia para os lado assim como a da entrada, e lá embaixo uma largo corredor dava para outra porta dupla, esta, porém, aberta.
De cada lado da porta havia um guarda de armadura dourada postada, estes armados apenas com espadas, e em uma faixa de tecido azul e dourado acima da porta estava novamente o brasão real.
O guerreiro parou de andar no fim da escada e gesticulou para que Anastácio continuasse, dizendo quando ela lhe lançou um olhar inseguro:
—Não me faça acompanhá-la, Alteza. Sabes bem o quem aconteceu a última vez que o fiz.
É claro que sei, Anastácio pensou, engolindo em seco. Por que a última vez que isso aconteceu eu era outra pessoa.
Anastácio desceu a escada insegura, desajeitada com a aba de seu vestido longo, caminhando em direção às enormes portas duplas e encarou os guardas, se perguntando se precisava pedir permissão ou algo assim para entrar. Os guardas permaneceram sérios e imóveis, o olhar voltado para a frente, e Anastácio deu mais alguns passos para a porta, continuando ao ver que não esboçaram intenção de impedi-la.
Seu coração deu um salto assustado quando voltou o olhar para a frente e de repente estava diante de um homem alto, de braços cruzados, e a encarava sério de cima a baixo.
Anastácio se surpreendeu mais uma vez ao ver seus longos cabelos ruivos, caindo lisos sobre os ombros largos, e os olhos de um verde de milhares de tons diferentes.
Um calafrio percorreu seus braços e costas ao olhá-lo no rosto, e uma sensação de que o conhecia muito bem invadiu-a. Algo guardado e escondido há muito tempo pareceu despertar em Anastácio, fazendo suas mãos tremerem quando o homem deu um passo para o lado, dando à garota a visão completa da sala, e um par de tronos elegantes após alguns degraus na parede oposta. No trono direito uma mulher estava sentada, olhando com olhar suave para Anastácio, trajando um vestido púrpura decorado com detalhes dourados de metal nos ombros, aparentemente simbolizando partes de uma armadura, e uma coroa fina e dourada estava repourada sobre sua cabeça, prendendo parte dos cabelos, cheios e cor de fogo.
Só então Anastácio conseguiu vagamente ter acesso à sua memória, de tudo o que Scara lhe contara, e percebeu com espanto que estava diante da própria família Aranlin. Mas havia algo mais, desde que pisara no castelo, uma sensação assustadoramente familiar.
—Minha filha, —a Rainha se levantou, até mesmo o ato de se levantar parecia elegante, e Anastácio se sentiu na obrigação de fazer uma breve reverência. —Onde esteve?
Anastácio murmurou algo incompreensível, olhando enquanto a mulher se aproximava, se perdendo em sua beleza. Seu corpo inteiro parecia vibrar com a presença daqueles dois e a garota não conseguia desviar o olhar do rosto da Rainha até que a mulher estivesse à sua frente. Anastácio permaneceu imóvel, encarando o rosto fino da Rainha, e se encolheu quando ela a abraçou repentinamente, apertando-a contra o ombro.
—NUNCA mais faça isso.
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Cavaleiros de Dragões II - A Joia Perdida
مغامرةLIVRO 2 Após a batalha bem-sucedida contra o inimigo de anos da Terra da Geada - Saguhr - Luana assume o trono do reino gelado como rainha herdeira de Kassandra. Porém a felicidade da vitória na guerra não dura muito, visto que novos perigos ameaçam...