Capítulo 41. O Primeiro Pecado

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"Você tem fome. Venha! Eu tenho comida.
Você tem frio. Venha! Eu tenho roupas.
Você está triste. Venha! Eu tenho conforto".
"Mas quem confortaria um Amaldiçoado como eu? Quem me vestiria? Quem me alimentaria?"
"Eu, pois sou a primeira esposa de seu Pai, Quem discordou com o Único Acima
e ganhou Liberdade na Escuridão.
Eu sou Lilith."

O livro de Nod


Bóris estava calado no chão, as pequenas pernas envolvidas pelas mãos esqueléticas e frias que saíam do solo. O único olho azul bom estava arregalado olhando para a mulher de expressão bruta como se seus cabelos voassem junto com o vento inexistente daquele lugar.

O menino pensou bem antes de responder qualquer coisa, esfregando a bochecha corada pelo susto e cheia de capim molhado no ombro, fazendo uma ruga entre as sobrancelhas claras.

- Você não pode ser minha mãe. - Ele estava sustentando um olhar sério, franzindo o nariz pelo cheiro de podre do lugar, querendo se afastar da carcaça comida de um coelho. - Minha mãe está morta.

- Eu estou viva. - Ela sorriu. - Assumi pela última vez minha forma humana para dar a luz á você, por isso não pude ficar por mais tempo. Tive que ir embora porque esse mundo me desgasta. Ele não me pertence. - Ela falou, se ajoelhado ao lado do pequeno corpo, inclinando a cabeça para o lado.

A criança reuniu coragem e a olhou nos olhos, aquelas orbes vermelhas como rubi preenchendo seu globo ocular. Ele colocou a pequena mão em seu próprio rosto, alisando seu nariz e as maçãs do rosto, percebendo a semelhança enorme entre ele e aquela mulher.

- Mas você é um... um demônio. Não é? - Ela sorriu.

- Isso não faz de você um animalzinho híbrido?

- Mas isso não é possível! - Bóris gritou voltando a se debater das mãos esqueléticas. - Você só está tentando me assustar!

- Eu sou Lilith, deusa do inferno, reino sobre as cinco pontas do pentagrama infernal, a única que desafiou Aquele que reina sobre as núvens e encontrou liberdade na escuridão. Não tenho tempo de vir até a terra e pregar peças em humanos, até porque esse lugar fede. - Ela franziu o nariz enquanto se aproximava mais da criança, analisando seu rosto, deslizando as unhas sobre a pele queimada de sol do menino e retirando um pedaço de raíz grudada ao cabelo alaranjado de Bóris. - Quer saber por que estou aqui?

Ela suspirou e se levantou sem tocar o chão, flutuou junto com o vento até o tronco de árvore podre e sentou sobre ele com as pernas cruzadas. Sua nudez se misturando com o fogo de seu cabelo e ambos desaparecendo em vermelho no vento. Ela continuou:

- Meu corpo de carne foi destruído há algum tempo. Estou lutando para permanecer aqui, contudo agora estou fraca. Eu estou desaparecendo e meu núcleo se desfazendo, assim estou me misturando ao vento e logo serei apenas fumaça. - Ela olhou para as pontas de seus cabelos, que se desfaziam no ar. - Se eu sumir, todos os meus filhos na terra e no reino que se estende sob o chão também morrerão. Isso inclui você.

Bóris não estava ouvindo muito sobre o que aquela criatura falava, estava mais preocupado em sair daquela encosta úmida, e com isso percebeu que, se parasse de se debater, as mãos esqueléticas soltavam seus braços, então ficou imóvel até que não sentisse mais os dedos gelados sobre sua roupa.

Então ele a observou novamente, esfregando com os dedos as bochechas sujas de terra e batendo nos cabelos amarrados e desgrenhados.

O Vampiro e o Romani - Livro O1  {CONCLUÍDO}Onde histórias criam vida. Descubra agora